Trabalhar muito e ganhar muito
Eu, Vivian, Milena e Fabio no AmarElo - a gira final do EMICIDA

Trabalhar muito e ganhar muito

Foi essa a resposta da minha filha, Marina de 10 anos, na escola em uma atividade sobre trabalho.

Entre trabalhar pouco e ganhar pouco, ou trabalhar muito e ganhar muito, qual é a sua escolha? 

E ela respondeu que ficaria com a segunda opção.

Tentando limpar minha mente de todos os meus julgamentos e experiências, conversamos para eu entender o pensamento dela sobre trabalho. 

Marina me contou que viver é muito caro, que ter uma família é mais caro ainda e que ela pretendia ter uma família no futuro. Por isso, precisava trabalhar muito para ganhar bastante dinheiro e poder cuidar da família. Me explicou também que como gosta muito de bichos, ela seria médica veterinária, mas também poderia ser médica como a mãe.

Casa de ferreiro, espeto de pau.

Hoje "um dos meus trabalhos" é apoiar pessoas e seus times na sua relação com o trabalho ou com uma organização e assim gerar mais potência e equilíbrio. E eu nunca "ensinei" minha filha sobre trabalho, ou melhor, não apresentei a ela essa relação direta entre muito trabalho e muito dinheiro. 

É, mas tem coisas que a gente nem precisa dizer que os filhos entendem pelo exemplo dos pais, pelo contexto da escola ou do lugar que vivem. Certamente ela formou essa resposta: muito trabalho e muito dinheiro simplesmente como uma esponja na bolha que vivemos.

Confesso que senti a frustração da primeira fala da Marina sobre trabalho ter tido uma relação direta com dinheiro ao invés de uma simples paixão ou uma vocação. 

Eu na infância queria ser piloto de avião, simplesmente porque eu era apaixonado por aquela máquina que voava. Via filmes, lia livros e meu sonho era entrar na cabine de um avião de caça. Não tinha ideia se um piloto ganhava muito ou pouco?!?! Era assistir TOP GUN onze vezes seguidas e ponto. 

Por outro lado, deixando mais uma vez minhas expectativas de lado, senti realização e gratidão por hoje minha filha poder sonhar em ser o que ela quiser. 

Olhando para trás na minha jornada sou de um passado em que contávamos em poucos dedos quantas mulheres ocupavam posições "de negócio", gerenciais ou de liderança. Sou do tempo de comportamentos machistas da 5a série conscientes e inconscientes em todas as situações de trabalho. Venho sim de um histórico machista e espero que, diferente da minha geração,  quando Marina ingressar no mundo do trabalho as oportunidades de prosperar sejam iguais para todEs.

Semanas depois da conversa com minha filha, participei como painelista da Feira de Carreiras para o ensino médio na escola dela, e novamente um vento fresco de equidade soprou! 

A principal palestrante do evento, CEO de uma gigante multinacional, contou sua trajetória de estagiária a presidente da empresa no Brasil em 25 anos. Para uma sala lotada, na maioria meninas (yes!), ela falou sobre liderança feminina e todos os demais desafios que fazem a carreira corporativa mais difícil para as mulheres. 

Outro frescor de equidade: acompanho hoje nas mentorias e coaching de carreira mais mulheres do que homens. Elas estão muito mais abertas às mudanças do mundo do trabalho, à diversidade, equidade, inclusão, IA, inovação e etc que nós homens. 

Infelizmente é comum escutar dos homens, principalmente aqueles que estão fora do mercado, buscando se recolocar "Não estou conseguindo ser contratado porque sou homem, hétero e branco."

Entendo e acolho o sofrimento dos meus colegas homens brancos cisgênero, mas sempre os convido para refletir "Tá bom, mas quantas vezes na sua jornada, assim como eu, você foi beneficiado apenas por ser homem branco e hétero?" 

Sei que não é uma pergunta fácil de digerir, mas além de agradecer e honrar o caminho até aqui, será que colocar a culpa de uma não recolocação no movimento de diversidade, equidade e inclusão ajuda?!

O mercado de trabalho está muito diferente de anos atrás e mudando cada vez mais rápido mas existem muitas alternativas e espaço para homens, brancos, heteros, cisgênero como eu. Temos muito a contribuir com nossas vivências e experiências.

Por exemplo: me vejo cada vez mais atuando dentro de empresas, junto a líderes e suas equipes, para tratar questões humanas que interferem no negócio, nos resultados. E neste espaço as questões de DE&I são centrais! Então, ao invés de se vitimizar, que tal estudar, aprender e atualizar estes conceitos para que as empresas e os negócios sejam mais diversos, gerando mais impacto dentro e fora da empresa? É uma oportunidade de aprendizado e atuação profissional, além de uma enorme contribuição para toda a sociedade.

Vários colegas consultores, coaches e mentores, mesmo sem lugar de fala, têm atuado como aliados e facilitadores para ampliar e gerar conversas entre todos os grupos e gerações no mundo corporativo.

Me vejo também neste lugar: um homem branco, hétero, cisgênero que teve uma carreira próspera e chegou até aqui consciente de todos seus privilégios e está na busca por estudar, aprender e trabalhar por empresas mais diversas e potentes!

Tenho lido muito, assistido diversas palestras, documentários e TED Talks, além de ter um trabalho voluntário "fora da bolha" para entender em todas as dimensões como as oportunidades profissionais no nosso país são bem assimétricas dependendo do seu CEP, do seu gênero e cor da sua pele. 

E voltando à Marina…

Minha filha terá muito mais oportunidades de prosperar do que minha mãe teve, mas certamente uma menina de 10 anos nascida na periferia com outra cor de pele, terá menos.

Então como disse Emicida no último sábado no Auditório do Ibirapuera: "Temos pressa!"

Deixo então com vocês um trecho da música Principia desse gênio do RAP, e no final uns lins bacanas para quem quer seguir aprendendo e transformando o planeta em um lugar melhor para se viver.


"Vejo a vida passar num instante

Será tempo o bastante que tenho pra viver?

Não sei, não posso saber

Quem segura o dia de amanhã na mão?

Não há quem possa acrescentar um milímetro a cada estação

Então, será tudo em vão? Banal? Sem razão?

Seria, sim, seria, se não fosse o amor

O amor cuida com carinho

Respira o outro, cria o elo

O vínculo de todas as cores

Dizem que o amor é amarelo"


Links:

Mano a Mano no Spotify

AmarElo no Netflix

Pequeno Manual Antirracista de Djamila Ribeiro


Muito Bacana! Resultado, só chega com intencionalidade e esforço e esse tema merece sempre dedicação! 👏👏

Adorei seu texto… incrível! Espero estar fazendo parte do movimento de mulheres líderes em grandes empresas que abrem caminhos para gerações de “Marinas” que estão por vir…. Beijos e obrigada pela reflexão

FABIANA MESCHINI

Consultor Hospitalar/Gerente de Contas/KAM/Consultor de Négocios/Vendas/Relacionamento Médico/Customer Sucess/Territory Manager/Executivo de Contas

7 m

Há algum tempo algumas coisas já o incomodavam Renato, um cara sensível e observador como você vai ajudar muito as empresas nesse tema.

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