Quiet Quitting...
O tema do momento, a grande sacada! Dezenas de profissionais de RH falando sobre o mesmo assunto, com reflexões vazias e discursos superficiais. Na semana passada teve de tudo aqui no #LinkedIn. Eu fico angustiada mas não julgo, sabe? Tem realmente algumas centenas de profissionais de RH que acham que sabem o que estão fazendo e que, por isso mesmo, não olham criticamente para suas próprias práticas profissionais.
São esses profissionais que acham que o Quiet Quitting, ou a Desistência Silenciosa, é algo novo. Sinceramente, gente, desde a época do meu tataravô tem funcionário que empurra com a barriga. É isso. Ponto. Quem aqui nunca ouviu algo como “eu não sou pago para isso”?
O cara perdeu o gosto pela empresa. Está lá, perdido entre o “eu preciso pagar minhas contas” e o “eu não consigo algo melhor”. Fala sério, desde quando isso é novidade?! A questão é: dá para resgatar esse funcionário? Este, sim, deveria ser o cerne da discussão, mas ninguém falou sobre isso. A maior parte segue apenas repetindo como papagaios as palavras alheias. Eu leio, e sinto tristeza e vergonha. De verdade mesmo.
É possível reverter o Quiet Quitting? E vale a pena?
Como eu disse, a pergunta que realmente importa aqui é: dá para resgatar alguém saturado, que perdeu o viço e não entrega nada além do mínimo? A resposta é: depende. Isso mesmo, depende.
Primeiro, depende da empresa. A empresa quer fazer esse resgate? Quer valorizar aquele profissional que já deu tudo pela companhia, que abraçou a causa e vestiu a camisa, mas que por motivos diversos, neste momento, não está mais se comportando assim?
Ou, na verdade, estamos falando de um profissional que nunca foi verdadeiramente comprometido, que sempre foi mediano? Se for esse o caso, a resposta é NÃO. A empresa não deveria manter esse profissional, e não há motivos para resgatar este perfil.
Se o profissional já foi fora da curva, teve ideias que contribuíram com o time, tem excelentes capacidades adormecidas pela rotina, pela falta de rumo ou constantes mudanças de estratégia, pela cultura vazia ou pela sua simples desvalorização, a resposta é SIM. Dá para resgatar esse funcionário e, inclusive, transformá-lo em um speaker (que, hoje em dia, é mais conhecido como influencer).
As muitas causas do silêncio
Vamos aos fatos. Por que os funcionários decidem ficar “quietos”? A resposta é simples: as empresas os silenciaram. Isso mesmo.
Aquelas empresas em que as expectativas são altas, mas o apoio é insuficiente e os recursos são reduzidos; onde os funcionários se sentem sobrecarregados por uma infinidade de demandas sem sentido, que são sistematicamente impostas pela gestão, lentamente vão desistindo. Ninguém quer trabalhar até a exaustão.
Uma pesquisa recente do Gallup demonstrou que 44% dos trabalhadores do mundo estão estressados. Ora, vejam só, e por qual motivo? Empregadores estão exigindo mais dos funcionários do que eles podem – ou estão dispostos a oferecer. Com isso, alguns trabalhadores passaram a reconsiderar a quantidade de esforço que estão dispostos a colocar no trabalho sem uma compensação que seja justa.
Essa mesma pesquisa demonstrou que apenas 21% dos funcionários estão engajados com seu atual trabalho. Em outras palavras, isso significa que quatro em cada cinco funcionários podem estar em posição de Desistência Silenciosa. Uma estatística no mínimo impressionante, concorda?
Mais um dado surreal: a Grande Resignação, um outro movimento que ganhou as manchetes em 2021, viu uma média de quase 4 milhões de funcionários deixarem seus empregos a cada mês durante aquele ano. Naquela época, a divergência era sobre flexibilidade, além de uma reavaliação geral sobre como o trabalho deveria se encaixar em na sua vida, no seu cotidiano.
Aqui no Brasil, a parada ficou sinistra também… Manchete do jornal O Globo do último dia 10: “Brasil tem recorde de 2,9 milhões de pedidos de demissão em cinco meses. 'Grande Renúncia' à brasileira se dá em setores de alta qualificação, mesmo com desemprego alto no país”. O texto continua: “O perfil de quem pede para deixar o emprego no país é formado principalmente por homens, com ensino superior, na faixa etária de até 29 anos e atuação na área de tecnologia”.
Os motivos são similares aos americanos - mais uma prova de que, se aconteceu lá, vai chegar aqui. Com um pequeno grande detalhe: não há mão de obra qualificada suficiente disponível aqui. E o mais curioso: empresas estrangeiras (americanas!) estão contratando esses nossos demissionários.
A galera pediu demissão lá, a onda chegou aqui, os nossos funcionários estão aceitando as ofertas que ficaram abertas lá, gerando vagas e mais vagas aqui. Acompanhou? Isso está desestabilizando o nosso mercado, então fiquem de olho, galera! Essa situação também pode estar mascarando dados de desemprego, mas isso já é outra história.
É possível prevenir o Quiet Quitting?
Talvez a maneira mais inteligente de agir seja atuar na prevenção deste cenário, não? As empresas buscarem, ativamente, maneiras de impedir que o Quiet Quitting aconteça.
Algumas possibilidades para isso é repensar:
Esses questionamentos valem tanto para quem já está na empresa quanto para a reputação da companhia como todo. Nós já falamos sobre isso aqui: para uma empresa ser desejada, o boca a boca é fundamental! Nada mudou neste sentido.
O remoto, o presencial e o híbrido, e o papel da gestão em tudo isso
Eu já ouvi, de dezenas de líderes, que o trabalho 100% remoto causa um estresse maior e que há muita dificuldade de estabelecer e manter uma cultura organizacional neste modelo, visto que as interações diminuem bastante.
Em contrapartida, para que o remoto não seja tirado, os funcionários trabalham até mais do que no presencial. Assim, dão a impressão de que as coisas estão indo bem, e o estresse aumenta. Concordo com tudo isso, e aproveito para dizer que sou contra a semana de quatro dias sem que haja uma diminuição na quantidade de tarefas.
O trabalho remoto invadiu nossos lares. Para dar conta de tudo, passamos a ficar mais tempo em frente ao computador e com o telefone na mão, o que por si só já gera mais e mais ansiedade. Some isso ao fato de que as pessoas de maneira geral têm a percepção de que estão dando mais do que recebendo e pronto, a confusão está formada.
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De uma certa maneira, essa correria em que o remoto nos colocou não garante uma real mensuração da sustentabilidade desse modelo para cada empresa. Assim, depois de passada a necessidade por conta da pandemia, muitas continuaram fazendo por fazer, sem refletir e avaliar. Obviamente não me refiro às empresas que nasceram remotas e seguem progredindo assim, mas esse não é o caso da maioria.
O híbrido parece mesmo ser o mais interessante para todos, e vem se confirmando como uma situação possível para a maioria.
Onde fica a gestão nisso tudo
O estilo de gestão tradicional lembra o esquema de escambo lá dos primórdios da humanidade. A natureza é transacional, ou seja, o funcionário é pago para cumprir uma lista de tarefas e recebe por isso.
Embora o modelo sirva para certas funções, este estilo de gestão geralmente não permite nenhuma inovação por parte do funcionário - então, ele faz o que é pago para fazer e ponto.
E é justamente aí que mora o perigo! Funcionários que não tem espaço para contribuir estão mais propensos a serem afetados pela Desistência Silenciosa, pois passam o dia apenas cumprindo suas tarefas. Muitas vezes não seguem nem o descritivo de cargos, praticamente não batem as metas e nem pensam em superá-las.
No mundo ideal, queremos uma gestão transformacional, em que a empresa considere as necessidades profissionais e pessoais dos seus funcionários. Preferencialmente, com ambiente de trabalho positivo, em modelo híbrido, tarefas com propósito claro e um detalhe mágico: a cadeia de valor do trabalho de cada um é conhecida por TODOS.
Como em uma colmeia, todos sabem o que deve ser feito por qual membro, há uma divisão de tarefas bem definidas, e todos trabalham por um ideal específico e claro: produzir e estocar mel.
Como resgatar um profissional em Desistência Silenciosa
Ok, Letícia, e como resgatar um profissional que está em plena Desistência Silenciosa? Vou responder com o que acredito que resolva praticamente qualquer problema da nossa vida: tenha uma conversa franca e genuína!
Observe seus funcionários, seus comportamentos e seus semblantes ao vivo, pessoalmente. Se o funcionário for da turma que vale a pena, pergunte a ele o que o faria ficar motivado novamente sem envolver, a princípio, nenhuma compensação monetária. Pergunte se ele gostaria de fazer uma experiência em outro setor. Tenha uma conversa franca mesmo, de coração aberto, ouvidos atentos e com olhos nos olhos.
Ouça o que ele tem a dizer, pegue estas informações e mature de acordo com a realidade que você tem na sua empresa. Observe o ambiente que está sendo oferecido. A cultura combina com o que estamos fazendo e falando? Temos um produto ou serviço motivador? Nosso propósito está claro? Nosso Plano Estratégico está em dia ou precisa de revisão?
Não adianta prometer e não ter como cumprir, ou cumprir parcialmente. Você quer o melhor resultado do seu funcionário, então precisa dar o seu melhor também! E, se não for possível fazer isso, demita-o. Isso mesmo! Let it go, sabe? Minha vó dizia que uma maçã podre estraga todo o cesto... O que não dá é para você ter um time mediano, compensando mal, e continuar esperando um ótimo resultado.
Se você quer fazer diferente mesmo, experimente oferecer segurança psicológica aos funcionários, um ambiente onde eles se sintam à vontade para pedir ajuda e inovar, sem medo de represálias. Neste processo o erro é aceitável. Sua empresa está disposta a permitir erros? Sem este tipo de ambiente é possível que você esteja ainda mais propenso à Desistência Silenciosa.
O ponto crucial é fazer as pessoas perceberem o progresso de suas carreiras, e isso vai além de oferecer oportunidades de treinamentos. Todos nós nos sentimos realizados ganhando novas habilidades e experiências e percebendo o valor em nossas atividades.
Vejam só o exemplo da musculação: você se sente muito mais realizado quando vê os resultados no espelho, e nas roupas que antes não ficavam boas e agora estão ótimas. É a mesma coisa com a nossa carreira: resultados importam e devem ser comemorados!
Apenas lembre-se de fugir do fast-food e dos benefícios passageiros que muitas empresas oferecem. A experiência profissional tem de ser levada a sério, desde o fundamento primordial, que é o sustento do ser humano. Maslow, pessoal!
Onde o RH entra nisso, Letícia?
Nas políticas e, na prática, não sendo submisso. O RH é o guardião da cultura, o dono do plano de cargos e salários e o autor dos descritivos de cargos da empresa. A faca e o queijo estão nas nossas mãos. Se você não percebeu isso antes, talvez você não devesse ser RH.
Para fechar nossa conversa de hoje, a pergunta que não quer calar é a seguinte: por que raios esse cara da Desistência Silenciosa não pede para sair? Curioso, não?
No mundo real, a palavra resiliência nunca sai de moda, né? E a Desistência Silenciosa tem “acometido” mais os profissionais mais jovens que, me parece, estão desistindo cedo demais das coisas. Sabe aquele jogo de cartas chamado Paciência, que se popularizou na versão para computador nos anos 1990? Então. A evolução de verdade sempre ocorre fora de nossa zona de conforto.
Ter resiliência nestes tempos e cenários que estamos vivendo vai forjar melhores profissionais. Aquela máxima do cachorrinho sentado no prego, que não se levanta enquanto não dói, é muito válida.
Temos inúmeros exemplos de pessoas que poderiam ter desistido, mas persistiram. O resultado vem do esforço! O que separa o fracasso do sucesso é o que você faz para sair do incômodo e conquistar a satisfação. Quem desiste rápido não constrói nada e não está apto a evoluir. Darwinismo corporativo, babies!
Não esquece: “O Novo RH” vai ao ar sempre às quartas! Te vejo semana que vem. Até lá!
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Especialista em Licitações e Contratos
2 aQue texto reflexivo, tanto para o RH quanto para o profissional das demais áreas da empresa, pois muitas vezes só estamos ali fazendo o mais do menos.
Gerente Administrativa Financeira | Gestora de Contratos | Gestão de Facilities | Real Estate | Contadora
2 aTenho acompanhado seus textos, Letícia Molinaro ! Tem sido momentos agradáveis de leitura, pois sua linguagem e abordagens são muito interessantes. Parabéns!
Consultor Sênior na TIM Brasil
2 aUau, excelente texto e reflexão.
Human Resources Executive, Passionate about People Development | Executive Coach | People Advisor | Mentor | Student of Psychoanalysis
2 aExcelente reflexão... infelizmente, muitos termos que hoje estão "americanizados", mas já fazem parte da rotina das organizções há muito tempo! Lembro que quando comecei a trabalhar dentro das fábricas, existia um movimento chamado de "operação tartaruga". Não foge muito disso. Os nomes vão se modernizando, mas as soluções custam a ser colocadas em prática.
Executive Coach | Public Speaker | Creator of "Women to Leadership" Program | Corporate Teams Trainer
2 aLetícia Molinaro amei teu texto, aberto e claro, e abordando os pontos que efetivamente tem que ser abordados. 💪🏻👏🏻❤️