• Larissa Saram
  • Colaboração para Marie Claire
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Antes de Artemisia, nenhuma cena de Judite decapitando Holofernes trazia a personagem como uma das agentes do assassinato. Nesta pintura, a artista se autorretrata no papel da protagonista e coloca seu estuprador sendo decapitado (Foto: © Luciano Romano / Museo e Real Bosco di Capodimonte 2016)

Antes de Artemisia, nenhuma cena de Judite decapitando Holofernes trazia a personagem como uma das agentes do assassinato. Nesta pintura, a artista se autorretrata no papel da protagonista e coloca seu estuprador sendo decapitado (Foto: © Luciano Romano / Museo e Real Bosco di Capodimonte 2016)

Há tempos que as mulheres usam a arte para denunciar violências sexuais. No século 17, a italiana Artemisia retratava, a partir da perspectiva feminina, ou seja, de quem sofre abusos, figuras da Bíblia e da mitologia. Sua obra mais famosa, "Judite decapitando Holofernes" mostra o momento em que a Judite, com ajuda de uma serva, corta a cabeça de um general que a havia assediado. Artemísia também pintou "Susana e os Anciãos", personagem de uma parábola bíblica que ao denunciar os assédios praticados por dois juízes contra ela, foi acusada de adultério.

Especialistas dizem que criar essas telas foi a maneira que Artemísia encontrou de falar sobre as violências das quais foi vítima quando era mais nova.

De lá pra cá, muita coisa mudou: as mulheres conquistaram mais espaço no universo das artes, seus talentos foram reconhecidos – Artemísia foi rejeitada durante anos e teve a autoria de seus quadros atribuída a seu pai e outros homens – e novas técnicas começaram a fazer parte dos portfólios. O que continua igual são os ideias machistas que colocam as mulheres num lugar de objeto com a função de satisfazer os desejos masculinos, mesmo que elas não queiram.

Conheça 3 artistas que partiram das experiências de importunação sexual e assédio em locais públicos para criar obras e promover debates sobre o quanto é urgente o fim da cultura do estupro no mundo todo:

O MUNDO UTÓPICO DE LETICIA RMS

Imagine uma cidade em que as mulheres possam andar pelas ruas sem medo, entrar no ônibus ou vagão do metrô sem precisar ligar o radar do perigo. Esse cenário se tornou possível nas criações da artista visual e designer industrial Letícia RMS. Por meio de técnicas como ilustração, colagens, sobreposições de elementos e animação digital que, juntas, geraram um vídeo, a série lúdica "Transtópico" faz a gente pensar na importância de planejar os espaços públicos a partir da perspectiva feminina para garantir inclusão e equidade de direitos no ir e vir. De acordo com uma pesquisa realizada pela Secretaria Municipal de Desenvolvimento de São Paulo, as mulheres representam 74,6% dos usuários de transporte coletivo. No metrô, somos 56% dos passageiros transportados. Por que ainda não temos o direito de aproveitar o lugar onde moramos, sem que isso venha com uma carga de tensão?

AS MULHERES SEM SORRISO DE TATYANA FAZLALIZADEH

A pintora iraniana radicada nos Estados Unidos estava trabalhando em um grande mural na rua quando se deu conta do quanto violento era para as mulheres sofrerem diariamente com comentários humilhantes nos espaços e transporte públicos. Passou a puxar papo com desconhecidas e perguntar sobre situações de importunação sexual que tinham vivido. A partir desses relatos, Tatyana começou a série "Stop Telling Women to Smile", em tradução livre "Pare de falar para as mulheres sorrirem". São retratos femininos em preto e branco acompanhados de uma frase que resume a experiência de abuso daquela mulher. A artista começou a pendurá-los nas ruas do bairro onde morava, no Brooklyn (NY). Depois foi para Chicago, Filadélfia, Washington DC, até alcançar outros países como Alemanha, Canadá, México, Trinidad e Tobago e Reino Unido.

Hoje, Tatyana prioriza a internacecionalidade do projeto para que a sociedade possa refletir sobre como aspectos da identidade social e política de uma pessoa se combinam para criar diferentes modos de discriminação e privilégio. No ano passado, a pintora lançou um livro, que reúne os retratos e detalhes das histórias que ouviu.

AS EXPLICAÇÕES ILUSTRADAS DE EMMA CLIT

A famosa frase "quer que eu desenhe" foi levada ao pé da letra pela francesa Emma Clint. A cartunista, que direciona um olhar feminista para a maior parte do seu trabalho, criou uma história em quadrinhos que explica de maneira bem detalhada a diferença entre paquera e importunação sexual. Com o título "Un rôle a remplir", em tradução livre "Um papel a desempenhar", ela usa o gancho do movimento "Me too", quando o tema "assédio sexual" chegou ao ouvido de muitos homens, para explicar que é possível ​​flertar com educação e que um não siginifca não.

De maneira leve e com diálogos simples, ela conduz o leitor para que ele entenda que uma relação de sedução se constrói a dois e o contrário disso é importunação sexual. Ela também mostra como nasce a noção de que o corpo da mulher é público. Veja a história completa aqui.

Esta matéria faz parte do especial de Marie Claire sobre as variadas formas de assédio, que pode ser acessado em revistamarieclaire.globo.com/Feminismo/Assedio. O canal tem todas as reportagens abertas, sem paywall, com o apoio de L’Oréal Paris.

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