Reflexões Teológicas (Parte 1)

Reflexões Teológicas (Parte 1)

Estudos Bíblicos Expositivos em Eclesiastes (Ryken, Philip Graham).

1. Vaidade de Vaidade.

Pretendo começar uma série de estudos sobre o livro de Eclesiastes, parte dos chamados livros poéticos do Antigo Testamento. Para tanto tomarei como base a obra de Philip Graham Ryken a fim de estabelecer os pontos centrais da exposição. Deste modo, não seria extremamente fora do contexto iniciar qualquer explicação que seja fazendo referência ao exposto no Capítulo 1, Versículo 18 do livro de Eclesiastes:

Porque na muita sabedoria há muito enfado; e o que aumenta em conhecimento, aumenta em dor.

O livro de Graham Ryken começa fazendo a pergunta mais importante de todas: afinal de contas, por que devemos estudar o livro de Eclesiastes? Particularmente, numa primeira leitura o livro parece uma reflexão pouco otimista sobre a vida, sobre a sociedade, sobre o papel do homem e seu propósito na terra. Alguns teóricos argumentam, inclusive que o livro seria contraditório, um verdadeiro ponto fraco na história da teologia hebraica e até questionam se o autor do texto realmente teria um relacionamento verdadeiro e pessoal com Deus.

Porém, é importante destacar pelo menos quatro motivos de porque Eclesiastes é um livro que deve ser estudado no conjunto de textos inspirados por Deus:

a)    Ele é Honesto com as Dificuldades da Vida:

Após a Pandemia do COVID-22 o mundo enfrenta uma nova Pandemia com o aumento assustador da quantidade de suicídios e, dentre os sujeitos que mais o cometem, os jovens e adolescentes estão na dianteira de casos. Para muitos pesquisadores mais de 90% deles poderiam ser evitados. Saber que existe angústia na vida e que é natural se desapontar parece ser algo que pais e mães escondem dos filhos, mas, que o livro de Eclesiastes faz questão de enunciar. A visão pessimista de mundo está lá presente como um conteúdo pedagógico e não romantizado da experiência de vida do homem na face da terra. E ela é representada como uma jornada (de um indivíduo sozinho) frente a descoberta do propósito singular da existência humana, sem desconsiderar as consequências do pecado;

 

b)    Ele nos ensina as consequências da vida no mundo:

Viver a vida fora da presença de Deus tem consequências e a maior de todas, apresentada no texto, é a perda de sentido. Muito se diz que o salário do pecado é a morte e que o pecado mata algo na sua vida. O Exemplo de Eclesiastes é tão único pois demonstra que a busca por realização pessoal, a busca por acumular conhecimento, poder, nada disso dignifica e significa o homem que perdeu seu propósito diante da inevitabilidade da vida. É possível fazer uma breve digressão em Aristóteles, e dizer que a finalidade da vida do homem é a felicidade, mas, que felicidade é essa? Comer um bom prato? Beber uma boa bebida? A reflexão proposta no livro nos inclina a perceber que nenhuma resposta para essa pergunta é suficiente se excluir Deus da equação;

 

c)    Ele faz as perguntas mais difíceis da humanidade (ainda hoje repetidas):

Neste particular é importante destaca-las: Quem sou eu? Qual o meu propósito? Por que existe a dor? Por que existem angústias? De onde vem a aflição dos homens? Deus se importa conosco? Ora, vejam, estas perguntas também foram feitas pelo Existencialismo (seja ele Ateu seja ele Cristão). Encontramo-las, recheando argumentos do Pessimismo Filosófico e até da Fenomenologia Heideggeriana (Século XX). Não as superamos e nem sequer chegamos perto de satisfazer os questionadores. Porém, Eclesiastes não se furta em assumir um compromisso e fazer as perguntas e fornecer respostas que não são o padrão da cartilha da escola bíblica;

 

d)    Ele ensina a adorar a Deus e viver com Ele (não apenas com nós mesmos);

Este é o ponto em que creio ter Soren Kierkgaard se influenciado para apresentar seu Existencialismo Cristão. Na medida em que o reconhecimento da Angústia Existencial e a incessante busca por sentido para vida do homem possam tomar como fundamento duas alternativas: 1) ou, nego Deus e concordo com Nietzsche, valores humanos são relativos, voláteis e arbitrários, por isso sua inversão gera a decadência social de nossos tempos; 2) ou, aceito a Deus e percebo que, muito embora exista esta Angústia, esta sensação de vazio, Ele pode dar sentido a tudo quanto aceito e me submeto a Sua Vontade. A segunda alternativa é um fundamento bastante defendido em Eclesiastes;

Philip Graham ainda inclui duas questões importantes para que se possa entender a dimensão teológica do livro: a) Quem é Kohelet? e; b) O que ele diz? Acerca da primeira questão são apresentadas algumas traduções para a palavra de origem hebraica, Kohelet pode significar: Mestre, Professor ou Pregador. Sua raiz está em colecionador, como, alguém que colecionou experiências e está na condição de passá-las em frente. A questão sistemática a ser enfrentada é a de que a palavra Ekklesia, de origem grega, e que está sendo usada como o título do livro, refere-se a “Congregação” e é o termo correspondente à Kohelet, como sendo, portanto, “alguém que fala na/para Igreja”.

O que nos leva a questão sobre a autoria do livro ser atribuída a Salomão. Grande parte dos argumentos que aduzem ser o Pregador o Rei Salomão aduzem que está expresso no Capítulo 01 se tratar de um dos descendentes do Rei Davi, e o relato autobiográfico em primeira pessoa é, na maior parte, fiel a própria história de Salomão. Porém, alguns argumentos buscam questionar se a autoria realmente pode ser atribuída a ele considerando três elementos: a) seu nome não é mencionado; b) no final do livro há o uso da terceira pessoa e; c) pode se tratar de uma autobiografia ficcional.

De fato, os três argumentos acima possuem um peso e jogam uma tarefa argumentativa grande para quem procura defender a autoria de Salomão. O fato de seu nome não ser citado ao logo dos versículos, o uso da terceira pessoa no final do livro levam a crer que estes relatos podem ter sido escritos por outra pessoa, mas, que tomou por base a história do Rei Salomão para servir de exemplo a fim de demonstrar as consequências da vida do homem afastado da presença de Deus. E assim Philip Graham questiona: e qual exemplo seria melhor do que o do Rei Salomão?

Em defesa da autoria do livro por parte de Salomão, muito embora ele não seja lembrado como Pregador, o Capítulo 8 de 1 Reis o coloca como alguém que congregou junto à Igreja. Como a palavra usada é Ekkelsia e seu equivalente é Kohelet é também perfeitamente defensável que Salomão seja o protagonista e autor dos textos de Eclesiastes.

Se há, aqui, alguma questão de estilo ou se ele iniciou e alguém finalizou depois creio que não haja espaço para discussão, mas, a verdade é que tendo sido ele ou não a escrita foi inspirada por Deus para o propósito de instruir o povo em Seus Caminhos.

Acerca da segunda pergunta a palavra que mais vai ser repetida ao longo do livro é Hevel, ou, em sua tradução mais conhecida/popular: Vaidade. De modo bem didático, Philip Graham ensina que Hevel significa, literalmente, “sopro”, “respiro”, “vapor” (até, noutras traduções “fumaça”). O fato é que essas expressões são usadas ao longo da Bíblia para designar a Vida, ou, algum de seus aspectos. De toda forma, o que o livro de Eclesiastes quer dizer com Hevel é que a vida é como um sopro, uma hora estamos vivendo e noutra não estamos mais e tudo passou tão rápido que quase não deu para ver.

Nesta nossa estada, esta vida, curta, efêmera, brevíssima, parece ser vazia e, portanto, tentamos enche-la dividindo-a em quatro propósitos: a) dinheiro; b) conhecimento; c) prazer e; d) poder. Queremos acumular riquezas e mais riquezas para comprarmos felicidade. Queremos a casa de três andares no condomínio fechado, o carro do ano e quando conseguimos comprar e somos convidados a visitar o amigo com a chácara de 20 mil hectares e o carro melhor que o nosso, subitamente não queremos mais aquilo que tínhamos desejado por tanto tempo.

Queremos acumular conhecimento e consumir mais e mais para nos destacarmos. Até que ficamos velhos e não conseguimos mais acompanhar as novas ideias, que parecem, sempre releituras direcionadas a outros fins daquilo que sempre soubemos. Muitas vezes nem somos reconhecidos pelos livros e artigos e somos desvelados para brutalidade e visceralidade da condição pecadora do homem. Queremos prazer com os sentidos e sensações do nosso corpo e nos entregamos à busca por ele, construindo novas formas de obtê-lo. Queremos dominar, controlar inteiramente o outro e subjugá-lo ao nosso deleite. Por isso construímos escalas de influência e barganhamos com uns com os outros.

Porém, o outro sentido de Hevel é o de que essa busca toda torna a vida em um gigantesco e abissal vazio. Por isso o texto diz que essa vida, efêmera e cheia de futilidades se torna uma vida vazia e angustiada que busca sentido e significado a partir de algum destes níveis. Por isso que, em consequência, Kohelet assevera não haver nada de novo no mundo e que tudo aquilo que é construído sob o sol não dura. Dito de outra forma, todas as coisas feitas pelo homem longe de Deus são vazias. Não passam de um grito solitário numa sala escura que ecoa para o próprio homem angustiado no vazio de si mesmo.

Em conclusão, o real direcionamento de Eclesiastes é: “não há felicidade sem Deus”.

Somente Ele pode preencher e dar sentido ao Hevel, vazio, da vida efêmera do homem.

Nas próximas semanas pretendo dar continuidade a este estudo e eu espero que você possa me acompanhar. Sejam abençoados em nome de Jesus!

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