A verdade sobre a Geração Z no Brasil

A verdade sobre a Geração Z no Brasil

Nos últimos anos, tem-se discutido muito sobre a Geração Z e sua entrada no mercado de trabalho. Diversas pesquisas e relatos apontam uma alta taxa de demissões de jovens dessa geração nos primeiros meses de emprego. Muitas empresas justificam essas demissões com a percepção de falta de maturidade, ética de trabalho e dificuldade de adaptação desses profissionais. No entanto, será que essas percepções estão corretas, ou estamos importando rótulos de contextos sociais e econômicos estrangeiros que não se aplicam à realidade brasileira?

 

A Geração Z, nascida a partir de 1997, está gradualmente assumindo seu espaço no mercado de trabalho, e se espera que até 2025 represente 25% da força de trabalho global. O problema é que boa parte das análises sobre essa geração são baseadas em realidades norte-americanas e europeias, onde a dinâmica socioeconômica é muito diferente da brasileira. Esses rótulos podem estar prejudicando as oportunidades desses jovens no Brasil, onde as condições de vida e os desafios econômicos são bastante distintos.

 

O Desafio dos Rótulos Importados

É inegável que muitos jovens da Geração Z enfrentam dificuldades ao ingressar no mercado de trabalho. Empresas relatam uma insatisfação com a capacidade desses jovens de lidar com feedbacks, seguir padrões de trabalho tradicionais e demonstrar comprometimento a longo prazo. Mas essas percepções, muitas vezes, estão baseadas em modelos de trabalho que já não se aplicam da mesma forma a essa geração, e muito menos à realidade brasileira.

 

Enquanto em países desenvolvidos a Geração Z é frequentemente retratada como uma geração mais instável ou descomprometida, essa generalização não leva em conta o contexto brasileiro, onde as pressões socioeconômicas moldam o comportamento dos jovens de forma significativa. No Brasil, os jovens da Geração Z enfrentam desafios muito diferentes daqueles de países mais ricos, e aplicar os mesmos rótulos aqui ignora fatores críticos como desigualdade social, escassez de oportunidades e uma necessidade econômica urgente.

 

A Realidade Socioeconômica no Brasil

 

Segundo o IBGE, cerca de 75% faz famílias brasileiras são de classe social C, D e E. A renda média destas famílias variam entre R$ R$ 3.980,38 (C1) e R$ R$ 1.087,77 (E). Os jovens brasileiros, em especial aqueles das classes C, D e E, têm uma relação muito mais direta e urgente com o trabalho do que seus pares de países desenvolvidos. A taxa de desemprego entre jovens de 18 a 24 anos no Brasil é alarmante, chegando a 29,4%, segundo dados recentes do IBGE. Muitos desses jovens começam a trabalhar cedo, muitas vezes em empregos informais ou de baixa remuneração, para ajudar a sustentar suas famílias. Eles crescem em um ambiente onde o trabalho não é apenas uma forma de realização pessoal, mas uma necessidade econômica. Além disso, uma pesquisa da Deloitte indica que 63% da geração Z e 62% dos millennials vivem apenas com o salário mensal, refletindo uma realidade financeira desafiadora.

 

Diferentemente do que as análises superficiais sugerem, a juventude brasileira, especialmente das camadas menos favorecidas, muitas vezes desenvolve uma resiliência única ao mercado de trabalho, obviamente motivada pela necessidade. Enfrentando dificuldades econômicas e falta de oportunidades, esses jovens precisam ser adaptáveis, resistentes e criativos. Essas qualidades, que deveriam ser valorizadas pelas empresas, são muitas vezes ignoradas por conta dos rótulos importados.

 

A conformidade social, um conceito da Psicologia Social que se refere à tendência de indivíduos se alinharem às normas de um grupo, também desempenha um papel importante. Os jovens da Geração Z no Brasil, pressionados por expectativas sociais e econômicas, demonstram uma forte capacidade de adaptação, ajustando-se às exigências do mercado mesmo diante de condições adversas.

 

Flexibilidade e Adaptabilidade

Uma característica frequentemente ignorada nas discussões sobre a Geração Z no Brasil é a sua adaptabilidade. Ao contrário do que as percepções generalizadas sugerem, muitos jovens dessa geração são altamente flexíveis. Eles estão dispostos a aceitar empregos temporários, atuar em múltiplas áreas e se reinventar quando necessário. Esse comportamento é uma resposta direta às condições econômicas instáveis do Brasil, e não uma "falta de comprometimento", como muitas vezes se rotula.

 

Além disso, a Geração Z brasileira está cada vez mais focada em encontrar propósito em seu trabalho. Esse desejo por propósito e significado não deve ser confundido com desinteresse. Pelo contrário, jovens que buscam um trabalho alinhado com seus valores pessoais estão demonstrando uma visão de longo prazo, onde a satisfação no trabalho é essencial para a produtividade e o bem-estar. Empresas que entendem isso e criam ambientes que oferecem flexibilidade, desenvolvimento profissional e um propósito claro terão mais chances de atrair e reter esses talentos.

 

A Pressão Psicológica e a Necessidade de Apoio

Apesar de sua resiliência, os jovens da Geração Z no Brasil também estão enfrentando uma crescente pressão psicológica. A busca por estabilidade econômica, combinada com a exposição constante nas redes sociais e a necessidade de se destacar profissionalmente, tem levado a um aumento dos níveis de ansiedade e burnout. Esse é um aspecto que não pode ser ignorado, e reforça a necessidade de um ambiente de trabalho que ofereça apoio emocional e mental adequado.

 

Jacques Lacan, em sua Psicanálise, destacou a importância da linguagem e da escuta no processo de comunicação e construção da identidade. Para a Geração Z, um ambiente de trabalho que valorize a escuta ativa, a inclusão e o respeito às suas visões de mundo é essencial para seu bem-estar. Rubem Alves, pensador brasileiro, também nos lembra que “escutar é uma arte”, e que líderes precisam desenvolver essa habilidade para lidar com as novas gerações.

 

Quem Está Preparado para Ouvir?

 

O desafio para as empresas no Brasil não é simplesmente adaptar suas práticas de gestão para atrair a Geração Z, mas sim entender que os rótulos importados de outros contextos não se aplicam à realidade brasileira. Jovens brasileiros, especialmente das classes mais baixas, estão lidando com pressões e desafios únicos, e rotulá-los como "pouco comprometidos" ou "imaturos" é ignorar o contexto social e econômico que molda seu comportamento.

 

Em vez de se concentrar nos rótulos, precisamos criar ambientes de trabalho que sejam flexíveis, acolhedores e prontos para ouvir as necessidades desses jovens. Só assim será possível aproveitar todo o potencial da Geração Z, que, apesar dos desafios, tem muito a oferecer ao futuro do mercado de trabalho no Brasil.

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Robson Vitorino – Fundador e Diretor da Maxta Human Intelligence. É professor em cursos MBA, escritor e palestrante.

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Fontes:

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Citations:

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