Tem direito de preferência para comprar a fazenda na parceria rural?
Como advogado gosta de responder: depende. Do quê? Se estiver no contrato, tem. Se não, não.
Em outras palavras: não existe a preferência na lei (preferência legal), mas o contrato pode bem prevê-la (preferência convencional).
A problemática foi criada por este artigo aqui da lei (estatuto da terra):
artigo 96 (...) VII - aplicam-se à parceria agrícola, pecuária, agropecuária, agro-industrial ou extrativa as normas pertinentes ao arrendamento rural, no que couber, bem como as regras do contrato de sociedade, no que não estiver regulado pela presente Lei
A Jurisprudência do STJ é pacífica ao entender que não cabe preferência em contrato de parceria, como segue:
“ Tratando-se, no caso, de contrato de parceria e não de arrendamento, inviável a Ação de Preferência, instituto próprio apenas deste último, tanto pela previsão legal (§ 3º, artigo 92, Estatuto da Terra), com pela própria natureza de cada um desses contratos: no arrendamento há uma relação que se aproxima da locação, o arrendados apenas aufere renda: na parceria ocorre verdadeira sociedade, com partilha do resultado positivo ou negativo, índole que não se coaduna com o exercício de preferência de um parceiro em relação ao outro. A natureza distinta dos dois contratos aludidos e as consequências também diversas daí resultantes foram bem ressaltados num dos arestos trazidos com paradigmas no apelo excepcional, aquele oriundo do Tribunal de Alçada de Minas Gerais. Em seu douto voto, o Relator, Juiz Paulo Gonçalves destacara: ‘No meu entendimento a hipótese é bem diversa, pois enquanto no arrendamento rural as regras reguladoras do contrato se assemelham à locação, versando ele sobre o uso de coisa alheia, na parceria agrícola e pecuária o objeto envolve não só coisa alheia, mas também os frutos dela produzidos, que seriam repartidos entre os parceiros, estabelecendo a propriedade de ambos e aproximando o contrato dos princípios reguladores da sociedade. O Estatuto da Terra, ao assegurar o direito da preferência do arrendatário sobre as terras objeto do contrato (art.92, § 3º), inclui no Capítulo Geral, onde cogitou do uso ou posse temporária da terra, tratando dos princípios fundamentais relativos não somente ao arrendatário rural, mas também à parceria rural, nada dispondo quanto a extensão a esta. É verdade que o artigo 96, inciso VII, do referido Estatuto, manda aplicar à parceria agrícola, pecuária, agropecuária, agroindustrial ou extrativa, as normas pertinentes ao arrendamento rural, no que couber, bem como as regras do contrato de sociedade, no que estiver regulado por aquela lei, porém, como já foi observado, o direito de preferência não foi previsto na seção relativa ao arrendamento rural, mas, sim, no capítulo geral, que fez inteira abstração quanto à sua extensão à parceria, embora dela cogitasse para outro fim. Não resta dúvida, pois, que o direito de preferência não é extensivo ao parceiro rural, quer seja em relação à venda do imóvel, ou dos produtos objetos da parceria’ . Estes fundamentos casam-se Às inteiras à espécie presente. O direito de preempção, no caso de alienação do imóvel, adstringe-se ao arrendatário rural. Não se argumente com a dicção meramente literal do art. 48 do Dec. Nº 59.566, de 14.11.66, que, a despeito de ordenar que se aplicam à parceria as normas estabelecidas na Seção I daquele capítulo (onde se encontra previsto o direito de preferência do arrendatário - art. 45), não confere ao parceiro rural outorgado esse mesmo direito, porquanto é ali feita a ressalva ‘no que couber’, além da remissão expressa ao art. 96, inc. VII, da Lei 4.504/64. Bem de ver ainda que ao Regulamento não era dado extrapolar o que restara disposto de forma clara a sistemática pela Lei regulamentada. (Recurso Especial nº 97.405-RS, Min. Ruy Rosado de Aguiar, 4ª turma do STJ; 15/10/1996, citando REsp. 37.867/RS)”.
Vide também REsp. nº 264.805-MG, Min. Cesar Asfor Rocha; 4ª turma do STJ; 21/03/2002.
Por fim, é bom esclarecer que há possíveis duas preferências na parceria: uma para comprar a terra (que só vale se estiver expressamente prevista em contrato) e outra para renovar o contrato, sendo esta última um direito legal previsto expressamente no artigo 96 do Estatuto da Terra:
Art. 96. Na parceria agrícola, pecuária, agro-industrial e extrativa, observar-se-ão os seguintes princípios:
II - expirado o prazo, se o proprietário não quiser explorar diretamente a terra por conta própria, o parceiro em igualdade de condições com estranhos, terá preferência para firmar novo contrato de parceria;
A situação pode ficar bem mais complicada no caso concreto se o contrato tiver uma roupagem de parceria apenas para que as partes se beneficiem de um melhor tratamento tributário aplicado à espécie (do que no arrendamento rural), mas que efetivamente se trata de um arrendamento rural. Nessa hipótese, respeita-se ou não a preferência? Na dúvida, é muito comum no meio rural respeitar-se a preferência (as usinas de cana já até estão acostumadas a renunciar ao seu 'direito' na preferência).
Engenharia Agronômica | Universidade Federal de Lavras
5 aPersiste uma dúvida: Se a Usina cede a terra da parceria a um terceiro, sem conhecimento do proprietário,o direito de preferência é da Usina ou do terceiro? Apenas para elucidar, no contrato prevê a hipótese desta cessão.