Tite foi eficaz no gerenciamento da percepção pública
A seleção brasileira de futebol desembarcou na cidade do Rio de Janeiro, vinda da Rússia, sem qualquer tipo de atropelo. Não houveram ameaças de agressões físicas, vaias ou ofensas. Ao contrário, inúmeros torcedores, vestidos a caráter de verde-amarelo, ficaram horas no saguão do Aeroporto do Galeão esperando a saída dos ídolos para autógrafos e selfies. O ambiente estava tão tranquilo que a segurança ficou invisível. Incrível! Terá o apaixonado torcedor brasileiro amadurecido?
A participação da equipe no evento foi pífia. O resultado final, vis-à-vis investimento de tempo e financeiro, foi um fracasso retumbante. Fosse o técnico Tite funcionário de alguma grande empresa, possivelmente no retorno seria convidado a visitar o RH. Mas a CBF trabalha com outros parâmetros, por isso ele foi convidado a permanecer no cargo e seguir com o projeto para nova tentativa de sucesso em 2022, no Catar.
Duas situações nada corriqueiras em se tratando de Brasil e sobretudo do futebol brasileiro. Normalmente, resultados como este, alcançados também por Lazzaroni (1990) e Dunga (2010), terminam em mudanças radicais e demissões “em massa”. Mas então, o que aconteceu para termos esta “nova” situação? Analisando o caso do ponto de vista da comunicação, é possível afirmar que o técnico Tite soube fazer com competência o gerenciamento da percepção pública.
As partidas, jogadas contra adversários frágeis, foram pouco convincentes. A desclassificação foi fruto de um nó tático que o técnico Tite não soube desatar. O ídolo da equipe, mimado por todos, foi transformado em piada mundial. Apesar disso, o técnico Tite, acompanhado de membros de sua comissão técnica, comparecia as coletivas de imprensa com explicações “aparentemente” plausíveis para todos os casos. Sua emoção parecia sempre muito bem guardada. Não alterava o tom de voz e jamais foi ríspido em suas respostas. A entrevista era um diálogo civilizado, sempre muito educada. Nestas horas, Tite se assemelhava aos palestrantes de autoajuda.
A maior parte da imprensa embarcou no lengalenga teórico do técnico e lhe poupou de perguntas necessárias, mais contundentes. Repassou ao público, quase que ipsis literis, a história contada, inclusive a de que a derrota para a Bélgica, que serviu de pá de cal na luta pela classificação, deveu-se ao aleatório, palavra que Tite encontrou para substituir a “falta de sorte”, o que seria uma "desculpa" inaceitável. Não foi por outra razão que o colunista do UOL, Renato Maurício Prado, o denominou de “Encantador de Serpentes”.
Não, o discurso politicamente correto de Tite se revelou eficaz! E não é fruto do acaso. Ao contrário, parece ser muito bem pensado, ou melhor, muito bem planejado. Diferentemente do seu antecessor, que se sentia perseguido pela imprensa e fazia das entrevistas um confronto. A atuação brasileira na Copa da Rússia, comparada a participações anteriores, foi um fracasso histórico. No entanto, o discurso equilibrado do técnico fez com que este resultado parecesse fruto de detalhes pequeninos, naturais e aceitáveis, que conseguiram escapar, e não da incompetência em campo na busca pelos resultados que deveriam levar a equipe ao triunfo.
Tite foi um ótimo porta-voz da Seleção Brasileira, compareceu a todas as coletivas pós-jogo e não se esquivou de qualquer pergunta ou tema. E foi, também, um excelente gestor de crise. O universo corporativo deveria olhar para este case com atenção e tirar boas lições.
João Fortunato, jornalista