Saúde para Todos - Ciência para benefício do SUS
Saúde para Todos - Ciência para benefício do SUS: integração entre nanotecnologia e dispositivos portáteis para auxílio no diagnóstico das doenças do Teste do Pezinho
Autores: Alexandre Dias Tavares Costa (BiPOC/LaCTAS/ICC/Fiocruz Paraná - Instituto Carlos Chagas) e Jacqueline Ferreira Leite Santos (LAMAI/IQ/ Universidade Federal do Rio Grande do Sul )
O Plano Nacional de Triagem Neonatal (PNTN) é uma iniciativa do Ministério da Saúde para diagnosticar uma série de doenças geneticamente determinadas logo nos primeiros dias de vida do recém-nascido. Atualmente, são seis as doenças obrigatoriamente testadas: fibrose cística, fenilcetonúria, hiperplasia adrenal congênita, hipotireoidismo congênito, hemoglobinopatias e deficiência da biotinidase.
A presteza na coleta das amostras é de suma importância para o sucesso do diagnóstico e para a efetividade do tratamento. Assim, os protocolos oficiais preconizam a realização da coleta da amostra até o 5º dia de nascimento. Entretanto, os dados mais recentes mostram que as coletas são realizadas, em média, de 30 a 50 dias após o nascimento. Em alguns casos extremos, esta coleta tardia praticamente inviabiliza o sucesso dos tratamentos existentes.
Geralmente, as coletas em áreas remotas ou de difícil acesso são realizadas tardiamente por vários motivos, dos quais se destacam a falta de acessibilidade da parturiente a serviços médicos básicos, como acompanhamento e atenção após o nascimento, e a falta de conhecimento sobre as doenças neonatais e os tratamentos disponíveis. A falta de acessibilidade a testes diagnósticos e de acompanhamento da saúde materno-infantil pode ser decorrente de diferentes fatores, como do resultado da distância física entre o local do nascimento da criança e os serviços de saúde, de dificuldades financeiras para custear o transporte até os serviços de saúde, ou pela falta de recursos dos serviços de atenção para se deslocar até a criança e fazer a coleta, para posterior análise em laboratórios clínicos em centros urbanos.
Nesse contexto, o desenvolvimento e otimização de dispositivos portáteis e de fácil manuseio para realização de testes diagnósticos sensíveis e específicos, diretamente no ponto de atendimento, por pessoas com treinamento básico, é um fator que pode auxiliar na extensão do diagnóstico neonatal para efetivamente todas as crianças nascidas no Brasil. Dentre as tecnologias disponíveis, destaca-se a obtenção de novos nanomateriais para a construção de dispositivos confiáveis e seletivos, apresentando altas sensibilidades. Estas características são possíveis graças à alta relação superfície/bulk destes materiais, somada às particularidades decorrentes da dimensão nanométrica, como intensificação de resposta óptica e melhoras na taxa de transferência de carga.
Assim, unindo a expertise do Laboratório de Materiais Aplicados e Interfaces (LAMAI) do Instituto de Química da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (IQ/UFRGS) e do Grupo de Pesquisa em Bioenergética e Testes Diagnósticos Point of Care (BiPOC) do Laboratório de Ciências e Tecnologias Aplicadas em Saúde (LaCTAS), do Instituto Carlos Chagas (ICC/FIOCRUZ Paraná), apresentamos o projeto “Construção e avaliação de um dispositivo portátil integrado com nanomateriais semicondutores para auxílio no diagnóstico de fibrose cística e hiperplasia adrenal congênita em áreas remotas ou ambientes com pouca infraestrutura”. Este é um projeto multidisciplinar, que envolve diferentes etapas e metas que só serão possíveis de serem concretizadas graças à sinergia da equipe responsável por sua execução. A fibrose cística é uma condição genética e debilitante, tratável quando diagnosticada precocemente, que faz com que as glândulas do corpo produzam secreções mais espessas, provocando tosse e infecções pulmonares reincidentes, dentre outros sintomas. A hiperplasia adrenal congênita é uma condição que decorre da insuficiência das enzimas envolvidas na síntese do cortisol no córtex adrenal, resultando em mudanças em caracteres sexuais secundários, em especial a presença de excesso de pelos.
No LAMAI, serão obtidas novos nanomateriais semicondutores e seus nanocompósitos com nanopartículas metálicas visando as aplicações de interesse. Para isso, estudamos suas características relacionadas à morfologia, composição, estrutura cristalina e comportamento eletroquímico utilizando equipamentos de alto cunho tecnológico presentes nas instituições executoras e parceiras, tais como a University of Victoria (Canadá).
Em uma segunda etapa, são produzidos eletrodos miniaturizados (1 x 3 cm2) através da técnica de impressão por serigrafia. No LAMAI é projetado o design do eletrodo, fabricação de tintas condutoras e impressão dos eletrodos (SPE, screen-printed electrodes) sobre diferentes materiais suporte, como vidro, plástico ou papel. Estes eletrodos são modificados com os nanomateriais obtidos visando a construção do (bio)sensor e permitem a análise de volumes reduzidos de amostra. Enquanto uma célula eletroquímica convencional requer 10 – 20 mL de eletrólito, o SPE utiliza apenas uma gota (em torno de 0,05 mL), uma vez que os três eletrodos (trabalho, contra e referência) ficam confinados em uma área delimitada menor de 1 cm2. Até o momento, desenvolvemos um sensor visando o diagnóstico de fibrose cística com performance laboratorial superior às tecnologias vigentes no mercado.
Em paralelo, o BiPOC se dedica à obtenção de um dispositivo portátil de leituras eletroquímicas visando integração com o SPE. O potenciostato portátil permitirá a execução de todas as medidas necessárias diretamente no ponto de atendimento, sem que sejam necessárias infraestrutura complexa e pessoal especializado para operá-lo. Os protótipos são construídos com impressoras 3D, de forma a permitir a rápida mudança de parâmetros, buscando um design que atenda tanto as necessidades do teste quanto traga facilidade de operação para os usuários. O BiPOC também tem se dedicado ao desenvolvimento de eletrodos de grafite miniaturizados e biofuncionalizados com moléculas de captura de analitos de interesse, como o hormônio 17-hidroxiprogesterona (17-OHP), que é um dos marcadores biológicos da hiperplasia adrenal congênita.
Com o sucesso deste projeto, pretendemos criar condições para que estes testes possam ser usados por agentes de saúde, postos de saúde ou unidades de saúde da família em localidades afastadas de centros urbanos, efetivamente providenciando acesso a diagnósticos mais sensíveis e específicos a populações em situação de vulnerabilidade, seja por questões econômicas, ou dificuldade de mobilidade, ou mesmo distância física.
Por fim, é importante ressaltar que este projeto se identifica principalmente com o ODS 3 (Saúde e bem-estar), em virtude de desenvolver um novo produto voltado para a saúde e diagnóstico de doenças debilitantes. Entretanto, é impossível não mencionar a sua conexão com o ODS 10 (Redução das desigualdades), por permitir o diagnóstico mais rápido destas doenças em contextos em que a desigualdade econômica e a dificuldade de acesso a serviços básicos de saúde são fatores limitantes para uma vida digna.
Estrategista de Conteúdo e Especialista de Marketing Digital
5 mMuito legal ver o trabalho para fazer o SUS ainda melhor!