A teoria da colaboração: ninguém motiva ninguém

Diversas vezes eu ouvi frases do tipo "ânimo, vamos lá, motivação!" de alguns gestores de equipes de uma empresa em que trabalhei. Quando eu ouvia aquilo ia logo pensando, "mas como é que alguém de fora vai me motivar a algo se eu mesma não consigo me motivar por conta de diversas coisas desmotivadoras que acontecem por aqui, todos os dias?".

Seguido da palavra motivação, eu também ouvia com frequência que todos devíamos ser resilientes. Ao procurar o significado da palavra encontramos o seguinte: 1) propriedade que alguns corpos apresentam de retornar à forma original após terem sido submetidos a uma deformação elástica e 2) capacidade de se recobrar facilmente ou se adaptar à má sorte ou às mudanças.

Porém, naquela empesa o sentido estava muito mais ligado o primeiro significado do que ao segundo. Seria incrível se a intenção de pedir resiliência estivesse ligada à habilidade de se reerguer novamente mesmo depois de um fracasso, isso eu realmente acho o máximo e busco incorporar em meu dia a dia, afinal, sempre passamos situações difíceis e não podemos desanimar. Mas o que eles queriam mesmo era pisotear nas pessoas e depois exigir que elas voltassem ao normal e produzissem muito.

Conforme eu ouvia aquela dupla, da motivação e da resiliência, pegava ainda mais bronca. Eu continuava me perguntando como é que eu poderia estar motivada e ser resiliente todos os dias, se todos os dias a equipe levava uma paulada. Projetos que surgiam repentinamente com prazo de entrega para ontem, caprichos de pessoas que não entendiam do assunto pedindo refações pela vigésima vez, falta de feedback e comportamentos esquisitos da diretoria, como é que alguém poderia colaborar e estar sempre motivado e resiliente dessa forma?

Conforme o tempo passou eu fui entendendo que só pode existir um ambiente bacana se houver colaboração, espírito realmente de equipe. Quando vivemos entornos em que o próximo está à espreita para prejudicar o outro, dar o bote, é impossível colaborar, não existe confiança. Quando o outro quer se impor, mandar, quando espera que tudo seja ao modo dele e que apenas ele é o certo, não pode existir colaboração, motivação, em resiliência.

É possível dizer palavras positivas a alguém para reanimá-la quando algo chato acontece. Minha mãe passou a vida fazendo isso comigo e sempre dava certo e eu costumeiramente faço isso com amigos e desconhecidos quando digo que está na mão deles fazer algo mudar e acontecer. Até esse ponto é possível sim "motivar", porque envolve que a partir dali a própria pessoa continue e realize, porque ela teve algo bacana despertado dentro dela que a moveu. Entretanto, não há palavras positivas suficientes quando ao tentar prosseguir alguém encontra uma barreira enorme, um ambiente tóxico, uma equipe difícil e aí a pessoa se prostra, desacredita e desiste, mas em seguida virá alguém lhe dizendo que ela precisa ser resiliente. Ela até tenta, mas cada vez que tenta uma nova cicatriz surge.

Certa vez eu trabalhei em uma empresa que precisava de uma grande reformulação em determinada área. Realmente havia muito a ser feito, eu planejei tudo o que era preciso fazer e comecei a executar o plano. Era muito gostoso ver a equipe animada, vendo as coisas mudarem. Eu havia recebido carta branca dos diretores e isso foi incrível, porque de fato as mudanças começaram a aparecer e o clima era outro, bem mais positivo. Diversas mudanças foram conquistadas, até que um dia uma funcionária nova, de outro departamento, chegou. E então tudo mudou. O clima pesado foi inaugurado, regras novas e incabíveis, desnecessárias, foram estipuladas por ela. Modo grosseiro de tratar a todos e dia a dia percebi que toda a equipe se fechou. Todo mundo tinha receio de se falar, de contar algo engraçado naqueles pequenos momentos de descontração no trabalho. O grande problema é que, aos poucos, ela dominava o pedaço, de modo que nenhuma outra ação positiva conseguia caminhar. Percebe como é difícil conseguir colaboração das pessoas quando isso acontece? Quando existe um clima ruim, as pessoas farão apenas "a parte delas" e quando o relógio marcar a hora exata, elas irão embora desejando que não tenham mais que voltar ali. É um efeito cascata.

Em outra situação conheci alguém que era extremamente mandona, manipuladora. Todas as coisas a seu redor precisavam ser feitas do jeito que ela queria. Aos poucos, esse comportamento gerou um medo nas pessoas que com ela conviviam. E elas travaram, porque tinham medo de fazerem sozinhas alguma coisa e levarem uma bronca, aliás, que certamente viria, afinal, o pensamento dessa pessoa era sempre indecifrável e por mais que alguém quisesse colaborar, ao saber que receberia palavras negativas em troca, logo desanimava.

Para existir colaboração, motivação e resiliência não basta ordenar. Não vai adiantar estampar essas palavras em nenhum banner, fundo de tela ou grito de guerra. É preciso primeiro tratar o ambiente, mas infelizmente a gente sabe que muitas vezes a ordem,o clima e o estilo vem da cultura, e cultura come qualquer estratégia no café da manhã. Com muita geleia.