Se as empresas familiares não se profissionalizarem, o Brasil quebra.
Dados do IBGE indicam que 90% das empresas no Brasil possuem perfil familiar. Com isso, elas chegam a representar cerca de 65% do PIB e são responsáveis por empregar 75% dos trabalhadores no país. Quase a metade das pequenas empresas não sobrevive para comemorar seu quinto aniversário...
Baseado nesses números, temos aqui um indicador de risco bastante expressivo, sem nem precisar usar métodos conhecidos como curva ABC e Pareto, quando queremos tomar decisões ou prestar atenção ao que realmente é importante.
O que esses números nos dizem e o por que são importantes, quando se fala em estratégia e posições de futuro?
Para qualquer empresa, somente existe futuro. Todos os seus atos, investimentos, movimentos, clientes compradores e todos os outros players conexos ao seu modelo de negócios só fazem sentido daqui para frente. O que compraram ontem ou no mês passado pode ser irrelevante para a continuidade de uma organização. As pessoas também.
Nenhuma empresa funciona sem pessoas. São elas as únicas que podem escolher qual o próximo passo a tomar. Computadores podem sugerir caminhos, mas alguém os escolhe.
Se o destino das companhias reside, então, em escolhas feitas por pessoas, essas, na sua maioria, em posições de direção, mesmo que apoiadas por múltiplos recursos tecnológicos e cercadas de excelentes colaboradores, devem compreender que sempre há riscos a serem corridos, sejam quais forem os fatores que possam comprometer o atingimento de seus objetivos, por mais sensatos que possam parecer.
A prudência e a erudição estratégica nos ensinam a pensar em ações que possam dar continuidade às organizações, provendo sustentação, perenidade e solidez a médio e longo prazos, pois, conforme a experiência foi mostrando a todos que conduzem organizações, gerir somente para conquistar a curto prazo pode trazer um alento para o caixa, mas não o suficiente para mantê-lo quando a empresa mais precisar. A visão de futuro se sobressai ao hoje, por melhor que estejam as vendas presentes. O mercado se modifica, novos competidores surgem e uma disrupção tecnológica pode liquidar os mais brilhantes protagonistas da atualidade.
Neste particular, é importante ressaltar o modo de se gerenciar as companhias familiares, principalmente quando o comando ainda está com o seu fundador e vemos, amiúde, fotos de muitas dessas organizações comemorando seus jubileus de 50 anos! Nessas fotografias podemos notar a presença de um senhor de cabelos totalmente brancos cercado de familiares e colaboradores, normalmente contando histórias de como a empresa começou. No caso brasileiro, fotos de carroças, cavalos e galpões de madeira em frente a estradas sem calçamento não são de espantar, ao se voltar, nostalgicamente, ao início de muitos desses empreendimentos. Empresas do interior do Brasil começaram assim, quase que juntas à fundação de várias cidades, estas com pouco mais de meio século.
Após esses jubileus e pela saída de seus fundadores é que normalmente começam a surgir os elementos que ditarão dois distintos destinos a essas empresas: o crescimento ou o debacle, independente da sua intensidade.
O que promove tão drásticos movimentos que levam as organizações familiares a experimentarem tão diferentes fortunas?
Pessoas, principalmente as do comando organizacional.
Na expressão "empresa familiar", a palavra mais importante é empresa. É justamente aqui é que são separados os sucessores dos herdeiros.
Os sucessores só podem ostentar esse título, caso se comportem de maneira a continuar a conquistar sucesso a médio e longo prazos, pois, ao assumirem o comando, devem ter em mente que a cadeira onde estão sentados já existe antes mesmo de eles terem nascido.
Os sucessores são sinônimo de sucesso incondicional?
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Não, porém, ao gerirem suas organizações com visão futura, se afastarão prudentemente da tentação do sucesso a qualquer preço, mas de curto prazo, e que esconde efeitos colaterais de médio prazo.
Esse atributo de prudência é passado automaticamente pelo fundador ao seu sucessor?
Não, porém, pode ser aprendido e exercitado, e aqui reside a base para dar condições para o sucesso sucessório: aprendizado, estudo, erudição, capacitação e experiência, seja ela moldada na própria organização familiar ou em outras antes de se assumir o comando. Formam-se profissionais com maiúscula, e, como passarinhos de mesma pena voam juntos, gostam de se relacionar com outros da mesma estirpe. Vão se associando a colaboradores que comungam e compartilham pensamentos em níveis semelhantes. Veja que qualquer empresa ao contratar um gestor, quer antes ver suas credenciais, experiência e erudição em cargos de comando. Nunca esquecemos de ler com atenção seus currículos. Isto não deveria ser diferente quando se busca o nome mais adequado para o comando sucessório.
A outra espécie é o herdeiro que assume o comando.
Qual é a diferença fulcral que o separa do sucessor?
O total despreparo em termos de conhecimento técnico, erudição para gerir, experiência em comando e toda a sorte de desapego ao que acontecia nos bastidores da administração da empresa do seu pai, avô ou de qualquer parente que comandava a organização. Talvez só seu sobrenome se aproxima ao logotipo estampado na placa de entrada. Durante anos viveu da empresa, mas não por efeito de seus atos laborais, porque na maioria das vezes foi um ilustre visitante que nem sabia ao certo o que a empresa produzia. Nunca serviu à companhia, apenas se serviu dela, quase sempre abocanhando um pouco do seu caixa, sem nem fazer ideia de como ele era formado ou preenchido.
Ao assumir à empresa, o herdeiro passa a ter comando do caixa. Herda a riqueza. O saldo bancário da companhia passa a ser o seu saldo. Como sempre teve o que precisava e na velocidade pretendida, sua maior preocupação com o tempus é o de colher e não o de plantar, e aqui ele se prende aos encantos da propriedade. Para que não seja subjugado a limites, cerca-se de lacaios, bajuladores e outros de menor estirpe que não se atreverão a contestá-lo, por mais aviltante hão de ser seus atos quando comparados com o comportamento empresarial dos fundadores. Como resultado, uma espécie de sortilégio se lança contra si, enevoando sua visão sobre o que realmente constrói o caixa da empresa: a compreensão dos movimentos do mercado com o correto e preciso alinhamento dos ativos e recursos internos, quando são escolhidas e chanceladas as melhores estratégias que levarão a empresa ao futuro, mas, para saber disto, é preciso erudição e experiência. Infelizmente, para o herdeiro, futuro é uma palavra que não lhe cabe, pois sempre viveu do presente. De proprietário passa a ser o “propriotário” do negócio. É preciso reconhecer suas limitações e, num lampejo de bom-senso, buscar ajuda com profissionais para assumir o controle da gestão de sua empresa (sua herança), como muitos, para sua própria felicidade, acabam optando, caso contrário, lenta e silenciosamente ela vai desaparecendo...O fracasso é sempre oneroso e um triste fim para qualquer empreendimento.
E daí?
Empresas familiares são 65% do PIB e são responsáveis por empregar 75% dos trabalhadores no país. Só isso. Dependemos da compreensão desta dimensão para a sobrevivência econômica do país.
Finalizo este artigo com a célebre citação de Alfred Marshall em seu livro Principles of Economics, quando teoriza que a capacidade empreendedora nem sempre é herdada.
“Quando um homem reúne um grande negócio, seus descendentes muitas vezes falham, apesar de suas grandes vantagens, em desenvolver as altas habilidades e o temperamento especial necessários para levá-lo adiante com igual sucesso... Quando uma geração completa passou, quando as velhas tradições não são mais um guia seguro, e quando os laços que mantinham o antigo pessoal foram dissolvidos, então o negócio quase invariavelmente cai em pedaços...Do macacão ao macacão em três gerações.”
Sócio Diretor na PS Cortes e Furos Ltda
2 aO problema não é a empresa ser familiar, mais a administração não ser profissional. Não dá para misturar.
Como revelar ao capitão do Titanic que esse iceberg pode afundar o navio?
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2 aE como fazer com que os empresários proprietários dessas empresas familiares entendam que precisam de mão de obra qualificada? Esse é o grande desafio, na minha opinião.