Revista Infraestrutura e Logística
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Por Guilherme Meirelles


Balsa-fábrica flutuante de processamento de açaí da Transportes Bertolini, necessária porque o fruto se deteriora em 48 horas — Foto: Divulgação
Balsa-fábrica flutuante de processamento de açaí da Transportes Bertolini, necessária porque o fruto se deteriora em 48 horas — Foto: Divulgação

Composta por nove Estados, 772 municípios e um território de 5.015.068.18 km², a região da Amazônia Legal é um desafio para o setor de logística em razão da precária infraestrutura de transporte e dos gigantescos obstáculos climáticos e geográficos, que impressionam pela sua exuberância e pelas distâncias exigidas.

Desafios que incluem naturalmente muita transpiração por temperaturas superiores a 35°C e regime peculiar de vazão nos rios, o que torna a Amazônia uma fonte de inspiração para que sejam desenvolvidas soluções logísticas inovadoras operando em paralelo com os hábitos da cultura local, caso das tradicionais embarcações de três andares, em viagens de até 18 dias, que abrigam tanto passageiros dormindo em redes nos decks como mercadorias de todos os gêneros nos porões a serem distribuídas em cidades e comunidades ribeirinhas.

Entender a logística da Amazônia é aceitar e respeitar os regimes de vazante (entre agosto e novembro, considerado como “verão”) e as cheias dos rios, no “inverno”. Entre uma estação e outra, o nível das águas do rio Negro, que banha Manaus (AM), varia de 16 metros até 29 metros, o equivalente a um edifício de cinco andares, o que obriga os navios de cabotagem a reduzir seu volume de carga em até 40%.

Em meados de setembro, por exemplo, a seca que atingia o Amazonas e o rio que leva seu nome mostrava seus impactos no transporte hidroviário de cargas. A estiagem que costuma ocorrer de outubro a dezembro não é novidade, mas começou antes do previsto, com maior intensidade.

Em razão de condições como essas, o porto de Manaus é considerado um porto flutuante e dotado de moderna infraestrutura. No começo de outubro, está previsto o início das operações de três guindastes elétricos no terminal da operadora Super Terminais, capazes de proporcionar ganho de produtividade de até 30% e economia de R$1,8 milhão de litros de diesel por ano.

Por suas características, a cidade de Manaus é praticamente 100% abastecida de alimentos, medicamentos e itens de consumo básico por indústrias de outras regiões. O transporte de cabotagem vem dos portos das regiões Sul e Sudeste até a bacia do rio Amazonas, no Amapá, e de lá segue até Manaus. No sentido inverso, a mesma rota é utilizada pelas indústrias instaladas na Zona Franca (ZF) – são 540, sendo 60 âncoras e 480 de apoio em insumos –, quando optam pela cabotagem.

Renata Andrade, da Solar Coca-Cola: bebidas não podem ser expostas ao sol — Foto: Divulgação
Renata Andrade, da Solar Coca-Cola: bebidas não podem ser expostas ao sol — Foto: Divulgação

É muito comum o transporte rodofluvial (carretas em balsas com capacidade para 2,5 mil toneladas), pelo qual os produtos da ZF são descarregados em Belém, cidade com a maior rede de transportadoras da Amazônia, seguindo por rodovia rumo aos locais de entrega pelo país. É o caso da Honda, que utiliza tanto a cabotagem como o rodofluvial. Segundo informações da empresa, o plano de produção opera em sintonia com os pedidos das concessionárias e as motos são colocadas em racks retornáveis. Na cabotagem, as motos seguem para os portos de Fortaleza (CE), Recife (PE) e Salvador (BA). Os componentes também vão pela mesma rota, com exceção das fitas adesivas, que desembarcam via aérea no Aeroporto Eduardo Gomes, em Manaus, o terceiro maior em movimentação de cargas, atrás apenas de Guarulhos e Viracopos, ambos em São Paulo.

No caso de perecíveis, o transporte exige acondicionamento especial. “As bebidas não podem ser expostas ao sol no transporte e na armazenagem”, afirma Renata Andrade, diretora regional da Solar Coca-Cola, responsável pela produção e entrega na Amazônia. A estrutura é robusta – quatro fábricas, seis centros de distribuição e frota de 320 caminhões –, mas as operações fluviais em municípios menores são feitas por meio de barcos mistos de cargas e passageiros. “As estratégias são pensadas conforme a vazão dos rios. O abastecimento de insumos entre São Paulo e Manaus demora até 28 dias por cabotagem”, afirma. No ano passado, a região consumiu 103 milhões de caixas de bebidas, o equivalente a 584,8 milhões de litros.

Presente em 62 cidades do Amazonas, a M. Dias Branco (dona de marcas como Adria e Piraquê) tem um calendário de distribuição conforme a estação. “Um atraso pode representar um desabastecimento na região, principalmente na estiagem. A maior preocupação é com margarinas e achocolatados, que necessitam de contêineres refrigerados”, relata Leonardo Pires do Prado, diretor-executivo de logística da empresa.

As peculiaridades da região podem transformar o o processo de transporte em uma operação complexa, como embarcar e desembarcar ovos de Páscoa em um trajeto de balsa com duração de 14 dias entre Belém (PA) e Manaus (AM), com paradas em Santarém (PA) e Parintins (AM). Segundo informações da transportadora JSL, os ovos necessitam estar acondicionados em ambientes entre 15°C e 20°C. Se estiverem abaixo dessa temperatura, ficam com a coloração esbranquiçada; acima, correm risco de deformação. Devem ser transportados em separado para não sofrerem contaminação de odor nem alteração na embalagem de alumínio. Ao desembarcarem, só podem ser descarregados em lojas com o ar-condicionado em perfeitas condições.

Fundada em 1942 em Manaus e hoje com 34 lojas físicas, 42 farmácias e cinco centros de distribuição em quatro Estados, a rede varejista Bemol define-se como “100% amazonense”, ao ponto de desenvolver uma estratégia batizada como “e-commerce caboclo”, segundo Marcelo Forma, CFO e diretor comercial da empresa. “Temos 3,8 milhões de cadastros, sendo um terço no interior”, afirma. A expansão começou durante a pandemia, em Autazes, cidade com 38 mil habitantes, a 100 km de Manaus. “É perto, mas o acesso demora um dia. Instalamos rede de wi-fi para pedidos via aplicativo e montamos uma logística de entrega em uma semana com os mesmos preços de Manaus.”

O modelo deu certo e a Bemol firmou parceria com 44 barcos para atender 60 municípios, chegando a extremos, como Benjamin Constant, a 1.100 km da capital, na fronteira com a Colômbia, e Barcelos, na margem direita do rio Negro, na direção à Venezuela. “O trajeto até Benjamin Constant demora 18 dias. Em Barcelos, as mercadorias ainda seguem de canoa para comunidades ribeirinhas”, diz Forma. Em Manaus, os problemas com a vazante foram resolvidos com a compra de um barco específico para transbordo dos produtos aos barcos parceiros. “Imagine como era levar uma geladeira ou uma mesa manualmente do porto ao barco.” Os próximos passos incluem entregas por drone em pontos até uma hora de Manaus e apoio a um projeto do Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA) no desenvolvimento de uma aeronave, que voe a cinco metros da lâmina do rio, com capacidade para transportar uma tonelada.

Especializada no transporte rodofluvial de cargas secas e grãos, a Transportes Bertolini desenvolveu um modelo inédito de uma fábrica flutuante de processamento de açaí, que se desloca até as regiões produtoras. A balsa-fábrica tem 2,2 mil m2 e é capaz de armazenar 400 toneladas de polpa congelada em câmaras frigoríficas. “O açaí é um fruto que se deteriora em menos de 48 horas, o que ocasionava perdas aos produtores. Já fizemos três deslocamentos, o mais distante até a região de Carauari, no rio Juruá, a cinco dias de Manaus”, afirma Fabio Gobeth, assistente da diretoria da transportadora. Hoje, o açaí é vendido para indústrias do Centro-Oeste e do Sudeste, mas o objetivo é exportar a polpa.

No caso do transporte graneleiro voltado para exportação, a infraestrutura é mais avançada com os portos do Arco Norte, como Itacoatiara (AM), Santana (AP), Itaqui (MA), Miritituba (PA) e Vila do Conde (PA). Em Miritituba, a Bertolini implantou um modelo pioneiro de transbordo no qual o caminhão carregado é pesado dentro da balsa em cima do rio, o que dispensa o armazenamento dos grãos em silos, gerando mais rapidez.

Mas, no caso do transporte de cargas secas, investimentos poderiam trazer alternativas. “Uma opção viável seria por meio de Miritituba, em Itaituba, e depois pela BR-163, passando pelo Centro-Oeste e de lá para outras regiões. Precisaria haver uma estrutura eficiente de transbordo em Miritituba, como já ocorre com grãos, e obras constantes de manutenção na rodovia”, afirma Olivier Girard, sócio da Macroinfra Consultores.

Já há dados que apontam para essa solução. Segundo estudo da Bertolini, em um hipotético trajeto de Manaus a Guarulhos (SP), a carga que optasse por Itaituba percorreria 4.042 km em oito dias com a BR-163 em boas condições; hoje, a mercadoria que sai da capital amazonense segue de balsa até Belém e desce pela BR-153, em um total de 4.572 km, consumindo dez dias de viagem.

Outra ação urgente, diz Augusto Cesar Rocha, coordenador da comissão de logística do Centro da Indústria do Estado do Amazonas (Cieam), seria a recuperação dos 885 km da rodovia BR-319 (Manaus-Porto Velho), que permitiria o percurso até o Estado de São Paulo pela BR-364 em sete dias, com 3.870 km. Inaugurada na década de 1970, a BR-319 encontra-se intransitável por falta de manutenção e não há programas previstos para obras nos próximos anos, diz Rocha.

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