Sinopse de hoje: O MUNDO, UM VERDADEIRO SANATÓRIO
Por: Wagner Rotta
Sinopse:
Meu primeiro texto teatral, escrito em 1984 e depois reescrito em 1989. Começou como um experimento cênico de seis páginas e depois ganhou corpo e citações mordazes num total de 23 páginas. A peça faz uma crítica sócio econômica de forma bastante irônica aos acontecimentos da época em que foi escrita, porém, alguns continuam bem atuais, como: corrupção, discriminação racial, religiosa, social e por opção sexual, entre outros. Apenas dois atores em cena se revezam em vários personagens. Um sempre o opressor e o outro sempre o oprimido.
Segue um trecho da peça:
CENA 1
Entra em cena o 1° Ator vestido com um terno preto, todo amarrotado, mangas arregaçadas e um boné. Pega uma vassoura e começa a varrer o chão e ao mesmo tempo dança.
1° ATOR – Isto aqui está uma bagunça! Coisa de louco! Coisa de louco... (Arruma os livros na estante e sai)
CENA 2
Entra em cena o 2° Ator engatinhando, vestido um roupão listrado. Usa um chapéu de cowboy, cinturão e sapatilhas.
2° ATOR – (Para a plateia) Silêncio! (Começa a revirar tudo)
CENA 3
O 1° Ator volta à cena.
1° ATOR – Meu amigo, você está aí.
2° ATOR – (Assustando-se) Estou... só dando uma voltinha.
1° ATOR – Gostou da arrumação que eu fiz?
2° ATOR – Meu nobre colega, foi você quem fez isso?
1° ATOR – (Orgulhoso) Hum,hum...
2° ATOR – Mas está lindo, maravilhoso, incrível... (A parte) Um lixo. (...) E quanto vale o seu serviço?
1° ATOR – (A parte) Quero ver se ele vai ter dinheiro para pagar.
2° ATOR – Fala, fala logo quanto vale.
1° ATOR – Vale Cem mil cruzeiros.
O 2° Ator começa a rir.
1° ATOR – De que você está rindo? Eu não admito este tipo de deboche comigo. Você está me ouvindo?
2° ATOR – Estou. Mas me diz uma coisa. Você está a muito tempo fora daqui?
1° ATOR – Sim, tem uns...
2° ATOR – Tudo isso?
1° ATOR – Como, “tudo isso”? Não faz tanto tempo assim.
2° ATOR – Aqui nesta terrinha faz.
1° ATOR – Não acredito que já haja mudanças.
2° ATOR – Você é que pensa que elas não existem.
1° ATOR – E existem? (...)
2° ATOR – O Cruzeiro não existe mais.
1° ATOR – Quer dizer que vocês não têm mais moeda?
2° ATOR – Não. Não é bem isso. (...) O Cruzeiro foi substituído.
1° ATOR – Ora, eu pensei que fosse algo importante, alguma mudança significativa.
2° ATOR – Mas foi!
1° ATOR – Para vocês. Por que para nós, isso não é nada.
2° ATOR – Mas mudaram muitas coisas.
1° ATOR – Tudo bem. Mas me diga, por quem ele foi substituído?
2° ATOR – Pelo Cruzado.
1° ATOR – Pelo Cruzado? Isso quer dizer que vocês estão felizes.
2° ATOR – Felizes?
1° ATOR – Mas é claro! Vocês mesmo do 3° mundo dizem que com moeda nova tudo se modifica, abrem-se novas fronteiras... (...)
2° ATOR – É o seguinte: no começo até que foi legal, veio o tal de congelamento...
1° ATOR – Espere um minuto. Eu já ouvi falar neste tal de congelamento. Não é um que congela os preços e aumenta os salários?
2° ATOR – Ao contrário.
1° ATOR – Ao contrário? (...) Porque vocês não reclamam? (...)
2° ATOR – Já vi que você não é mesmo daqui.
Ouve-se um Rock pesado. Eles começam a dançar sem se olharem, a música para. Eles andam pelo palco até se encontrarem.
2° ATOR – Meu nobre amigo Dr. Richard.
1° ATOR – Como vai Antônio?
2° ATOR – Vou indo muito bem, e o senhor?
1° ATOR – Estou ótimo, e sua família?
2° ATOR – Aumentou.
1° ATOR – Aumentou?!
2° ATOR – Sim, agora já tenho sete. (...) E está vindo mais uma. Desta vez ela vem cheia de benefícios pra gente. E tem mais, dizem que quando esta vier, eu terei o meu pedaço de terra.
1° ATOR – É mesmo? E quem você acha que vai te dar essa terra?
2° ATOR – Não sei, eles dizem que as terras vão ser repartidas.
1° ATOR – Repartidas?!
2° ATOR – É, toda ela.
1° ATOR – Você está vendo toda esta terra que está aqui?
2° ATOR – Sim.
1° ATOR – Toda ela, até aquelas colinas lá embaixo?
2° ATOR – Sim.
1° ATOR – Tudo meu.
2° ATOR – Tudo?!
1° ATOR – Sim! Toda essa terra é minha.
2° ATOR – Bem que o senhor podia me dá um pedacinho dela.
1° ATOR – Te dar um pedaço da minha terra?
2° ATOR – É, só um pedacinho, pra eu e mais minha mulher, ter onde morar.
1° ATOR – E você acha que eu vou ficar distribuindo a minha terra pra todo mundo?
2° ATOR – Mas o senhor tem tanta...
1° ATOR – Mas é minha.
2° ATOR – Mas os homens lá de... o senhor sabe de onde né?
1° ATOR – Claro que sei.
2° ATOR – Eles disseram que todo mundo que tem muita terra, vai ter que dar para os que não tem.
1° ATOR – E você acha que isso é verdade?
2° ATOR – E porque eles vão mentir?
1° ATOR – Mas eu não disse que eles estão mentindo.
2° ATOR – Então eu não entendi.
1° ATOR – Vocês nunca vão entender. Quem manda aqui nestas terras sou eu e mais ninguém. (...)
Terminado em 21 de setembro de 1984.
Interessados em conhecer a obra na íntegra, favor entrar em contato pelo privado ou por e-mail: wagnerrotta@yahoo.com.br