Tema indigesto

Tema indigesto

Matéria publicada no Estadão de 23/09 apresenta o tema de fundo “Como livrar os brasileiros do inchaço do Estado e dos altos gastos com o funcionalismo público?”, provocando, naturalmente, inúmeras reflexões.

Quem acompanha de perto os debates até aqui e as campanhas dos candidatos à Presidência ou Governos Estaduais observa que nenhum, absolutamente nenhum dos concorrentes, toca no assunto “reforma administrativa” e melhoria dos serviços públicos com a racionalização dos gastos obrigatórios, numa perspectiva concreta de redução da fatia do PIB no gasto com a manutenção do funcionalismo no Brasil.

Em proporção do PIB, o Brasil gasta mais com funcionários públicos do que 90% dos países. Aqui só gastamos menos do que Islândia, Noruega, Dinamarca, África do Sul e Arábia Saudita.

O último aumento que o Supremo Tribunal Federal concedeu a seus ministros, que impacta em cascata o teto do funcionalismo em todo o país, torna a função de enxugar o Estado muito mais complicada e verdadeiramente desafiadora.

A matéria do “Estadão” teve o intuito de situar o leitor sobre a importância de se enfrentar o corporativismo público para promover um corte de despesas que não prejudique ainda mais a qualidade e a quantidade dos serviços ofertados ao cidadão.

Em suma, a busca pela melhoria dos serviços públicos passa pela motivação, capacitação e remuneração adequadas, além de condições de trabalho condignas, tudo atrelado à racionalização dos gastos.

Saindo um pouco da reportagem e já entrando no assunto destas linhas, o lobby de diferentes setores do funcionalismo dificulta qualquer debate que se queira deflagrar acerca da redução (salarial) de uns e adequação de outros visando a uma distribuição mais equilibrada do “bolo”. Temas como o fim da aposentadoria compulsória como modalidade de “punição”, a proibição de férias anuais com mais de 30 dias e a vedação de promoções e progressões na carreira por tempo de serviço fazem parte de projetos de reforma que não saem do papel e não ganham pauta nas casas legislativas.

E não é só, a avaliação de maior ou menor eficiência e eficácia do funcionalismo, embora tema expresso na Constituição Federal, não ganha a necessária Lei Complementar específica desde a Carta Constitucional de 1988.

Veja-se que a Constituição informa expressamente que são estáveis após três anos de efetivo exercício os servidores nomeados para cargo de provimento efetivo em virtude de concurso público. Nesse contexto, o servidor público estável só perderá o cargo em virtude de sentença judicial ou por meio de processo administrativo. A outra maneira de perder o cargo seria mediante procedimento de avaliação periódica de desempenho, na forma de lei complementar, assegurada ampla defesa. Essa tal Lei complementar não saiu do papel até agora. Há um projeto, o PLP 249, de 1998, que visa a disciplinar a perda de cargo público por insuficiência de desempenho do servidor público estável, de maneira a regulamentar o que está disposto na Constituição de 88.

Pelo tal projeto de Lei (que ninguém quer votar ou mesmo dele falar) a avaliação anual seria realizada a partir da observação de critérios que são muito frequentes no ambiente da iniciativa privada. São eles (i) a qualidade do trabalho; (ii) produtividade no trabalho, (iii) a iniciativa, (iv) a presteza, (v) o aproveitamento em programas de capacitação, (vi) assiduidade, (vii) pontualidade, (viii) administração do tempo e (ix) uso adequado dos equipamentos ser serviços,

Então, o que temos como maior problema do funcionalismo são (i) os altos salários pagos a quem detém estabilidade plena e (ii) a qualidade dos serviços entregues, salvo raras exceções, muito mal prestados ao cidadão, não importa em qual esfera.

A “máquina” tem funcionado mais em benefício do próprio funcionalismo do que em favor do Cidadão.

Embora o tema continue indigesto e devesse ocupar o topo da agenda de qualquer candidatura séria, nem de relance é referido pelos candidatos de 2 de outubro.

A iniciativa privada vem pagando parte dessa conta toda, suando a camisa para apresentar mais “qualidade” e “quantidade” para um mercado que cobra muito do setor privado, mas não encontra caminhos para cobrar de igual forma do setor público.

Realmente, não tem perigo de melhorar. William Nagib Filho – Advogado 

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