A relevância da maré está na mudança
Bem-vindos e bem-vindas! Qual foi a última vez que você fez algo pela primeira vez? Tanto faz. Na verdade, dá para aprender muito passeando pela rotina que você já conhece.
“Mas o que é isso? O tempo parece estar estranho, não acha?”
“É… O tempo deve estar mudando…”
“Hummm, mudar é bom!”
“É. Mas não é fácil. Eu sei o que eu tenho que fazer, mas, se eu voltar, tenho que enfrentar o meu passado”.
Reconhece esse diálogo? Ele está em uma das cenas mais bonitas e emocionantes da animação “O Rei Leão”, de 1994, quando Rafiki, o babuíno conselheiro da realeza, encontra Simba, já adulto, para que ele se reconecte com o que tem evitado há tanto tempo. Mesmo sendo um filme voltado para o público infantil, o “Rei Leão” desperta reflexões bem complexas, que até os adultos têm certa dificuldade de encarar.
Uma delas é a mudança. Como disse Rafiki, mudar é bom. Como bem completou Simba, mas não é fácil. Com certeza, você já se deparou com a frase: “a mudança é a única constante da vida”. A frase é tão clichê quanto é verdadeira - o que, talvez, ela não deixe muito bem explicado é que as mudanças (no plural) acontecem apesar dos nossos planos - e não por causa deles.
A vida sempre arranja um jeito de nos surpreender para mudar.
Para os mais ansiosos, é comum prever possíveis cenários do que uma mudança, que desponta no horizonte, pode trazer. Mas a vida arranja, mesmo assim, um jeito de nos surpreender. E aí, qual a alternativa, senão dar nossos pulos para que o quebra-cabeça, que antes parecia estar quase completo e foi bagunçado diante dos nossos olhos, volte a se encaixar?
Nessa altura do campeonato
A mudança traz sentimentos muito contraditórios, porque ela está no espectro do que não podemos controlar - nós, seres humanos, somos obcecados pelo controle. A primeira grande evidência foi nossa capacidade de controlar o fogo. Depois, de controlar as terras, os animais. Então, veio o controle do tempo - e o desejo por controlar o que está à nossa volta deu um salto imenso.
É verdade que o controle de certas coisas é fundamental para vivermos na sociedade complexa que construímos. No entanto, muitas coisas, se não a maioria, fogem da nossa intenção de prever, antecipar e ter visibilidade sobre as consequências da mesma sociedade.
Esse abismo entre as mudanças e o controle que (não) temos sobre elas - mais do que isso, a consciência que desenvolvemos sobre as consequências da mudança, nos desperta um sentimento muito próximo ao pânico - e nos proporciona momentos preciosos de aprendizado e crescimento.
Consultando a ciência: Darwin, ao escrever sua obra máxima, “A Origem das Espécies” (1859), teorizou o que caracteriza a evolução e como as espécies passam por elas. Seu antecessor, Jean Baptiste Lamarck, dizia que os indivíduos de cada espécie eram capazes de fazer mutações para se adaptarem ao ambiente e depois transmitiam tais mutações para seus descendentes.
Se uma mariposa branca convivia em um espaço de fumaça industrial, ela poderia escolher mudar sua cor para marrom, para se camuflar e sobreviver. Assim, seus descendentes também seriam marrons, por causa da adaptação anterior.
Charles Darwin partiu desse princípio para chegar à sua teoria, mais aceita até hoje e, mais tarde, comprovada pelos experimentos genéticos de Gregor Mendel. A evolução das espécies se dava por meio da sobrevivência de quem já nascesse mais adaptado. No exemplo das mariposas: em um mesmo grupo, havia mariposas brancas e mariposas marrons.
As brancas acabavam sendo alvo de predadores e morriam, enquanto as marrons, mais adaptadas e camufladas no ambiente industrial, sobreviviam e geravam descendentes parecidos com elas, já também adaptados. Ou seja, os indivíduos que melhor conseguiam evitar predadores, sobreviviam, por isso a “lei do mais forte” acabou sendo aceita como resumo da teoria de Darwin.
Na verdade, a “lei do que se adapta melhor” é a que prevalece, principalmente, em relação às características físicas.
Transpondo esse pensamento para as vivências cotidianas e para a complexidade das relações atuais, vive de forma mais tranquila e leve quem consegue se adaptar às mudanças, inerentes à nossa realidade. Não é, necessariamente, questão de sobrevivência imediata, mas questão de viver de acordo com nossos princípios, crenças e consciência - o que, para o ser humano, é primordial.
Qualquer mudança exige resiliência - que é muito mais do que persistir, mas também resistir ao enfrentar a dor de romper o status quo. Juntando todas as peças do quebra-cabeça, quanto mais complexas as relações sociais, mais mudanças acontecem e melhor convivem com elas quem tem resiliência. Mas, e quanto às mudanças que nós escolhemos fazer?
Será que realmente são frutos de escolhas ou de necessidades?
As mudanças que alcançam a todos nós
Mudar, por si só, tem sido um combustível pessoal muito poderoso ao longo da minha vida. Vejo as mudanças como parte recompensadora e motivadora de quem sou, mesmo que algumas sejam doídas. Nem todo mundo encara as mudanças dessa forma, mas todas as pessoas precisam encarar as mudanças.
Aconteceram eventos recentes na minha vida, que podem implicar em algumas das maiores transformações pelas quais já passei. Primeiro, veio a Teresa - minha filha de quase 6 meses, que foi planejada e muito desejava, mas que também veio da nossa necessidade como família de crescer e pavimentar outros caminhos, com mais responsabilidades e desafios.
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A decisão de ter filhos é complexa: envolve muito da escolha pessoal, da escolha dos casais e da questão social do que é uma “família completa”. De qualquer forma, Teresa foi uma escolha muito feliz e esperançosa que fizemos, a partir da nossa própria necessidade.
Me tornar pai trouxe mudanças inesperadas, algumas imprevisíveis - e continuar sendo pai da Teresa (no conceito completo da palavra, não só como genitor), é uma decisão que tomo todos os dias, mesmo que os desafios pareçam maiores do que eu jamais imaginaria. Requer planejamento e opções por caminhos que não seguem qualquer manual.
Algumas delas doem, na escolha entre o que é certo e o que é fácil.
No ambiente profissional, as mudanças chegaram como um reconhecimento dos meus trabalhos e entregas anteriores - o que é muito gratificante. A sensação de estar no olho do furacão, cercado por casas, objetos e vacas voadoras (uma referência 30+: quem viu o filme “Twister”, sabe bem), tem me deixado, por vezes, atordoado. Passar por um turbilhão de situações novas é bastante vertiginoso.
Por que persisto em estar nesta posição não tão confortável na minha carreira? Por que seria ainda mais desconfortável para mim permanecer no mesmo lugar - minha ambição de crescer e, por isso, a necessidade de mudar, não me permitiriam. Tenho evidências muito fortes de que, depois que o furacão passar, vou encontrar o arco-íris brilhante e pensar, como o poeta:
“Tudo vale a pena, se a alma não é pequena”.
Outra questão importante: as mudanças vêm e, algumas vezes, você pode escolher entre duas origens para ela: ela vai nascer de dentro de você ou vai ser imposta por algum fator exterior? Mesmo aquelas que são repentinas e não dependem do seu planejamento: você vai deixar apenas os fatores externos te direcionarem ou vai, você mesmo, escolher como lidar com eles?
É um equilíbrio importante entre dois sambas: “deixa a vida me levar” e “quem sabe faz a hora, não espera acontecer”.
O mundo dos negócios vive como a maré, em constante fluxo. Tecnologia disruptiva (avançando na velocidade dos foguetes), clientes cada vez mais exigentes, com acesso às informações e cada vez mais conscientes.
As empresas que não se adaptarem, rapidinho, correm o risco de acabarem engolidas pela maré baixa da irrelevância. É preciso ampliar a perspectiva, entender o novo, enfrentar e encarar os medos, fazer concessões, se juntar àqueles que são bons em algo e, também, dar algo em troca.
Talvez essa seja a forma de viver, em vez de sobreviver, ao cotidiano: mudar com rapidez a nossa vida, a nossa figura executiva, a nossa postura enquanto pais e filhos. Para navegar nesse mar, e alcançar o tão desejado sucesso, as empresas e nós precisamos agir como surfistas experientes: flexíveis, ágeis e prontos para pegar a onda de mudanças.
É preciso refletir sobre o que pode diferenciar o “gênio” do “lunático”: a capacidade de investirmos em ideias que contradizem o que já fizemos durante os últimos tempos.
Os exemplos que nos alcançam
Graças a grandes mentes e pessoas as quais trabalho diariamente, descobri recentemente que existe uma arte japonesa que consiste em refazer cerâmicas quebradas, colando os pedaços e cacos com pó de ouro puro, não para esconder as marcas de reparo, mas para evidenciar o conserto. As cerâmicas consertadas não são mais como eram antes: os atos de quebrar e remontar são as partes mais bonitas, brilhantes e valiosas do processo - e as rachaduras mostram isso.
A arte é chamada de Kintsugi.
Como já contei, os esportes fazem parte da minha vida de uma forma muito intrínseca. E tem bastante relação com o Kintsugi: muitos dos melhores atletas transformam suas “rachaduras” em ouro puro, no que os diferencia positivamente dos outros tantos atletas. Uma campanha não tão recente assim da Nike, mas que me tocou, salienta esse ponto de forma inspiradora: KAEPERNICK NIKE AD.
Destacando alguns dos atletas que mais me inspiram e me servem como exemplos de vida - e de como encarar as mudanças, começo por Roger Federer. O documentário "Federer: Doze Últimos Dias" captura, com olhar íntimo os últimos momentos da lendária carreira do tenista. A principal delas é decisão da aposentadoria, talvez a maior mudança na vida de um atleta.
O filme acompanha Federer enquanto ele lida com a difícil escolha de se aposentar; se afastar das quadras como profissional do tênis, mudando de ídolo esportivo para um indivíduo que busca novos desafios e novas paixões. O documentário também celebra a competitividade aliada ao valor da colaboração, do respeito e da amizade.
Halftime Show
A relevância da maré está na mudança: a playlist.
Listei alguns outros atletas que me inspiram quando o assunto é mudança. Que tal dar play e conhecer mais sobre a história das mulheres e homens que se tornaram extraordinários porque assumiram as rédeas das mudanças da vida?
Billie Jean King é pioneira do tênis feminino. Ela lutou incansavelmente pela igualdade de prêmios em torneios como Wimbledon e U.S. Open. Sua atuação abriu caminho para que outros atletas reivindicassem seus direitos e melhores condições de trabalho.
Colin Kaepernick é o jogador de futebol americano que ajoelhou-se durante o hino nacional dos EUA, em 2016, protestando contra a brutalidade policial e a desigualdade racial. Seu gesto gerou um movimento global pelo Black Lives Matter e inspirou outros atletas a se manifestarem contra o racismo.
Bethany Hamilton é surfista profissional, que perdeu um braço aos 13 anos em um ataque de tubarão. Mas isso não a impediu de voltar às ondas e se tornar uma das maiores surfistas do mundo. Sua história de superação inspira pessoas com deficiência a superarem seus desafios e alcançarem seus objetivos.
Michael Phelps é um dos grandes nadadores olímpicos americanos, um dos atletas mais condecorados da história. Ele também enfrentou problemas de saúde mental, como depressão e ansiedade. Ao falar abertamente sobre suas experiências, Phelps inspirou outros atletas a buscarem ajuda e quebrarem o tabu em torno da saúde mental no esporte.
Mãe do Leo | Carreira | Consumer Insights | Responsabilidade Social | Strategic Insights Lead @Google
5 mEu sou do time da ansiedade também e que fica desenhando vários cenários, tipo a ansiedade no novo filme divertidamente, mas eu acredito muito na mudança como forma de crescimento, minha referência são os répteis que mudam de pele quando crescem, mudar de pele dói, cansa, você fica vulnerável, mas depois que a troca acontece você cresce e se renova! Muito boa a reflexão Mau, obrigada por dividir!
Strategic Insights Lead at Google | Matheus's Dad | Fiction Novel Writer
5 mParabéns Mau, gostei bastante deste TYMV :) Acho que me encaixo no perfil de que mudança traz mais ansiedade do que empolgação. Mas concordo que a troca do approach passivo para o ativo é a chave do negócio. Já que a mudança vai acontecer, o que você fez daquilo que fizeram com você? Ainda dá desconforto, mas pelo menos te deixa como um sujeito mais ativo pra navegar no meio da tempestade.