Você já pensou no seu trabalho como um fator que determina o seu estado de saúde?

Isso é o que chamamos na Saúde Pública de determinantes sociais da saúde. O trabalho, assim como condições de habitação, nível de educação e até acesso a transportes, influenciam diretamente nas condições de saúde dos indivíduos - saúde física e mental. O pai da psicodinâmica do trabalho, Christophe Dejours, diz que "o trabalho não é neutro com relação a saúde, ele favorece seja a doença, seja a saúde." 

Atualmente, talvez seja mais fácil perceber essa relação pela mudança drástica no perfil epidemiológico. No Brasil, de acordo com o Sistema de Informações de Agravos de Notificação (Sinan), o incremento do número total de casos de transtornos mentais relacionados ao trabalho notificados foi de 1.095%, passando de 121 casos em 2007 para 1.446 em 2016. Há uma transformação nítida no tipo de prejuízo causado pelo trabalho. Antes, predominantemente físico, como Lesão por Esforço Repetitivo (LER) e acidentes de trabalho e, hoje, cada vez mais resultado de relações de trabalho. É na interação (ou falta dela), entre os trabalhadores que está a causa do adoecimento. Assédio moral, sexual, falta de reconhecimento, de empatia, de objetivos definidos; processos de trabalho exaustivos e, bingo!, a flexibilização do trabalho.

É muito fácil ser enredado pelas novas promessas. Já ouviram falar do conceito de everywhere office? Pois é… Já ultrapassou os limites da casa e agora você pode fazer como naquela clássica imagem do empresário à beira do mar azul turquesa trabalhando no seu laptop. Pode mesmo? Eu entendo que existam inúmeros benefícios da flexibilização do trabalho, que não é necessário estar dentro de um escritório para ser produtivo. Por outro lado, os limites estão claros? Quantas horas por dia o trabalhador deve estar disponível? Ou essa fronteira entre trabalho e vida privada também não existe? Trabalhar aos domingos é uma opção do trabalhador? Ele fez essa escolha a partir de um processo consciente e reflexivo? Eu acredito que não é o mercado que trará respostas razoáveis. Na França essa situação está parcialmente resolvida, pela atuação do Estado. O trabalhador já tem o "direito à desconectar" assegurado por Lei, por exemplo. 

A continuar...

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