Singularity University: Conheça pelo relato de quem esteve lá – Mariana Vasconcelos
Conversei com a Mariana Vasconcelos para saber sobre a sua trajetória como empreendedora e também conhecer um pouco sobre a experiência dela na Singularity University, que é um centro de ensino localizado em uma base de pesquisa da Nasa e capacita líderes com as chamadas 'tecnologias exponenciais' para o enfrentamento de grandes problemas do mundo.
A Mariana foi vencedora do concurso Call to Innovation, promovido pela FIAP, faculdade de tecnologia localizada em São Paulo. Todos os anos promove a competição que premia o ganhador com uma vaga no Graduate Studies Program da SU. A competição em 2015 teve como tema a crise hídrica e com o projeto AgroSmart, que ajuda a evitar o desperdício de água em plantações agrícolas, Mariana garantiu o primeiro lugar.
Da UNIFEI à SU
Mariana é administradora e o curso de graduação que fez na Universidade Federal de Itajubá é bastante focado em empreendedorismo, ensina o comportamento e mostra as possibilidades de criar um negócio. No terceiro ano, tentou abrir o primeiro, uma empresa de base tecnológica. “Na época não chamava startup, como hoje. Era na área de hospedagem e computação em nuvem. Tínhamos um negócio, funcionava, mas não era uma coisa super escalável, que conseguia crescer muito, gerar um grande impacto”.
“Tive a oportunidade de fazer estágio na Bosch, na Alemanha. Larguei a empresa e fiquei um ano lá. Como já gostava dessa área de inovação e o ecossistema do país era mais desenvolvido que o nosso, comecei a frequentar vários eventos. Juntei com outros amigos aqui do Brasil e fundei a Smartapps, que acabou sendo uma plataforma de internet das coisas”.
“A Smartapps também estava indo bem, mas no começo de 2014 começamos a ter problemas entre os sócios. Era uma divergência de visão, de valores e decidimos sair. Éramos quatro sócios, saímos três e montamos a Agrosmart. Já conhecíamos a tecnologia muito bem e eu vivia do outro lado o problema no meio rural, meu pai é agricultor. Em dezembro de 2014 entramos no StartUp Brasil e fomos acelerados pela Baita”.
“Estudar na Singularity mudou muito a minha visão. Eu sempre tive esse lado importante de fazer um balanço na área de negócio, de não só buscar lucro, mas fazer uma coisa que realmente tenha impacto. Isso já era um valor meu e lá isso se potencializou, porque você realmente entende como pode gerar impacto. A SU ensina esse conceito te expondo ao que acontece hoje. Oferece aulas focadas em cada um dos desafios globais, e traz especialistas do mundo todo que vivem essa realidade”.
“ONG’s e empresas que trabalham nesse setor nos expõem o que está faltando, onde está o problema, qual é o gargalo, o que as pessoas passam, mostram os números, somos expostos ao problema. Por outro lado, do mesmo jeito, a Universidade expõe todas as últimas tecnologias que existem. Onde estamos em questão de computação, eletrônica, biomedicina, neurociência. Expõe em conteúdos e em partes práticas o que está acontecendo nas duas pontas”.
“Também fala de convergência, que é como a gente integra esses pontos entre si. Vários desafios estão interconectados e as tecnologias também podem ser misturadas para resolver esse problema. Cabe ao perfil de cada aluno a habilidade de fazer essa conexão. As últimas cinco semanas, metade do programa, são focadas em projeto. Temos a missão, com os colegas, de criar um projeto que vai aplicar uma tecnologia que aprendemos, ou várias, para resolver um problema social. Mistura o lado expositivo com a prática, isso tudo com ajuda de mentores, professores e especialistas que nos dão suporte”.
“Depois do curso vários projetos continuam como empresa. É como se garante que vai acontecer o impacto. Mas a SU sabe que mesmo que você não continue com o projeto no qual trabalhou, vai conseguir transferir o aprendizado para os seu negócio e para a sua localidade. Lá trabalhei em um projeto referente a agricultura, para lidar com os problemas de comida e, no meu caso, de corrupção. Agregou ao meu negócio daqui, porque é uma parte da cadeia dele e me deu uma visão mais global. Na exposição dos problemas vi vários outros desafios que temos nessa área que eu posso expandir depois com a minha empresa”.
“Minha visão como gestora mudou muito, sobre como lidar com a equipe. Conheci outras formas de gerenciar, outras formas de gerar impacto, percebi para onde eu preciso estar olhando para isso, qual tecnologia eu posso usar, como pensar no futuro. As conexões foram muito importantes, conheci muitas pessoas que hoje são muito valiosas como networking”.
Como as tecnologias exponenciais podem contribuir para negócios mais sustentáveis?
“É mais simples do que pensamos, são pequenas coisas e quantos mais delas a gente começa a fazer, mais resultados conseguimos ter. Um modo de potencializar isso é começar a ter contato com as pessoas que já têm esse mindset. Quando você se encontra com pessoas que compartilham dessa visão, que querem gerar impacto positivo no mundo, você consegue maximizar o seu alcance, trocar ideias”.
“A grande inovação e o maior impacto começam perto de nós. Se você resolve o problema de uma pessoa, pode resolver de milhões de pessoas. O jeito mais fácil é você olhar para o seu cotidiano e entender como aquele desafio se demostra dentro do seu ecossistema. Se você está falando de fome, de corrupção, de água, tente emoldurar o problema na sua realidade, e aí você entende um ponto do problema que você quer resolver”.
“O problema não existe só lá na África, só na favela. Às vezes está na própria comunidade rural da sua cidade, ou em algum bairro. Então é importante conhecer esse problema de perto e começar a resolver um ponto. Você não precisa resolver o problema inteiro da humanidade, não vai acabar com a fome em um dia, mas pode minimizar isso em um ponto e aí descobrir como se conectar com outras pessoas que também estão resolvendo isso em um ponto. Dessa forma você consegue escalar e repetir esse modelo para ir resolvendo cada vez mais esse problema de forma geral. Os problemas estão aí e as tecnologias estão aí, é mais questão de estarmos com o mindset pronto para querer enxergar”.
O que foi mais surpreendente?
“Gosto bastante da área de Inteligência Artificial, está avançando bastante e tem muito mais aplicação do que se imagina. O legal da SU é que você vê que não precisa usa IA só em soluções sofisticadas, você pode até usar para interagir ali com agricultor no dia a dia. A questão é que a tecnologia é uma coisa, a interface com o usuário é outra. Essa interface e a aplicação podem ser muito simples e por trás se está utilizando uma tecnologia de grande impacto. Outra área que me interessa muito é a de bioinformática e genética. Estamos melhorando muito nessa parte de entender o nosso genoma, o nosso DNA, conseguir fazer modificações, diagnósticos mais rápidos, entender melhor o corpo para atuar em outros lados da medicina”.
“As aplicações já fazem parte da vida da pessoa, já estão aí. Nem tudo está pronto. A própria IA tem limitações regulatórias, questões éticas. Há limitações que fazem com que não seja altamente escalável, não é toda solução que você consegue realmente usar IA. Tem sido mais no contexto criativo e educativo do que realmente aplicado. Mas quanto mais pessoas tomam consciência de que isso existe e conseguem enxergar aplicações, mais soluções vamos começar a ver daqui para frente”.
“Muitas pessoas querem conhecer o programa da SU para ficar sabendo das tendências, para usar isso para ganhar dinheiro. Não é isso que a Singularity quer, mas sim pessoas que desejam empreender porque estão preparadas para voltar e fazer alguma coisa para gerar a mudança. Ela procura fazedores. O que você já fez? O que você faz hoje? E a profissão não interessa, não são só pessoas de tecnologia. Na minha turma tinha pessoas de 44 países. A riqueza cultural foi imensa”.
Muito obrigada pela conversa, Mariana!
“Agradeço também! Eu não sabia da Singularity até que me mostraram, não sabia que existia um programa desses, que é aberto, que qualquer pessoa pode aplicar. Divulgar a informação é realmente empoderar as pessoas. Não só a informação da tecnologia, mas a mentalidade, de saber que existe abundância de recursos, que estão ao nosso alcance e que a gente pode mudar o mundo".