"Só depende da Dilma pro Brasil sair desta situação" - Parte 2

"Só depende da Dilma pro Brasil sair desta situação" - Parte 2

Na primeira parte da entrevista com Helvídio Prisco, abordamos os aspectos mais teóricos a respeito da economia do país. Neste novo post, vamos abordar aspectos mais práticos, bolsa de valores e quais caminhos a presidente precisa seguir para que o Brasil saia da atual crise.

Aproveitem!

M - Prisco, o que dizer sobre o pedido de impeachment da presidenta Dilma?

HP - Essa história do impeachment foi um negócio maluco que esse pessoal da oposição inventou, pois, criminalmente, não recai sobre ela nenhuma acusação. Ela tem todos os defeitos do mundo, mas nenhum que a acuse de ser bandida, que roube ou qualquer outra coisa dessa natureza. Ela é uma mulher extremamente idealista.

M - E dizem, até, que esse idealismo forte dela é o que tá causando muito desses problemas, né?

HP - Exatamente! Além do fato de ser mulher, tem gente que não gosta!

M - Mas dizem que a Dilma cometeu crime de responsabilidade fiscal, por conta das pedaladas.

HP – Isso é um erro. A chamada pedalada fiscal na verdade é uma transação entre dois entes federados, que é o Tesouro Nacional e o BNDES, Caixa ou Banco do Brasil. Isso, na contabilidade, é chamado de “Regime de Competência e Caixa”, que significa que ou você faz o lançamento no momento em que fatura ou tira o dinheiro do seu caixa e paga, isso tudo no balanço.

O que o governo coloca pro BNDES não é investimento, contabilmente falando, é gasto. A dívida interna do governo está em cerca de 60% do PIB, sendo que a maior parte é dinheiro que o BNDES emprestou e vai receber de volta, então não é dívida, mas investimento

A chamada pedalada fiscal nada mais é do que isso. Por exemplo, imagine que o governo vai emprestar pra sua empresa, por intermédio do BNDES, uma quantia de R$ 100 milhões, mas recebe fracionado, à medida em que você constrói ou amplia a empresa. Esse dinheiro estaria lá, mas ainda não entrou.

O que acontece no governo é exatamente isso e eles consideram como pedalada fiscal, o que é ridículo. É uma demora de repasse, completamente normal, não houve perda ou ganho de dinheiro, existe apenas contabilmente e, nesses últimos anos, se você perceber, o governo mais recebeu do que pagou, disponibilizou mais dinheiro do que os bancos estatais gastaram. Os governos anteriores também faziam isso, mas eles não gastavam tanto incrementando a economia como esse.

M - Mas, então, por que isso é considerado um problema na Lei de Responsabilidade Fiscal?

HP - A Responsabilidade Fiscal é um processo mais complicado. Na década de 90, nós tínhamos uma dívida externa enorme e não conseguíamos pagá-la e foi quando o governo recorreu ao FMI (Fundo Monetário Internacional), que empresta dinheiro a curto prazo pra países que são sócios dele.

Para que ele empreste dinheiro, o FMI exige o uso de uma política econômica ortodoxa, que parte do princípio que, se o governo emitir mais moeda, ele vai causar maior demanda, que vai causar maior inflação. Como consequência, o FMI tende a barrar o poder que o governo tem de emitir moeda, para evitar inflação, o que permite aos bancos ganhar muito dinheiro, porque se o governo não arrecada e não pode emitir moeda, ele só se financia se for ao mercado financeiro e lançar títulos do governo, que é o que acontece no Brasil.

Com essa Lei de Responsabilidade Fiscal, você tenta segurar esse poder que o governo tem de emitir moeda, o que facilita a vida dos bancos, por isso eles ficam "em cima" e os ortodoxos defendem essa medida, mas não foi nada feito de errado, não existe crime algum.

Daí vem o TCU, que de tribunal não tem nada, é mais um "cabide" de empregos pra políticos que não ganharam as eleições, que começam a inventar factóides políticos. Esse é o problema, junta-se um desconhecimento geral, contábil e econômico, de finanças públicas, que é muito complicado e bem diferente de finanças privadas.

M - Interessante, pois, no mesmo dia do anúncio do impeachment, o governo aprovou as contas e permitiu que se aumentasse o déficit.

HP - Aquilo é um orçamento, nada mais do que um chute, uma projeção de gastos e de recebimentos que toda empresa faz.  Não é possível dizer exatamente quanto vai gastar ou arrecadar e até isso eles estão tentando criminalizar, que é pra abalar politicamente. Não existe uma empresa que tenha feito um orçamento e ele fechar, no final do ano, exatamente como previsto.

M - Agora, a bolsa reagiu com subida, no dia seguinte ao anúncio do processo de impeachment.

HP - Primeira coisa: você tem ações na bolsa?

M - Não!

HP - Então que se dane não se preocupe com a bolsa, pois aquilo é especulação, jogo, cassino, só interessa, na verdade, pra quem tem dinheiro aplicado nela. Isso não influencia em nada no dinheiro da população e é aí que vem o marketing negativo, ou seja, a imprensa repercute esse negócio como se fosse algo importantíssimo.

M - Mas eu vi muitos amigos defendendo o impeachment, com a justificativa de que a bolsa está subindo.

HP - Isso vai levar o arroz e feijão pra dentro de casa? Não.

Veja, quando existe o desejo de ampliar a empresa, você emite ações, que é chamado de "Emissão Primária de Ação". Esse dinheiro que você emite e vende, volta pra empresa e vira investimento, mas quando é negociada entre terceiros, o dinheiro não volta pra empresa e não se beneficia em nada.

O que pode afetar o valor das empresas (definido pelas ações, caixa, nome, marca e etc.) é quando o preço das ações cai e dizem, o que não é verdade, que ela se desvalorizou. O que rolou, de fato, foi apenas pro mercado financeiro, pra especulação, mas se você faz um "estardalhaço" danado com isso, as pessoas vão achar que isso vale de alguma coisa.

M - Então essa reação da bolsa significa que, quem tem dólar está começando a soltar mais? 

HP - Exatamente, ou seja, se, por um acaso, houver um impeachment e a Dilma perder, a política econômica que será adotada é a ortodoxa, que é favorável ao mercado financeiro. Por outro lado, se a bolsa voltar a cair, volta a acontecer tudo novamente.

M - Sim, porque é um processo volátil, certo?

HP - Pois é, a mesma desconfiança com o governo Dilma, vai se transformar em uma euforia de 15 minutos, mas, logo depois, isso cai, pois eles precisam convencer quem tem grana a comprar ações na bolsa. Em termos, a bolsa não influencia em nada na economia do país, só pra especular, "dar fervura", só isso. A não ser que haja emissão primaria de ações que vira investimento, compra de fatores de produção que aumenta a produção e a renda das empresas e das pessoas.

É lógico, se a economia está crescendo, todo mundo especulando na bolsa, daí sobra dinheiro e as pessoas vão querer ganhar ainda mais. Entretanto, como dinheiro não vale nada, ele precisa trocar por algo de valor, um carro, casa e o restante é usado para especulação.
Isso é o sistema de cassino!

M - Foi o que aconteceu com o mercado de imóveis, certo? Com dinheiro sobrando, as pessoas começaram a investir mais e o setor cresceu por conta disso. Consequentemente, cresceu a especulação, aumentou o preço e também foi volátil, né?

HP - Mas o mercado de imóveis tem uma particularidade, pois os preços continuam subindo e ninguém vende. Isso é especulação, não é o valor real do imóvel, portanto, tendo ou não tendo demanda, imóvel sempre sobe de preço, pois o corretor ganha em cima do valor vendido. E a valorização artificial do imóvel interessa ao proprietário, pois sua riqueza aumenta.

Por quê as pessoas gastam seu dinheiro? Primeiro porque tem pra gastar e segundo porque ele não vale nada. Todo dinheiro que recebemos é rapidamente trocado por algo que tenha valor, que satisfaça nossas necessidades.

M - Pra finalizar, qual estratégia econômica você acha que o governo Dilma deve adotar, no ano que vem, caso ela permaneça?

HP - Eu espero que ela volte a ser heterodoxa, desenvolvimentista, o que é bom pra todos nós, pois tanto o rico quanto o pobre ganham dinheiro e nós, da classe média, vamos junto. Portanto ela precisa baixar juros, o governo gastar mais e aí a economia começa a girar.

Agora, nós temos um entrave, que é o problema jurídico, esses procuradores malucos, ou seja, é preciso dar um jeito de prender todos os políticos e empresários que são bandidos e deixar as empresas trabalharem, senão a coisa não anda. Nós estamos quebrando uma cadeia importantíssima em tecnologia, geração de emprego e renda, que é a de Óleo e Petróleo. 

Se ela conseguir fazer tudo isso, vai ser ótimo!

M - E você acha que ela precisa voltar a dialogar com a base aliada? Pois ela está cada vez mais distante deles.

HP - Se você pensar em um cenário ótimo, o processo de impeachment é ruim, porque você entra em uma aventura maluca de um irresponsável como Cunha, em cima de nenhum argumento ou provas jurídicas, enfim. Por outro lado, foi bom ter acontecido neste momento, pois agora ela vai pro enfrentamento, no melhor estilo "ou vai ou racha”.

Se ela ganha, consequentemente conquista base política e consegue mexer na economia, mas se ela mantém a visão ortodoxa, ela perde a base do resto da população que a apoia, pois quem votou nela é adepto da política heterodoxa, da manutenção dos gastos sociais e melhor distribuição da renda. Esse é o grande drama.

Se a Dilma, realmente, com esse jeito firme que tem, bancar a “esperta” e sair do impeachment, desmascarar essa "corja" de político vendido, como o Cunha, o PMDB, a bancada religiosa, esses aproveitadores, ela consegue dar a volta por cima nesse cenário, recuperar o comando do processo econômico e sair ainda mais forte. Como consequência, ela leva esse governo nas costas até o fim.

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