“Se você estiver ouvindo a interpretação, por favor levante a mão.”

“Se você estiver ouvindo a interpretação, por favor levante a mão.”

Nós precisamos falar sobre “Se você estiver ouvindo a interpretação, por favor levante a mão.”, uma frase comum usada por intérpretes quando estes acreditam que não há participantes usando o fone de ouvido na plateia. É, de fato, chato e desgastante interpretar para as alergênicas paredes da cabine, mas seria essa abordagem a mais adequada?

Primeiramente, coloque-se no lugar de um participante da plateia que esteja atrás de uma pilastra (motivo pelo qual você não o viu e muito menos seu fone de ouvido) quando de repente ouve: “Se alguém estiver ouvindo a interpretação, por favor levante a mão”. Ele levanta a mão, o palestrante pensa que é uma intervenção, interrompe a fala, o ouvinte não tem nada a perguntar pois estava na realidade tentando sinalizar a cabine e por aí se desenrola um ruído na comunicação. Essa interrupção interfere na linha de pensamento do orador e pode ainda acabar chamando atenção negativa para os intérpretes. Poderia ter dormido sem essa, não?

Agora, digamos que a sala seja realmente pequena e que o intérprete consiga visualizar bem cada um dos participantes. Percebe que não há ninguém de fones e portanto, silencia. Subitamente, o cliente adentra a sala como uma chaleira em ebulição dizendo que a interpretação não está funcionando. Ops! Parece que havia alguém ouvindo a interpretação fora da sala...

Pensemos também que os fones de ouvido estão ficando cada vez mais discretos: pequenos e muitas vezes unilaterais. Se o intérprete não vir o fone - e partindo do pressuposto que a maioria dos participantes não levanta a mão quando requisitado - você vai deixar seu interlocutor desatendido. Se o participante for muito tímido, ele talvez não fale nada na hora e sequer contraia os músculos faciais em sinal de descontentamento. Porém, se ele tiver a oportunidade de preencher um formulário de avaliação a posteriori, muito provavelmente relatará o ocorrido.

Há ainda o que chamo de fator “inglês pseudo-fluente”. Em eventos corporativos é importante lembrar que muitos colaboradores estão diante de seus chefes e outros superiores. Durante a fase de contratação, muitos juraram de pés juntos que falavam inglês fluente, mas não hesitam em discretamente usar a milagrosa caixinha preta durante eventos. Você acha mesmo que esse sujeito vai levantar a mão ou fazer qualquer outra coisa que chame ainda mais atenção para ele quando tudo que ele quer é a capa de invisibilidade do Harry Potter? Na-na-ni-na-não!  

Se não essa, então qual seria a abordagem mais adequada nessas situações? 

Algumas ideias:

-      Converse com o seu cliente. Pergunte a ele se você pode fechar o microfone caso tenha absoluta certeza que não há ninguém ouvindo. Defina uma estratégia de rápido reinício caso alguém subitamente resolva ouvir a interpretação.

-      Combine com o técnico ou a recepcionista que entrega os fones para avisarem a cabine caso nenhum fone tenha sido entregue e assim que o primeiro for entregue.

-      Se você estiver bem disposto, com as cordas vocais em dia e bem hidratadas, siga interpretando, independentemente de ter ou não ouvintes. Afinal, não ganhamos por número de ouvintes e sim por hora corrida.

Em último caso, use a famigerada frase com uma pequena modificação: “Estamos com dificuldades técnicas, se alguém estiver ouvindo bem a interpretação, por favor olhe para a cabine ao fundo da sala.” Essa frase não gera o risco de interrupção por parte do palestrante e deixa o tímido mais à vontade.

Você tem outras técnicas para verificar se há ouvintes para a sua interpretação? Você desliga o microfone caso não haja ninguém ou continua interpretando mesmo assim? Compartilhe abaixo.

     

      


Giovanna Lester

Intérprete || Tradutora português (BR) x inglês - ajudo empreendedores, indivíduos, advogados e empresas a se comunicarem.

7 a

Eu aproveito para praticar. Especialmente se o assunto é algo com que não trabalho com a frequência desejada.

eliane rio branco

Intérprete e Tradutora na Autônoma

7 a

Interpreto sempre

Denise Bobadilha

Intérprete e tradutora Inglês<>Português, jornalista. CNN Brasil. Pós-graduanda em Política Contemporânea e Relações Internacionais. @denisebob

7 a

Sou pelo interpretar, sempre, independentemente de quantos (se alguém) está ouvindo. E é muito comum notar esses "pseudo-fluentes" começarem o evento sem os fones e, depois de algum tempo, usarem, tanto por não estarem entendendo ou, mais comumente, por notarem que um colega em degrau acima está de fone.

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