Trump, TPP e a China

Trump, TPP e a China

No ultimo dia 20 de abril completou-se três meses de governo Trump, e foram 90 dias turbulentos e intensos: Muro na fronteira com o México, rigidez na política imigratória, decreto anti-muçulmanos, grampos, queda do conselheiro de segurança por envolvimento com autoridades russas, retirada do país do Acordo Comercial do Pacifico (TPP), bombardeio no Afeganistão, tensão com Coreia do Norte entre outras várias polêmicas.     

A economia real já sente as consequências das medidas do novo governo, com uma série de cancelamentos de negócios por parte de empresas mexicanas junto aos seus fornecedores estadunidenses, mas ao que tudo indica, o maior dano em termos comerciais deve ser a saída do país do Acordo de Parceria Transpacífico, que, além do aspecto econômico, é também contraproducente do ponto de vista estratégico, já que os EUA tem uma presença enorme na região, em termos comerciais, políticos e territoriais. 

Contextualizando, o TPP é o acordo de regulação do comércio entre 12 países da bacia do Pacífico (Austrália, Brunei, Canadá, Cingapura, Chile, EUA, Japão, Malásia, México, Nova Zelândia, Peru e Vietnã), e compreenderia cerca de 40% do PIB mundial. Após vários anos de trabalho e negociações, Trump, cumprindo promessa de campanha, decidiu de maneira unilateral e abrupta, retirar os EUA do tratado, alegando que enfraqueceria a soberania do país, assim como também, eliminaria muitos postos de trabalho dos cidadãos americanos. Tais argumentos são frágeis e de fácil contestação, todavia, a despeito de tudo isso, ao ignorar a bacia do pacífico, o novo presidente demonstra um contrassenso histórico ao que tem sido uma geopolítica secular de seu país.

 O foco comercial americano no Pacífico é histórico, o próprio crescimento do país como nação foi baseada na ampliação territorial rumo costa oeste. Ao longo dos anos o país foi conquistando territórios: Louisiana comprado da França; Texas, Novo México e Califórnia conquistados (à força) do México, Oregon cedido pela Inglaterra e o Alasca comprado da Rússia. Finalmente dominando a costa do Pacífico, era a oportunidade para escapar da forte concorrência do fluxo comercial do Atlântico, então o país negociou a abertura do Japão ao mercado Internacional, e também, ainda no século XIX, apoiou a China a manter sua soberania e estabelecer negociações comerciais com qualquer país, contrapondo-se às grandes potências europeias, que, por conta da guerra do ópio, queriam fatiar a China em zonas de influência, sinalizando o papel de protagonista global que o país começava a assumir. Protagonismo e poder também demonstrados ao anexar várias ilhotas do pacifico, como Havaí (após um golpe interno) e Midway, que como o próprio nome diz, era o meio do caminho da viagem para o Japão, servindo como parada para navios comerciais. Consolidada a presença no Pacífico, os EUA se voltaram para a America Central, onde exerceram forte influência política e ideológica, e praticamente transformaram a região em seu quintal. Coordenaram e administraram a construção do canal do Panamá, conforme a lógica de uma nova estratégia comercial bi-oceânica. Então, depois de todo esse caminho percorrido, quase 200 anos de história construída, tanto sangue, suor e lágrimas de várias gerações vertidos nessa saga, qual o sentido do país ignorar um acordo de livre comércio com seus pares da bacia do Pacífico? Alguns diriam que a estratégia desse movimento é minar a representatividade do bloco no tabuleiro geopolítico, algo que até faria algum sentido caso não houvesse outro gigante ávido em preencher essa lacuna aberta por Washington.

 Abril de 2013, a China decide que o dólar australiano seja considerado moeda corrente em suas transações comerciais, a terceira atrás apenas do Dólar americano e do Iene japonês; Junho de 2015, China e Austrália assinam um acordo de livre comércio, com previsão de movimentação de USD 40 bilhões/ano; China já tem acordo de livre comércio bilateral com: Nova Zelândia, ASEAN (Comunidade do Sudeste Asiático), Coréia do Sul, Peru e Chile; Entre os participantes do TPP, a China só não tem acordo de livre comércio com o Canadá, e mesmo assim é o segundo maior parceiro comercial do país, onde vivem 1,3 milhão de Sino-descendentes, e também com o México, onde as negociações já estão adiantadas para um acordo. Outros grandes da região como Austrália e Japão, já possuem acordo de livre comércio entre si e também com Chile, Coréia do Sul, ASEAN, México e Peru. Considerando toda essa trama de relações, é muito mais provável que todos esses países continuem a fortalecer seus laços comerciais, e deixem os EUA de lado, ainda mais com a aproximação e suporte da pujante economia chinesa. Assim como no século 19, os EUA parecem ajudar a China a defender seus interesses comerciais, porém, diferentemente do ocorrido à época, o país não será beneficiado no novo cenário, todavia, um grande grupo empresarial de um americano ilustre pode se dar muito bem com esta situação.

O Escritório de Marcas Registradas da China publicou no ultimo dia 27 de fevereiro, licenças de 38 produtos da marca Trump, permitindo que o grupo desenvolva diversos tipos de negócios no país asiático. As marcas incluem negócios de hotelaria, seguros, escolta, spas, lojas e campos de golfe. A entrada dos pedidos para o licenciamento são de abril de 2016, e, segundo especialistas no assunto foram aprovados em tempo recorde quando comparado à média histórica registrada. Ironicamente, na mesma época do pedido das licenças, o então candidato republicano, atacava duramente a política econômica chinesa, acusando o país de manipulação de sua taxa de câmbio e também de roubar empregos dos EUA. Donald transferiu o controle de suas empresas a familiares antes de sua posse, afim de evitar possíveis acusações de conflito de interesses entre a presidência e a gestão de seus negócios. Pode ser tudo uma grande coincidência, ou não. Tirem suas conclusões.

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