A Reordenação do Comércio Internacional de Commodities
A comércio internacional de commodities registou uma tendência ascendente nos últimos cinco anos. Embora as indústrias, de maneira geral, passem por ciclos plurianuais de altas e baixas de mercado, as perspectivas do setor de commodities parecem prósperas para os próximos anos, porém, com potenciais alterações estruturais significativas.
A transição energética em curso é uma transformação estrutural física e econômica que atravessa e integra os vários sistemas de comércio global, tanto de energia, de minerais, como também, de alimentos. Essa transformação aumentará a volatilidade no comércio internacional de commodities, causará perturbações nos fluxos comerciais abrindo novas arbitragens, redefinirá o que significa ser uma commodity e alterará fundamentalmente as relações comerciais internacionais.
Todos estes desenvolvimentos criarão oportunidades e desafios únicos para os players atuais e novos entrantes nesse mercado.
A comercialização de comodities cresceu substancialmente nos últimos 5 anos, quase duplicando de 27 bilhões de dólares em 2018 para cerca de 52 bilhões de dólares de EBIT em 2021. A maior parte deste crescimento foi decorrente da comercialização de petróleo, que aumentou, segundo dados de mercado, mais de 90%, para 18 bilhões de dólares, durante esse mesmo período. O setor de energia e gás ficou logo atrás, subindo de 7 bilhões para 13 bilhões de dólares. Essa trajetória se manteve ascendente durante 2022.
A transição energética está redefinindo a volatilidade e os custos de estoque flexível
Embora a descarbonização possa gerar benefícios econômicos e ambientais significativos, a inconsistência dos incentivos, os gargalos na cadeia de valor e as crises geopolíticas atuais têm redesenhado o panorama de oferta e demanda. Investimentos anuais em hidrocarbonetos tradicionais caíram 50% desde 2013, mas o volume de recursos comprometidos para a transição energética em 2021 e 2022 - cerca de 700 bilhões e 3 triliões de dólares respectivamente - podem não ser suficientes para evitar o surgimento de gargalos.
Sem uma reconstrução estrutural significativa da cadeia global de suprimentos, potenciais desequilíbrios no suprimento poderão acontecer, como por exemplo, a restrição na oferta de lítio e o níquel até 2030. Da mesma forma, só na Alemanha e na Itália, o espaço terrestre atualmente ocupado por fontes de energia renovável teria que dobrar de tamanho até 2030. Essas lacunas de oferta também são observadas não só no setor de energia, mas em outros setores, como por exemplo, no agronegócio.
O fato é que a maior suscetibilidade dos mercados às volatilidades de curto e longo prazo e aos ciclos de expansão e retração, aumentará a necessidade de manutenção de estoque flexível para superar os deslocamentos de mercado, aumentando assim, seus custos.
Nos últimos dois anos, os mercados sofreram picos históricos causados pelo COVID-19, por condições climáticas, por eventos geopolíticos e incerteza macroeconômica. Com isso, a volatilidade de preços atingiu valores recordes.
O preço do gás natural dos EUA, por exemplo, subiu de um mínimo de 25% no terceiro trimestre de 2021 para 179% apenas seis meses depois. O preço do gás europeu aumentou de menos de 10 euros por megawatt-hora (MWh) no segundo trimestre de 2020 para mais de 330 euros por MWh no segundo trimestre de 2022. Este pico levou as empresas de fertilizantes a paralisar a produção e as exportações.
Tendo em conta estas expectativas de maior volatilidade, a capacidade flexível, capaz de responder às mudanças das condições de mercado, se tornará cada vez mais crítica.
No entanto, estimar o valor desta flexibilidade com base em previsões é um grande desafio, especialmente quando os ativos físicos estão sujeitos a restrições operacionais, regulamentares ou ambientais.
Perturbações dos fluxos globais e potencial aumento da regionalização
O fluxo global de commodities continua vulnerável à potenciais perturbações causadas por eventos globais.
Os acontecimentos geopolíticos recentes iniciaram um reordenamento dos fluxos globais de commodities. A redução do fornecimento de energia da Rússia à Europa levou esta a depender de importações provenientes de localizações geográficas mais distantes, como América Latina, Oriente Médio, Estados Unidos e África Ocidental. Por outro lado, a Rússia passou a exportar maiores volumes para China e a Índia. Como resultado, os navios passam mais tempo em navegação e a otimização do frete pode ter um maior impacto nas margens de lucro. Por exemplo, os custos de transporte marítimo aumentaram drasticamente desde o primeiro trimestre de 2021, tendo os preços de fretes de navios de petróleo e gás natural liquefeito (GNL) aumentados em cerca de 228% e 266%, respectivamente.
Assim, a formação de blocos comerciais poderá ocorrer. As exportações russas de GNL poderiam ser totalmente excluídas dos mercados da OCDE, deslocando-se para China, Índia e Turquia. E, para suprir a lacuna da Europa, o suprimento de GNL poderia ser redirecionado a partir da Austrália e América do Norte. A Europa poderia limitar severamente a procura, uma vez que a capacidade de oferta de GNL global projetada é insuficiente para substituir completamente os volumes russos. Apesar desta "construção de blocos", os fluxos energéticos se ajustarão para equilibrar o sistema, e estes fluxos continuarão fortemente atrelados às relações comerciais. No caso dos metais, porém, é possível que os fatores geopolíticos possam sobrepor-se às relações econômicas e regionalizar significativamente os fluxos comerciais.
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Esta dependência de distâncias mais longas e redireccionamento de fluxos irá condicionar ainda mais o mercado marítimo.
A longo prazo, a transição energética pode contribuir para uma maior regionalização. À medida que o mundo se move para a eletrificação e combustíveis alternativos, as estruturas de custos subjacentes podem criar incentivos para mais redes de abastecimento locais e regionais e, por sua vez, reduzir os tradicionais grandes volumes e fluxos de longa distância de commodities, como petróleo, carvão e GNL. Mesmo com um movimento potencial em direção à regionalização, os fluxos comerciais globais provavelmente ainda seriam necessários para equilibrar os sistemas de energia no futuro previsível.
Gargalos para financiamento
A volatilidade dos níveis de preços das commodities vem aumentando significativamente os custos de financiamentos e de garantias.
Os grandes players de mercado, com grandes carteiras e balanços saudáveis aproveitarão estas restrições para aumentar consideravelmente as suas margens alavancando ainda mais sua vantagem competitiva frente aos pequenos players. Essa condição poderá criar oportunidades para que os grandes players se integrem aos pequenos, através de fusões ou mesmo através de parcerias vinculadas à mecanismos de financiamento. Por exemplo, em commodities ligadas à transição de energética, como o cobre, grandes players têm assinado contratos de longo prazo vinculados a pré-financiamento com mineradoras menores.
Para captar oportunidades, os comerciantes de commodities provavelmente terão que investir em:
1. Priorizar a centricidade no cliente à medida que a transição energética remodela as commodities
2. Investir em mercados de curto prazo, especialmente em novas commodities
3. Investir na descarbonização como uma classe de ativo, para aproveitar o 'prêmio verde' como vantagem competitiva
4. Aumentar a capacidade de negociação, já que escala é um fator crítico
5. Assegurar que a plataformas de negociação e o modelos operacionais equilibrem a eficiência e agilidade permitindo crescimento, especialmente à luz da escassez
A transição energética está redefinindo a classe de ativos de commodities com a chegada de novas ofertas diferenciadas por: posição geográfica, métodos de produção, marcos regulatórios e impacto ambiental - e, portanto, sendo valorizadas de forma diferente pelos clientes. O caminho de desenvolvimento dessas novas commodities será determinado pelas necessidades do cliente, disposição de pagamento e as melhorias econômicas geradas pelas novas tecnologias que determinarão o diferencial de cada commodity.
Caso você tenha interesse em discutir estratégias sobre o tema, entre em contato através do email beatriz@surestrategygroup.com
Beatriz Canamary é consultora e professora doutora em administração de negócios, mãe de trigêmeos e engenheira civil cearense especializada em fusões e aquisições pela Harvard Business School. Hoje se dedica a aplicação efetiva dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU em grandes empresas.
É entusiasta do ESG e torna possível a realização de projetos sustentáveis, como transição energética, por meio de Joint Ventures. Expertise de +15 anos em projetos de infraestrutura de grande porte. Membro do World Economic Forum, da Academy of International Business e Academy of Economics & Finance. Apaixonada por esportes e vida saudável.
Esse artigo foi publicado originalmente no site www.economicnewsbrasil.com.br
Posicionamento executivo | Estrategista de comunicação p/ C-levels |Mãe, palestrante & Mentora de thoughtleaders| Consultoria LinkedIn B2B @VContent | Personal Branding TOP Voice Thinkers360| Ghostwriter
1 aArtigo interessante, vejam só Adalberto Leidenfrost e Frank Jencik.
Diretor Comercial na Tecer Terminais Portuários Ceará
1 aParabéns pelo excelente texto e contribuir a reflexão.