Trago sua história em 3 dias

Trago sua história em 3 dias

Pequenas amarrações de amor.

Sempre achei que tivesse nascido de óculos. Até uns 4, 5 anos, perguntava incessantemente aos meus pais onde eles guardavam o dito cujo antes de eu nascer: “Você pendurava na gola da blusa, mãe?”. Um riso leve sempre vinha como resposta e eu seguia amando esta pequena extensão-quatro-olhos do meu corpo. Meu primeiro wearable.

Talvez pelo fato de ser estrábica e ver “a vida dobrada”, nunca fui uma boa esportista. Morria de medo da bola, nunca aprendi a andar de bicicleta, não tenho a menor habilidade para a corrida... Mas aprendi a escrever histórias. Muito cedo. Brincando de escolinha com a irmã mais velha. Coisa de uns 3 anos. Tenho a memória do meu primeiro caderno. Ganhei do meu pai. Verde, com uma menininha que segurava um guarda-chuva na capa. Ali eu comecei a escrever. Dali eu pulei para livrinhos com histórias sobre “a última margarida do jardim”. Se me perguntassem o que eu queria ser quando crescer, não titubeava: “escritoUUUra”.

Na escola, ganhei alguns concursos de redação. No vestibular, fiz a melhor pontuação. Na faculdade, ouvi de um professor – um mestre, escritor reconhecido – que eu tinha ares “clariceanos”. Fiquei emocionada. Nunca pensei em desenvolver uma veia literária. Para mim, não é sobre isso – há tanta gente tão melhor para ler e amar... Minha paixão é pelo prosaico, pelas pessoas. Pelo riso sem fala, pela ruga na testa, o não dito. Observar, pensar e contar essas histórias. Articular informações e pontos de vista para criar algo que sirva a todos nós (e, preferencialmente, que ajude a desatar nós). Me transportar para outro mundo, para outro lugar. A gente vive do outro.

E como escreveu o Saramago, “não quero fazer nada na vida que faça me envergonhar da criança que fui” (aliás, a exposição sobre ele no Farol Santander está linda!). Então, sigo contando histórias – na redação, em vídeo, em filme, em livro, em adesivo de elevador, nos meus infinitos anéis, no peso dos colares, em fotografias, onde for.

Nos últimos dias ouvi tanto sobre histórias: na entrevista recente com um CEO, todas as suas grandes decisões eram baseadas em lições que aprendeu – e que se tornaram grandes histórias na sua vida. Tão simples, verdadeiro, eficaz. Num outro evento, sobre as conexões entre Jornalismo e Negócios, o Aberje Trends, falamos sobre o valor de uma grande história – e como métricas como alcance e frequência parecem tão insuficientes para medir o impacto de uma boa troca de experiências. Hoje, em uma reunião de equipe com um cliente, discutimos como as histórias legítimas, calcadas em atitudes consistentes, ganham ressonância simplesmente porque elas interessam ao público – em vez de “serem feitas para as pessoas gostarem”. História transmite cultura. É feita pra gente nunca se perder. É registro do que a gente quer guardar para sempre, para buscar final feliz depois. Tem que fazer sentido. Nunca para todo mundo. Mas para quem foi escrita. 

E hoje, já no fim do dia, leio uma declaração do Jeff Bezos abolindo o PPT das reuniões na Amazon. Tão melhor contar as histórias, não? Consumi-las com tempo para imaginar. Elaborar é tão importante, não é?

Hoje estou só gratidão. Pelas experiências que eu vivo e por ocupar uma posição tão privilegiada de poder, como estrategista, descobrir as melhores histórias, distribui–las e dividir com pessoas que admiro novas formas de relatar o que está no mundo – basta que a gente se disponha a enxergar. Eu quero ver muito mais longe. Sem colonizar ninguém. Sem perder tempo. Sem deixar para trás o que muda tudo. Sem nunca deixar de observar o que realmente faz a diferença no mundo. Quero entregar planejamento em crônica, estratégia em filme, narrativa em infográfico. Eu quero é ter muito mais responsabilidade.

  “- Responsabilidade de quê? - A responsabilidade de ter olhos quando os outros perderam.” (José Saramago)

  

 

  

Júnior Ribeiro

Head de Comunicação | Estratégias de Conteúdo e Employee Experience | Cultura Organizacional e Engajamento | Comunicação Corporativa e Liderança Executiva | Gestão de Crises e Transformação Digital

5 a

Comecei a ler e logo fui pegar a minha caneca com leite com café, já sabia que o texto seria gostoso e confortável de se ler ;)

Joyce Moysés

Jornalista, produtora de conteúdo de comportamentos, análises setoriais, ghost writer de CEOS, escritora

6 a

Paula, sempre achei você muito estilosa com seus óculos. E eu também assumi mais os óculos, parando de comprar lentes de contato nos últimos anos.

Ademar Skalinski

Head for Operations and Production - Brazil Pavilion

6 a

Sensacional. Parabéns... que talento...

Christian Miguel da Silva

Gerente Sênior de Comunicação e Public Affairs @ Alandar Políticas Públicas | Advocacy | Comunidades | Pride Advocate 🏳️🌈

6 a

Adorei a abolição do ppt — e depois dessa ode às histórias, a gente é que tem que te agradecer :))

Andressa Scaldaferri

Account Director na Edelman Brasil, responsável pela operação no Rio de Janeiro

6 a

Maravilhoso esse texto, Paula. Que delícia de ler! 😘😘

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