Sobre queimadas e incêndios florestais
Nesse período do ano, onde as condições climáticas são desfavoráveis , assistimos de forma recorrente a um sem número de queimadas e incêndios florestais, que causam angústia, perplexidade e revolta generalizada. Trata-se de uma situação hoje observada em nosso País, de forma acentuada nas regiões do cerrado e de formações florestais, em especial aquelas situadas na Amazônia.
Porém acontecem também em diversos países europeus e da America do Norte. Lá, com muitos registros de mortes humanas.
Os videos que ora rodam o mundo contêm geralmente cenas fortes , pela altura e intensidade das chamas, e de certa forma pela beleza destruidora do fogo, filho do Deus Prometeu. No mundo, e também no Brasil, encontramos essa prática milenar de "limpar" o solo florestal , agrícola ou pecuário , com o uso do fogo. Foi assim na "ocupação de extensas áreas da mata atlântica das florestas do sul do país, nos domínios dos cerrados, e acontece na região Amazônica desde os primórdios de sua ocupação .
Muitas vezes criminoso, tendo o homem como principal agente causador, o uso do fogo pode ser feito de forma autorizada pelos órgãos ambientais e florestais competentes, através da queima controlada, observada técnicas apropriadas, e em muitas regiões do mundo, as queimadas tem causas naturais como raios. Geralmente seu uso está associado a custos mais baixos de preparo de solo, quando comparado a outras práticas agrícolas, e quando não se consegue dar aproveitamento econômico ao material lá existente. Os incêndios criminosos podem ter ainda ter outras motivações. Com certeza, as queimadas e incêndios apresentadas nos vídeos que assistimos, não são episódios isolados, exclusividade do ano de 2019. São recorrentes ao longo de dezenas, centenas de anos. Em 1985 , quando trabalhava no Instituto Estadual de Florestas de MG, fui enviado pelo Governo Brasileiro ao Chile para fazer uma Especialização em Proteção Florestal promovido pelo National Advanced Resourch Tecnology- NARTC, Corporacion Nacional Forestal- CONAF e pela FAO .
Lá aprendemos sobre a complexa relacão do homem com o fogo, e dele com a natureza. Ao retornar ao Brasil, participamos, ainda no Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Florestal- IBDF e na sequência no IBAMA, da criação por meio da Portaria Nº 0254/88 de 28 de agosto de 1988, da CONACIF, Comissão Nacional de Prevenção e Combate aos Incêndios Florestais, que cheguei a presidir, e que criou as bases para criação do Sistema Nacional de Prevenção e Combate aos Incêndios Florestais- PREVFOGO, por meio do Decreto nº 97.635, atribuindo ao Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Renováveis (IBAMA) a competência de coordenar as ações necessárias à organização, à implementação e à operacionalização das atividades de educação, pesquisa, prevenção e controle dos incêndios florestais e queimadas. Posteriormente novas estruturas de gerenciamento desse tema foram implementadas no âmbito do governo federal e em vários governos estaduais, como o Programa de Prevenção e Controle de Queimadas e Incêndios Florestais na Amazônia Legal – PROARCO, criado pelo Decreto Federal 2.662, de 8 de setembro de 1998, restabelecendo normas de precaução relativas ao emprego do fogo em práticas agropastoris e florestais e ainda instituem medidas de prevenção, educação ambiental, monitoramento e combate a incêndios a serem implementadas na Amazônia Legal.
A CONACIF, primeira coordenadoria capaz de lidar, a nível nacional, com a problemática dos incêndios florestais e das queimadas, consistiu e publicou normas relacionadas ao uso do fogo no meio rural, e deu as bases ao difícil e complexo programa oficial de prevenção e combate aos incêndios florestais, atuando de forma participativa com vários setores da sociedade interessados no tema .
A partir de 1990, o PREVFOGO e o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais - INPE, implantaram o monitoramento e controle dos incêndios florestais no Brasil, por meio dos satélites NOAA, Land-Sat e Spot, monitoramento que continua sendo feito de forma permanente.
Dentre iniciativas desenvolvidas nos Estados, destaca-se aquela sob responsabilidade do Grupo de Trabalho Incêndios Florestais (GTIFLOR), instituído pelo Decreto nº 28.621 de 12/09/88 que trata da prevenção e combate a incêndios florestais do qual fui o relator, e cujos resultados, junto com as iniciativas levadas a efeito pelo governo federal, inspiraram muitas normas legais estaduais sobre a prevenção e combate aos incêndios florestais.. Esse grupo de trabalho teve na sua constituição a participação de diversos órgãos e instituições públicas: Secretaria de Estado de Agricultura, IBAMA, IEF, Polícia 90 Militar, Polícia Florestal e Corpo de Bombeiros, empresas, federações e associações oriundas da sociedade civil, entre outros. Esse grupo construiu a base da Lei Estadual nº 10.312 de 12/11/90, que trata desse assunto, e elaborou um programa que viabilizou o início da implantação do Sistema de Prevenção, Controle e Combate aos Incêndios Florestais no Estado.
Importante registrar que as normas legais vigentes não permitem a queima pura e simples das formações florestais, nem quando se implantam empreendimentos de utilidade pública, como usinas hidrelétricas e estradas.
Faço o registro porque esse tema é complexo em sua tratativa, tanto nos aspectos da sua prevenção quanto do combate. É fato que causa destruição e prejuízos de toda monta , aqui e também em muitos países que possuem boas estruturas de fiscalização e combate, e mais uma vez registro que o que estamos vendo, não é uma exclusividade do ano de 2019. E por fim pontuo o reconhecimentos aos milhares de brigadistas dos órgãos ambientais e florestais, e também aos que o são de forma voluntária, e aos bombeiros militares ou civis, que nesse período de clima seco fazem um hercúleo trabalho na defesa da natureza e de importantes ativos produtivos. E finalizo com a máxima de que nesse tema, é mil vezes melhor a prevenção que o combate.
“... o fogo é assim, um fenômeno privilegiado capaz de explicar tudo. Se tudo o que muda lentamente se explica pela vida, tudo o que muda velozmente se explica pelo fogo. O fogo é o ultrativo. O fogo é íntimo e universal. Vive em nosso coração. Vive no céu. Sobe das profundezas da substância e se oferece como um amor. Torna a descer à matéria e se oculta, latente, contido como o ódio e a vingança. Dentre todos os fenômenos, é realmente o único capaz de receber tão nitidamente as duas valorizações contrárias: o bem e o mal. Ele brilha no Paraíso, abrasa no inferno. É doçura e tortura. Cozinha e apocalipse. É prazer para a criança sentada ajuizadamente junto à lareira; castiga, no entanto, toda desobediência quando se quer brincar demasiado de perto com suas chamas. É um deus tutelar e terrível, bom e mal. Pode contradizer-se, por isso é um dos princípios da explicação universal.” Gaston Bachelard.
Founder at ADXP - Ad Experience
5 aÓtimo artigo, Enio Fonseca!
Consultor Senior Especialista de Meio Ambiente, Fundiário e Responsabilidade Social
5 aExcelente artigo/registro meu caro. É necessário lembrar sempre daqueles que estão sempre a postos para combater estes incêndios florestais como também de todos aqueles que como você tem uma história na busca de ações de prevenção e implantação de um sistema que ajude a lidar com este grave problema.