As usinas hidrelétricas com reservatório e sua valiosa contribuição para o sistema elétrico nacional
Imagem: Usina Hidrelétrica de Itaipu

As usinas hidrelétricas com reservatório e sua valiosa contribuição para o sistema elétrico nacional

por Luiz A. Valbusa (*)

As usinas hidrelétricas com reservatório, tanto as convencionais quanto as reversíveis (ou de bombeamento), desempenham um papel essencial na estabilização do Sistema Interligado Nacional (SIN) e na transição para um cenário de descarbonização.

1. Estabilização do Sistema Interligado Nacional (SIN)

Uma das principais vantagens das hidrelétricas com reservatório é a sua capacidade de funcionarem como baterias naturais, onde a própria natureza se encarrega de recarrega-las, numa forma de energia potencial acumulada. Essa energia pode ser convertida em eletricidade de maneira rápida e flexível, proporcionando resposta imediata às flutuações na demanda e compensando a intermitência das fontes renováveis variáveis, como solar e eólica. No contexto do SIN, que integra diferentes fontes de geração de energia e abrange todo o território brasileiro, essa flexibilidade é essencial para garantir a confiabilidade e a estabilidade do sistema.

Além disso, as usinas com reservatório fornecem inércia ao sistema elétrico. A inércia é um fator crucial para manter a frequência do sistema dentro dos limites adequados, evitando oscilações que podem levar a blecautes. Em contraste com fontes como a solar fotovoltaica e a eólica, que possuem baixa ou nenhuma inércia, as hidrelétricas com reservatório têm grandes geradores síncronos que adicionam massa girante ao sistema, ajudando a manter a frequência estável.

2. Usinas Reversíveis e Flexibilidade Operacional

As usinas hidrelétricas reversíveis (ou de bombeamento) agregam ainda mais valor ao sistema. Utilizando energia excedente no sistema (como a gerada por fontes eólicas e solares quando a demanda é baixa) o reservatório superior é carregado e posteriormente pode despachar conforme a necessidade do sistema e gerar eletricidade nos momentos de pico de consumo. Essa capacidade de armazenamento de longo prazo e de resposta rápida torna as hidrelétricas reversíveis uma solução ideal para aproveitar os períodos onde há muita geração das intermitentes e baixa demanda, ajudando a evitar a necessidade de acionamento de usinas térmicas mais caras e poluentes.

3. Caminho para a Descarbonização

No contexto de descarbonização, as hidrelétricas com reservatório e as reversíveis são cruciais para a transição energética. Com a crescente penetração de fontes renováveis intermitentes no Brasil, como solar e eólica, há uma demanda cada vez maior por formas de energia que possam equilibrar a geração renovável sem adicionar emissões de carbono. Pela característica intrínseca de seus equipamentos principais de ter uma vida útil próxima de 100 anos, as hidrelétricas com reservatório têm a menor pegada de carbono entre todas as outras fontes. Podem fornecer energia de maneira rápida e eficaz, sendo que sua capacidade de armazenamento de energia as posiciona como um complemento ideal para a expansão das fontes intermitentes.

Em um sistema com maior participação de renováveis, é fundamental garantir que a energia fornecida seja contínua e confiável, mesmo em períodos de baixa geração de energia solar ou eólica. As hidrelétricas com reservatório oferecem essa garantia, uma vez que podem ser operadas para fornecer energia quando as outras fontes não conseguem atender à demanda. Dessa forma, elas ajudam a reduzir a dependência de fontes fósseis, como as térmicas a gás ou carvão, que historicamente são acionadas em momentos de escassez de energia.

4. Aproveitamento do Potencial Hidráulico Não Explorado

O Brasil ainda possui um grande potencial hidráulico inexplorado, especialmente em regiões como a Amazônia e áreas remotas. A construção de novas hidrelétricas com reservatórios em locais ambientalmente adequados pode aumentar a capacidade instalada do país, reforçando ainda mais a inércia e a flexibilidade do sistema. Além disso, novas usinas podem ser projetadas com critérios ambientais modernos, minimizando os impactos negativos, enquanto maximizam os benefícios em termos de geração de energia limpa e estável.

Somente como curiosidade, o Brasil tem aproximadamente 80 gigawatts de potencial hidrelétrico inexplorado. Digamos que numa situação hipotética, se queira aproveitar todos estes potenciais. O desmatamento que seria necessário seria de aproximadamente 10.400 quilômetros quadrados, equivalente a 0,16% da área da Amazônia. Como comparativo, hoje em dia, o desmatamento criminoso para retirar madeira e enviar para o exterior é responsável por destruir 7.700 quilômetros quadrados por ano, sem qualquer benefício para os brasileiros, muito pelo contrário. Vamos desperdiçar esse verdadeiro tesouro que está em nossas mãos?

Conclusão

Em resumo, as usinas hidrelétricas com reservatório, normais e reversíveis, são peças-chave para a estabilização do Sistema Interligado Nacional, graças à sua capacidade de armazenamento e inércia. Elas proporcionam flexibilidade operacional, essencial em um cenário de aumento de fontes renováveis intermitentes, e desempenham um papel central no processo de descarbonização da matriz energética brasileira, assegurando um fornecimento de energia firme, renovável e de baixa emissão de carbono.


(*) Luiz Antonio Valbusa é engenheiro mecânico e sócio-diretor da empresa SEMI Industrial Ltda., fabricante de turbinas e equipamentos para PCHs e CGHs, estabelecida em São José dos Pinhais – PR. Também é investidor em pequenas centrais hidrelétricas no Estado do Mato Grosso.


Excelente, Valbusa! A estabilidade do setor elétrico está cada vez mais crítica exatamente pela falta de hidrelétricas. Bato nisso faz tempo: o Brasil só aproveita 45% de seu potencial hidrelétrico, mas ninguém quer falar disso. Pior, há quem trabalhe contra, por absoluta ignorância de seus benefícios. Temos pouco mais de 1.600 PCHs e CGHs, enquanto que a Alemanha, por exemplo - com o território semelhante ao do Paraná - tem 7.000... e o que dizer dos USA, que tem 70 mil? Será preciso que cheguemos ao caos total e ao eclipse energético para os interesses nacionais se imporem acima da luta dos lobbies?

Excelente artigo, muito esclarecedor. De maneira geral e analisando o cenário nacional, o que podemos apontar ou identificar como principais causas para termos esse enorme potencial hidrelétrico ainda inexplorado em nosso país?

Eduardo Lemos

Bacharel em Engenharia Elétrica | Supervisor | Eletricista Escalador Offshore | IRATA N1 | Indústria de Óleo & Gás | Improving My English Skills | Técnico em Eletrotécnica.

3 m

Muito bom, Luiz. Em 2021 escrevi um artigo nessa mesma linha sobre a UHE Belo Monte. Os reservatórios são peça chave para o Operador não ficar "refém" das térmicas a Diesel.

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