TEMPO PERDIDO

Flávio Sousa 

Hoje tirei um tempo para pensar no tempo. Quando percebi, o tempo já havia passado, e o passado, como sempre, já estava morto. Infelizmente, amigos, temos mais passado que futuro. Ninguém consegue explicar o tempo; ele simplesmente é. Há séculos, a ciência tenta, em vão, definir o tempo, mas tudo que consegue é desperdiçá-lo. Nós, meros mortais, tecnocratas, falsos artistas, poetas frágeis, só conseguimos marcá-lo e, com alguma beleza e rara frequência, refletir sobre ele. Enquanto pensamos, o tempo avança. Agora escrevo este texto; quando você o ler, o "agora" já terá se transformado em um cemitério de palavras amontoadas, incapazes de definir o presente. E afinal, o que é esse "agora"? Complicado, complexo! 

Lá fora, os carros vão e vêm. A física nos ensina a calcular o tempo que um veículo leva para percorrer uma distância específica a uma velocidade determinada. Mas eu não aprendi a calcular o tempo. Talvez você também não; talvez aquele outro tenha conseguido, mas a verdade é que pouco sabemos sobre ele. Números são uma abstração. Imagine uma gota somada a outra gota; não temos duas gotas, mas uma só, maior. Podemos somar pessoas, mas cada uma continua sendo única, mesmo acompanhada de outra. O tempo, assim como essas somas, não se deixa capturar por fórmulas ou cálculos. 

Renato Russo, com suas próprias angústias, escreveu uma música chamada "Tempo perdido". Quantas pessoas já gastaram tempo ouvindo-a e refletindo sobre isso? Hoje, ele já se foi, e o tempo seguiu seu curso. Talvez as próximas gerações sequer saibam que ele existiu. E assim será com você e comigo também. O tempo passa, as coisas mudam, se destroem, se renovam, mas nós seguimos adiante, sem retorno. 

Será que continuaremos perdendo tempo contabilizando conquistas inúteis, somando derrotas, subtraindo alegrias e multiplicando tristezas? Talvez a vida não seja isso. Acho que não é. O tempo está escorrendo por entre nossos dedos, e não temos tempo a perder. A vida é como um cano arrebentado, que deságua em uma pia sem ralo. Não há como conter o vazamento, mas podemos escolher o que lavar: mágoas ou afetos. E podemos, sim, beber da limpa e cristalina água da sabedoria, que está ao alcance de todos. Preparem suas cuias! 

 

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