As Veredas de João Guimarães Rosa
João sempre exigiu demais do seu leitor. Ele não queria a leitura passiva, nada era entregue de mão beijada, havia de tê o sinhô uma vivência e um conhecimento ou embarcar em sua viagem sensorial e linguística.
Grande Sertão: Veredas é o ápice dessa aventura. Lançado em 1956, é a obra mais importante da Literatura Brasileira por três aspectos fundamentais: na retratação regional-universal do Sertão que coloca o Brasil no mundo, os conflitos e reflexões do narrador-filósofo Riobaldo e a linguagem híbrida culto-coloquial com neologismos e influências de outras línguas.
O Sertão de João Guimarães Rosa é o mundo, pode ser traduzido e inserido em qualquer realidade assim como os conflitos do jagunço anti-herói. Tem violência, misticismo, reflexão e paixão, uma saga sobre a vida.
Porém, a linguagem desse livro é o grande assombro. João era poliglota e em dado momento não sabemos se o que o narrador diz é fruto de sua pesquisa - Guimarães passou 10 dias viajando em cima de uma mula pelo Sertão de Minas Gerais anotando dentre outras coisas, costumes, palavras e nomes de bois e plantas, 4 anos antes de escrever o livro - ou se é criação influenciada no alemão, no inglês ou espanhol, três das línguas que era fluente. A linguagem de Rosa é como a construção do Brasil, uma mistura de povos, somos índios-africanos-europeus e tão misturados que não sabemos onde começa um povo e termina o outro. A linguagem é a ferramenta que o escritor tem de retratar e reescrever a história.
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Grande Sertão: Veredas é difícil de ler. Tem que ser e o é porque as obras importantes da literatura mundial são sofisticadas e exigentes: não se lê-las impunemente. Está no patamar de Ulysses, Ilíada e Dom Quixote. E temos o privilégio de estar escrito em português.
Guimarães Rosa além de médico, diplomata e escritor era um grande brasileiro. Um homem respeitado em vida, eleito membro da Academia Brasileira de Letras em 1963 adiou tomar posse por temer pela própria vida: tinha uma superstição que morreria após a honraria. Apenas em 1967 tomou posse e três dias após, aos 59 anos, morreu vítima de um infarto.
Ainda em 1967 foi indicado ao prêmio Nobel de Literatura. Porém, teve sua indicação retirada por conta de sua morte. Particularmente penso que todo brasileiro deveria se formar na educação básica apenas depois de ser capaz de ler Grande Sertão: Veredas, deveria ser o nosso ideal de qualidade.