Seu CPF vale muito!
Não é mais novidade que a ciência de dados vem causando revoluções. Desde sempre, toda ação produz informação. A evolução tecnológica desenvolveu meios de coletar essas informações em grandes volumes. Com isso, a formação de massas de dados abriu possibilidades para análises complexas. A partir dessas análises, produz-se conhecimento. Como tudo na vida, há os pontos positivos e discutíveis acerca disso.
Para as empresas, o dado cadastral virou uma mina de ouro. Grandes bases de dados, que já tinham importante relevância para qualquer negócio, passaram a oferecer diferenciais competitivos. Imagine uma locadora de veículos: em vez de saber apenas que determinada empresa comprou R$ 1 milhão em locações nos últimos dez anos, é possível aplicar uma análise mais complexa e descobrir que essa empresa aluga sedãs de luxo com maior frequência entre janeiro e março. Isso é conhecimento, através do qual é possível elaborar estratégias comerciais que fidelizem clientela e aumentem receitas, por exemplo. As possibilidades são infinitas, como dissemos, mas há questões éticas que merecem discussão.
Quando falo disso gosto de contar um caso polêmico e fictício. Veneno puro, mas que dá a dimensão do meu raciocínio. Imagine a farmácia 24h, que guarda o CPF dos seus clientes em cada venda. Fazendo análise de dados, "descobre" que um determinado cliente compra energético, lubrificante íntimo e preservativo toda sexta-feira à noite. Que tipo de conclusão irão tirar disso? O que farão com essa conclusão? Quem vai ter acesso a esses dados? Não há nada de anormal nos hábitos de consumo dessa pessoa, mas a que tipo de linchamento pode-se submeter alguém baseado nesse conhecimento presumido?
Tempos atrás, uma grande rede varejista de Belo Horizonte enxergou o poder de conhecer os hábitos de seus clientes. Gostou tanto da ideia que passou a oferecer preços diferenciados a quem informasse o CPF no ato da compra. Quem não gostou muito dessa prática foi o PROCON-MG, que convocou a empresa para explicar essa prática. O resultado foi uma multa de quase R$ 8 milhões e o fim disso. Há outras empresas no mercado bastante interessadas nos nossos CPFs, porém fazendo abordagens mais sutis.
Não condeno a intenção de rastrear os hábitos de consumo dos clientes. Isso pode trazer ganhos para os dois lados, como propaganda focada em interesses individuais. O que acho fundamental é dar ao cliente visão real do que está sendo feito com o dado cadastral dele, de modo que ele decida se cede a informação, ou não. Usar o argumento simplório do "CPF na nota" é que não dá. A relação precisa ser, sobretudo, honesta. Eu, particularmente, fico com um pé e meio trás quando qualquer cadastro me obriga a informar CPF.
A ciência de dados é uma das maravilhas do nosso tempo! Suas possibilidades trazem ganhos para todos os setores, com potencial de melhorar as nossas vidas em todos os aspectos - inclusive nas pesquisas ligadas à saúde, em tempos tão difíceis como esse em que vivemos. Entretanto, é preciso ter consciência dos impactos que podem chegar à sua vida com isso. Valorize seu dado cadastral.
Seu CPF é a sua pegada ficando por onde você anda. Vale muito.