A tarefa de educar

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É complexo o ato de educar e o seu desenvolvimento requer uma série de fatores que vão muito além do estereótipo do “educador por amor”, entre elas estão a formação e perfil profissional, relação que o professor constrói com a comunidade acadêmica, seja direção, coordenação, colegas ou alunos, sua visão sobre educação, o material disponível, a estrutura do ambiente escolar, a cultura escolar vigente, a valorização e o bem-estar profissional, ou seja, a segurança de estar em sala cumprindo o seu dever em um ambiente saudável de aprendizado com trocas afetivas e convivência social, afinal a escola é um ambiente que reflete muito as estruturas da nossa sociedade e, como tal, é também espaço de conflito e resolução de conflito. O professor é um profissional como outro qualquer, que precisa de dignidade para exercer sua profissão (a profissão que forma os profissionais de todas as profissões), mas depende também de fatores externos à individualidade docente e ao ambiente escolar.

A educação brasileira passa por um momento muito particular em que os resultados expressos nos rankings mundiais dizem muito, mas revelam pouco, sobre o contexto educacional no país. O que acaba contribuído com o uso desses dados para a defesa de modelos educativos que se distanciam de todo o desenvolvimento e avanço da área no mundo, como alternativa viável para a mudança de cenário. Esquece-se, ingênua ou propositalmente, que existe uma cadeia gigantesca que envolve as comunidades, escolas, órgãos municipais, estaduais e federais, que existe uma diferença entre educação pré-escolar, básica e de nível superior, tanto em suas demandas quanto em suas funções na nossa sociedade, que o envio de verbas passa por um cano furado até chegarem nas Instituições e que um lobby privatista opera contra os interesses públicos. Apontam Paulo Freire como se a pedagogia do oprimido fosse adotada nas escolas de modo compulsório e repetem sistematicamente ideias sem sentido sobre doutrinação e cartilha ideológica - penso que quem reproduz esses discursos ou não conhece Paulo Freire ou não conhece as nossas escolas.

Escolas com métodos construtivista, montessoriano, antroposófico etc. fazem disso seu marketing e costumam cobrar muito mais do que um salário mínimo na mensalidade de cada aluno – são modelos pedagógicos reconhecidos e a maioria dessas escolas tem seus serviços consumidos pela classe média. Mesmo as escolas privadas “tradicionais” se apegam a valores e metodologias que, pra qualquer educador formado nos últimos dez anos, são considerados, no mínimo, antiquados. Existem escolas que, pela segurança institucional e/ou financeira, deixam de se atualizar e perpetuam práticas tóxicas para o desenvolvimento dos jovens – penso, nesse momento, que a palmatória deveria ter seus defensores, respeito às tradições é diferente de defasagem – comprometendo o nível de interesse no que temos de mais caro, a matéria bruta do professor: o conhecimento. É preciso considerar que a educação também encontra suas dificuldades na rede privada.

As políticas educacionais devem ser feitas considerando a realidade do país, que tem visto o número de matrículas despencar no ensino médio, desestimulando os nossos jovens ao ingresso na Universidade ou mesmo na conclusão do segmento, o que é de uma gravidade sem precedentes! A educação não deve ser apenas a formação de mão-de-obra para giro da economia, a educação faz parte do processo de formação do indivíduo, lhe garante acesso ao autoconhecimento e ao conhecimento de sua comunidade, aos conhecimentos produzidos pela humanidade para que tragédias como o que matou uma família inteira que para se aquecer acendeu uma churrasqueira no quarto antes de dormir não aconteça. A educação é capaz de formar e transformar a consciência cidadã, o que garante acesso a direitos básicos e fundamentais em uma sociedade tão desigual quanto a nossa e não é uma reforma simplificada que enxuga currículo e sucateia o ensino que vai transformar qualitativamente a educação.

É preciso encarar esses dados, porque eles são o sinal de alerta de que algo não vai nada bem e que é preciso voltar nossos olhos para a correção dos erros, considerando as dimensões e diferenças que envolvem a educação do nosso país e toda a rede que a cerca: formação de professores, valorização e adequação profissional, políticas públicas educacionais desenvolvidas por pessoas especializadas e com base na realidade do país, investimento público, controle do repasse de verbas, infraestrutura e estímulo para o desenvolvimento de projetos que gerem impacto na escola ou na comunidade a qual a escola pertence. A tarefa de educar não depende exclusivamente do educador, é um dever e um direito da nossa sociedade, culpar o professor pela crise na educação é como culpar um engenheiro pela bolha imobiliária ou o enfermeiro pela crise na saúde, a educação depende de uma série de fatores e os nossos resultados são a expressão de uma série de variáveis que estão sendo ignoradas e desconsideradas há tempos, inclusive, com o alerta de muitos profissionais que estão no chão da escola vivenciando suas alegrias e tristezas. É inevitável não lembrar do Darcy Ribeiro que há tempos denunciava que “a crise na educação brasileira não é crise, é projeto”.


“Era uma vez um oceano esvaziado, dominado por tubarões. Os corais estavam fossilizados, os peixes e demais animais marinhos reclusos em qualquer canto de um lugar sem cantos para viver, vigiados por pequenas arraias de longos ferrões, que se amaternavam perversamente de seu ofício delegado, abraçando quem convinha e ferroando quem ameaçava o silêncio do mar.

Era uma vez um som, era uma vez um eco.

Corações vivos tamborilam.”

Wisley Vilela

Mestre em Estudos da Tradução | Universidade Federal do Rio de Janeiro

5 a

Projeto desmantelo mesmo, talvez como nunca antes, por causa dos ominosos e decadentes ares trimalquianos na terra brasilis.

Antonio Roberto Petali

Especialista em Educação e Novas Tecnologias | Consultor Educacional | Educador STEAM | Palestrante | Ciências Biológicas | 1º colocado Prêmio Shell de Educação Científica e Prêmio Professores do Brasil.

5 a

Como você mesma afirmou, são vários os fatores e enquanto não tivermos pessoas capacitadas a observar os dados e gerar planos de intervenção personalizada, nada do que queremos para educação vai acontecer! Porém, em um micro ambiente, escola públicas e privadas realizam movimentos de intervenção em suas comunidades, que geram impactos relevantes para os mesmos. Cabe aqui refletir em onde elas estão, como estão realizando isso e como conectar essas pessoas? Bem, valeu pela troca!

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