Trabalhar perto de casa, ou morar perto do trabalho?

Trabalhar perto de casa, ou morar perto do trabalho?

Tudo na vida é a forma como encaramos as coisas. E um dia eu aprendi que um dos segredos da felicidade é saber o que é bom para você. Simples assim.

Embora eu seja um grande fã de cidades interioranas, sou tipicamente paulistano. Ando sempre com pressa, acho um absurdo lojas fechadas no feriado e meço distâncias em tempo. Dificilmente existe um lugar que dista menos de 40 minutos da minha casa.

Fora isso, também sempre morei em regiões periféricas da grande São Paulo. Nasci no Campo Limpo, entre a infância e início da vida adulta morei em Taboão da Serra, popularmente conhecida como fim do mundo (embora não seja), e hoje resido em Osasco.

O interessante é que há alguns anos eu notei algo: eu não tinha a menor intenção de me mudar para regiões mais centrais

Não me pareciam existir motivos particulares para morar nesses lugares, até ser maior de idade eu simplesmente morava com meus pais. Depois de adulto eu simplesmente não via muito motivo ou condição para me mudar e depois que casei eu simplesmente fui para onde deu pra ir. O interessante é que há alguns anos eu notei algo: Na verdade eu não tinha a menor intenção de me mudar para regiões mais centrais da cidade.

Tive a primeira pista disto ainda no meu primeiro estágio, oportunidade em que trabalhei em uma região nobre de São Paulo, em um bairro de prédios comerciais pomposos, escritórios incríveis e que ficavam a impressionantes uma hora e meia da minha casa.

Naquele ano uma greve gigante de ônibus tomou a grande São Paulo e eu não consegui ir trabalhar. Qual não foi a minha surpresa ao perceber que eu havia sido o único de todos os funcionários diretos da empresa que perdeu um dia de trabalho? Todos os outros ou foram de carro ou simplesmente moravam perto o bastante para ir trabalhar a pé.

Naquele momento me pareceu muito lógica a ideia de alugar um apartamento mais perto do trabalho. Morar sozinho me parecia uma boa ideia, eu já me considerava maduro o bastante pra lidar com isso, e provavelmente eu estava certo. Mas quando fui começar a estudar essa possibilidade a fundo eu percebi que eu simplesmente não queria. Cheguei a pesquisar alguns imóveis, mas nunca tive vontade o suficiente para simplesmente ir visitar um, por exemplo.

Olhando para trás agora, eu reconheço os variados motivos para isso. Algumas razões familiares, pessoais, religiosas e sociais são muito claras para mim hoje, embora não fossem na época. Decidi continuar na casa dos meus pais.

Mudei de emprego.

Passei a trabalhar em um escritório mais perto do centro da cidade. Agora a distância era de duas horas por trajeto, ou duas horas e meia quando o trânsito apertava um pouco mais. Tinha ficado bem mais pesado. Eu sentia que eu perdia muito tempo da minha vida. Quatro a cinco horas por dia eram gastas em transporte. Cerca de um sexto do meu dia era gasto no limbo existencial do trânsito paulistano. Tudo isso aconteceu no mesmo momento em que tive que começar a fazer terapia para tratar minhas crises de ansiedade. A ideia de me mudar para mais perto do trabalho voltou, e mais uma vez, eu simplesmente não queria fazer isso.

Isso me frustrava. Eu tinha feito tudo certo. Fui um bom aluno no ensino médio, fiz uma faculdade de nome na minha área, havia conseguido emprego em excelentes empresas, por que eu estava tão frustrado?

Eu preciso estar rodeado pelas pessoas que eu amo. Mesmo sem perceber eu havia estruturado minha vida toda em torno disso.

Com a terapia e com um pouco mais de maturidade fui notando a importância que eu dou para meus círculos sociais: meus amigos, a comunidade da minha igreja, minha família. Eu preciso estar - literalmente - rodeado pelas pessoas que eu amo. Isso não é um eufemismo, é uma necessidade real. Mesmo sem perceber eu havia estruturado minha vida toda em torno disso.

Aí eu percebi o verdadeiro motivo de não querer me mudar para regiões mais centrais: Eu ganharia, fisicamente, uma distância muito grande e seria muito difícil manter os tipos de relação que eu tenho hoje, parte porque perderia parcialmente contato com algumas pessoas, parte porque eu sentia que em regiões centrais a cultura era muito diferente. Eu estava com medo. Hoje eu encararia me mudar para outro lugar, mas só porque sei que minha esposa está comigo.

A próxima questão era saber o que fazer com tudo isso. Eu estava cansado, estressado e o tipo de vida que o mundo corporativo aprecia certamente não era o tipo de vida que eu queria levar. Mesmo assim, mais uma vez considerei seriamente a hipótese de me mudar, mesmo sem querer. Afinal, eu precisava continuar tocando minha vida profissional, eu precisava continuar fazendo tudo certo.

No meio dessa crise, um dia um desses amigos que aparecem como um anjo da guarda me fez uma das perguntas mais reveladoras que eu já vi:

"Gabriel, você quer morar perto do trabalho ou trabalhar perto de casa?"

Achei a pergunta engraçada. Era um pleonasmo meio absurdo. Mas ele me fitava muito sério. Depois de uns momentos eu entendi o verdadeiro sentido da pergunta: o efeito prático parecia ser o mesmo: O trabalho e a residência serem próximos. O que muda é a referência. Em um caso o trabalho é o que rege a sua vida, no outro, é a sua casa - ou vida pessoal, se você preferir.

É muito importante ressaltar que está tudo bem escolher qualquer uma das duas alternativas, mesmo. O problema é querer viver em uma quando o que você quer é viver na outra. Percebi que a resposta para mim era óbvia: Eu queria trabalhar perto de casa. Não importava muito onde eu trabalhasse, eu podia trabalhar em uma grande multinacional ou em uma microempresa, desde que eu pudesse conservar a minha vida pessoal da forma que eu queria.

Senti escamas caindo dos meus olhos e percebi que na verdade, eu não tinha nenhuma vontade de ser um grande executivo de uma multinacional famosa que tira muito dinheiro por mês, se isso significasse me obrigar a sair de lugares mais pacatos. Eu não me importo em morar longe do metrô, ou de não ter um Starbucks do lado de casa. Eu só quero morar na casa que eu escolher e gastar menos do que a metade do período comercial em trajeto para ir e voltar do trabalho.

Quero trabalhar com Marketing e ser professor, duas profissões pelas quais me apaixonei com o tempo. Quero voltar pra casa depois do trabalho e abraçar minha esposa. Quero um dia abraçar meu filho e vê-lo crescer, de perto.

Prefiro morar em um apartamento pequeno na periferia e ter perto de mim o tipo de gente que eu gosto, do que viver em um apartamento também pequeno no centro correndo ainda mais do que corro hoje. Quero por perto aquele tipo de pessoa que chega em casa quase que sem avisar e me chama pra jantar depois de um culto no final de semana. Eu gosto da ideia de ir em um mercado pequeno de bairro ao invés de um hipermercado que me cansa só de olhar.

Depois de trabalhar um pouco minhas questões de independência, eu descobri que gosto de sossego, de calma e do descanso. Hoje eu só mudaria para o interior, e especificamente para lugares que eu sinto que seria capaz de criar novamente os tipos de laços que eu tenho.

Percebi que apesar de ter ensino superior, falar inglês fluentemente e ter experiência em grandes empresas, eu não preciso, necessariamente, cumprir as expectativas que terceiros geraram sobre mim. Eu posso ser muito feliz trabalhando com um milhão de coisas diferentes.

Enquanto existem muitos que são felizes morando perto de seus trabalhos, e curtindo muito a forma de vida que levam, existem muitos outros que também moram perto de seus trabalhos, mas que gostariam de trabalhar perto de suas casas. Muita gente que se acha obriga a enfrentar coisas que não gosta em sua vida pessoal pelo bem de sua vida profissional. Isso é muito triste.

Acho essencial que comecemos a mostrar que temos mais de uma opção - e podemos ser muito felizes com qualquer uma delas. Lembre-se apenas de ser muito honesto consigo mesmo e com o que você quer. Aprenda a ouvir e reconhecer seu próprio timbre. Isso certamente te ajudará a economizar uma quantia considerável de dinheiro em terapias, remédios e tratamentos. Sério: ser feliz é muito mais barato do que ser estressado.

E pra você, o que é mais importante? Morar perto do trabalho, ou trabalhar perto de casa?

Gabriel gostei muito do seu texto. Grande reflexão! Parabéns!

Carolline Souza

LATAM | Marketing | Maquiagem | Inovação| Pesquisa e Desenvolvimento | Cosméticos

5 a

Eu quero trabalhar perto da minha casa! Moro na mesma casa desde que nasci. Amo meu bairro, amo a facilidade de acesso a diversos pontos de São Paulo. Quero viver aqui aqui e fazer a economia daqui girar. Hoje eu tenho a oportunidade de ir trabalhar a pé e amo o que eu faço!

Gabriel Vieira

Data Governance | Data Management | Business Intelligence | Insights

5 a

Galera, muito obrigado pelas reações! Foi muito melhor do que eu esperava :)

Jéssica Lopes

Gestora | Estrategista de Branding | Marketing | Mentora de Empresários(as)

5 a

Pedro Paulo Candido

Luana Figueredo Miranda

Business Analyst - Business Intelligence - Analytics - MBA - System Analyst

5 a

Reflexão muito atual...parabens..

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