Split Payment e as Novas Possibilidades da Reforma Tributária
A reforma tributária, de maneira geral, tem como um de seus principais objetivos garantir maior eficiência na arrecadação de tributos. Desse modo, uma das medidas em destaque é o controle mais rigoroso da tomada de crédito fiscal, com foco na efetiva quitação dos tributos antes que as empresas possam utilizá-los como crédito para compensação de impostos. Embora o combate à fraude seja uma prioridade, a forma como essa medida será implementada pode gerar efeitos indesejados para muitas empresas, especialmente em termos de fluxo de caixa.
O Que é o Split Payment?
O split payment, ou pagamento fragmentado, é um sistema em que o tributo devido em uma operação comercial é transferido diretamente ao fisco à medida que cada pagamento é efetivado. Isso difere do modelo atual, no qual o tributo é acumulado ao longo do mês e recolhido posteriormente na apuração mensal. Esse sistema foi projetado para garantir maior eficiência arrecadatória ao fisco, pois a segregação automática dos tributos torna o processo de arrecadação mais ágil, reduzindo a possibilidade de fraudes ao impedir que o valor do tributo seja manipulado ou desviado antes de ser enviado ao fisco.
O split payment funciona com a separação automática dos valores de tributos e pagamento no momento em que a transação é realizada. Quando o pagamento é efetuado, o valor do tributo devido é transferido diretamente ao Fisco, enquanto a operadora de pagamento (banco ou empresa de cartão) faz a segregação dos valores, identificando as naturezas dos tributos. Em pagamentos parcelados, a aplicação do sistema é proporcional às parcelas. A responsabilidade pelo tributo é do adquirente, e o Comitê Gestor garante a operação através de uma conta de saldo zero, ajustando os valores ao Fisco ou ao contribuinte de forma eficiente.
Impacto no Fluxo de Caixa das Empresas
O impacto mais imediato dessa alteração será sentido no fluxo de caixa das empresas, especialmente daquelas que operam com prazos de pagamento dilatados. No modelo atual, o fornecimento de mercadorias e a emissão da nota fiscal geram, para a empresa compradora, o direito ao crédito tributário mesmo que o pagamento da operação ocorra de maneira parcelada, muitas vezes com prazos superiores a 30 ou 40 dias. Com isso, a empresa fornecedora acaba, de certa forma, "financiando" o pagamento dos tributos até que o tributo seja recolhido, o que ajuda a manter o seu fluxo de caixa equilibrado.
Com a implementação do split payment, no entanto, a empresa fornecedora perderá a possibilidade de usar esse mecanismo de "financiamento" do tributo. Como o crédito fiscal só poderá ser tomado quando da efetiva liquidação de cada parcela, a empresa compradora precisará pagar o tributo conforme cada parcela for quitada, e não mais de forma antecipada. Em outras palavras, as empresas que dependem da antecipação do crédito fiscal para gerir seu fluxo de caixa terão que se adaptar a um novo cenário, no qual o pagamento do tributo será mais atrelado ao recebimento real dos valores.
O impacto dessa mudança também se refletirá nos recebimentos da empresa, uma vez que, no modelo atual, a empresa utiliza o "financiamento" do tributo como uma forma de alavancar seu fluxo de caixa. O tributo é recolhido somente após a apuração, que ocorre no mês seguinte à operação, permitindo que a empresa utilize esse montante para cobrir outros custos no mês em que a venda ocorre. Com a implementação do split payment, a empresa começará a receber o valor já descontado do tributo no momento da venda, especialmente em transações à vista. Isso significa que, no novo modelo, a empresa não precisará mais esperar pela apuração para recolher o tributo no mês seguinte, o que representa uma antecipação do impacto tributário no seu fluxo de caixa. Essa mudança trará um efeito imediato nas finanças das empresas, pois reduzirá o prazo em que os recursos ficam retidos e exigirá uma adaptação à nova dinâmica de recebimentos e pagamentos, com implicações diretas na gestão de caixa e na liquidez operacional.
Com a necessidade de honrar o pagamento do tributo logo na efetivação de cada operação, as empresas podem precisar reavaliar sua estrutura de capital para garantir liquidez imediata. Isso levanta uma questão sobre se, com o split payment, será necessário aumentar a dependência de financiamento de curto prazo, trazendo novos desafios para o gerenciamento do capital de giro e exigindo um planejamento financeiro mais robusto.
Arrecadação e Neutralidade Tributária
Essa mudança traz implicações nos indicadores de liquidez, como o índice de liquidez corrente, uma vez que as empresas precisam de maior liquidez imediata para cumprir as novas exigências fiscais. Esse ajuste nos indicadores pode influenciar a percepção de investidores e analistas sobre a saúde financeira das empresas, estimulando reflexões sobre os efeitos de longo prazo do split payment na gestão de caixa.
Embora a medida tenha um claro objetivo de aumentar a arrecadação e combater práticas fraudulentas, ela cria uma tensão com o princípio da neutralidade tributária, um dos pilares do sistema tributário moderno. A neutralidade tributária, em sua essência, preconiza que a legislação fiscal não deve interferir nas decisões empresariais, ou seja, as empresas devem ser capazes de tomar suas decisões com base em fatores de mercado e não por imposição de regras fiscais que alterem o equilíbrio financeiro das operações.
Com a obrigatoriedade do split payment, as empresas terão que reconfigurar seus fluxos financeiros, o que poderá afetar decisões relacionadas a prazos de pagamento, condições comerciais e até mesmo estratégias de financiamento. A mudança pode resultar em uma elevação do custo de capital para muitas empresas, já que elas precisarão garantir maior liquidez para honrar com o pagamento dos tributos enquanto não recebem o crédito fiscal correspondente.
Desafios e Oportunidades
Para as empresas que operam com prazos de pagamento mais longos ou que dependem de mecanismos de crédito fiscal para financiar suas operações, a reforma tributária traz desafios consideráveis. As empresas precisarão revisar seus processos financeiros e, possivelmente, buscar alternativas de financiamento para compensar a falta de antecipação de crédito tributário.
Por outro lado, a medida pode criar oportunidades para aquelas empresas que operam com prazos de pagamento mais curtos ou com uma base de clientes que já adotam pagamentos mais imediatos. A adaptação ao split payment pode tornar mais fácil o controle do fluxo de caixa para essas empresas, já que elas terão menos exposição ao risco de inadimplência do tributo.
Conclusão
A implementação do split payment e as novas condições para a tomada de crédito fiscal representam uma mudança significativa na forma como os tributos serão geridos pelas empresas. Se, por um lado, a medida visa combater fraudes e melhorar a arrecadação, por outro, ela exige que as empresas se adaptem a um novo cenário que pode impactar diretamente seu fluxo de caixa e suas decisões financeiras. Para minimizar os efeitos negativos, é fundamental que as empresas se preparem para as mudanças e considerem a adoção de estratégias de gestão de caixa mais eficientes, além de buscar o apoio de consultorias tributárias especializadas para otimizar a conformidade fiscal e minimizar os impactos no seu negócio.
Essa mudança evidencia a complexa relação entre a arrecadação tributária e a neutralidade fiscal. Embora a reforma busque maior eficiência, as empresas terão que equilibrar essas novas exigências com a necessidade de manter a saúde financeira e a competitividade no mercado.
Empresários e gestores devem se manter informados sobre o andamento do projeto e buscar orientação para se adaptar rapidamente às novas exigências legais, evitando surpresas no futuro. A Controlsul é sua melhor escolha diante destes desafios. Fale com nossa equipe.
Lucas Teske é contador, especialista em gestão empresarial e controladoria. Atua como consultor tributário na Controlsul Gestão Empresarial.