Reflexões sobre a jornada: 10 anos em 2 horas

Antes de sair de férias, tive mais uma destas missões desafiadoras, típicas destes tempos de pandemia. A C&A irá iniciar uma reforma no escritório e aproveitamos este momento para retirar nossas coisas de lá, já que agora, a Laudes Foundation terá seu próprio escritório em São Paulo.

Minha missão impossível era, em 2 horas, esvaziar os armários com as minhas coisas e ajudar a triar o que gostaríamos de guardar dos materiais institucionais.

A sensação de estar deixando aquele prédio que frequentei diariamente pelos últimos 10 anos no meio de uma quarentena, com máscara e todo protocolo de higiene, me causou certa estranheza. Em condições normais, teríamos algumas cerimônias de despedida, começando com café da manhã, seguido de almoço e happy hour. Aliás, eram exatamente estes os nossos planos, já que nossa saída estava programada para dia 23 de março, 10 dias antes de iniciarmos a quarentena. Mas, diante da situação, decidi extrair algo positivo daquela experiência.

Ao me concentrar na minha missão, mergulhei em uma verdadeira viagem no tempo. A cada gaveta ou armário que eu abria, livros, documentos e objetos me lembravam cada passo da minha jornada no grupo, que começou em 2010 na C&A, passando para o Instituto C&A em 2015 e, mais recentemente, ao final de 2019, a mudança para Laudes Foundation.

Cópias de checklists de auditoria me lembraram da época em que entrei na empresa, em 2010, e desenhava, junto com meu time de auditoria, a forma como monitoraríamos os fornecedores e subcontratados da cadeia de fornecimento da C&A, com as atualizações do código de conduta global. Um processo que exigia, mais do que ferramentas, a conscientização e capacitação dos fornecedores e o trabalho conjunto com a área comercial. Este processo era reforçado pelo Programa de Certificação da ABVTEX, uma iniciativa do setor para boas práticas na cadeia de fornecimento. Nas minhas pastas, encontrei rascunhos do regulamento do programa, que redigimos a algumas mãos entre as empresas varejistas pioneiras no programa. Hoje, a iniciativa se fortaleceu e já certificou mais de 3.700 empresas no Brasil, com a participação de 26 marcas varejistas.

Uma pastinha específica me levou de volta a 2012, na ocasião da adesão da C&A ao Pacto pela Erradicação do Trabalho Escravo - um esforço lindo da empresa em parceria com 40 de seus fornecedores. Um passo importante para o varejo têxtil de moda, que hoje trabalha em conjunto em busca de condições justas de trabalho em sua cadeia de valor. Muito orgulho ver o quanto o trabalho do InPacto evoluiu nos últimos anos, com mais e mais empresas aderindo a esta causa. Fico feliz de podermos seguir apoiando o InPacto institucionalmente por meio da Laudes Foundation Brasil.

Me deparei também com apresentações da época em que liderei, junto com meu time, a construção da primeira plataforma de sustentabilidade da C&A Brasil, com metas claras para o uso de matérias-primas sustentáveis, economia circular e conformidade da cadeia de fornecimento, construídas com apoio de várias áreas da empresa. A plataforma evoluiu e se integrou à estratégia e às metas globais, onde mirávamos justamente em 2020! E, hoje, dá orgulho ver o quanto a empresa avançou e como foi importante traçar este caminho lá atrás.

E, finalmente, uma imensidão de materiais dos meus últimos 5 anos do Instituto C&A, ao qual me juntei em 2015 para fazer a transição de agenda de educação para a moda, atuando de forma global. Dezenas de publicações riquíssimas do legado em Educação até documentos sobre o nosso processo de transição, feito com respeito aos parceiros e à equipe. Entre as memórias, encontrei o menu do jantar que oferecemos ao time global da C&A Foundation em 2018, em nosso offsite global realizado em Florianópolis, em que apresentamos, de forma leve e lúdica o que tinha sido este “jeito de fazer” do Instituto C&A, que era a essência de todo o trabalho.

Viajei por fotos e materiais da construção do posicionamento institucional para a atuação na cadeia da moda, um processo intenso que atravessei nos últimos anos de mãos dadas com o time de comunicação e que segue sendo relevante com esta nossa nova transição institucional para Laudes Foundation. 

Os materiais de projetos que apoiamos também estavam lá, me fazendo lembrar das viagens para visitar projetos lindos de algodão orgânico no Brasil e na Índia. Um programa que reacendeu o interesse e a importância do algodão orgânico em nosso Nordeste, como forma de fortalecer a agricultura familiar. Revivi também as conquistas de nosso Programa de Direitos e Trabalho, como o avanço na direção de maior transparência na cadeia da moda e a parceria com o Fashion Revolution. Me recordei dos muitos projetos e eventos que apoiamos para fomentar o debate e a implementação da economia circular na moda no Brasil. Tudo isto me fez lembrar de que são eles, nossos parceiros, que conhecem de fato a realidade e que precisam estar fortalecidos para responder a tantos desafios.

Uma foto da equipe completa do Laboratório Sustentável da Moda na minha parede simbolizava a importância desta iniciativa, liderada pela Reos, e que continua a mobilizar mais de 50 lideranças no Brasil para pensar soluções para a sustentabilidade neste setor tão importante.

No meio disto tudo, objetos e lembranças de momentos corriqueiros do nosso dia a dia, como um tapete de tecido que confeccionamos juntos em uma atividade de construção de time, caixinhas de mimo do programa voluntariado e artesanatos de comunidades que apoiamos em São Paulo, Barueri, Carapicuíba, Jequitinhonha, Amazônia... 

Já sem a máscara, no carro e com minhas caixas no porta-malas, tentei me conectar com tudo aquilo. Uma viagem de 10 anos, em 2 horas. Uma mistura de saudades, orgulho e realização – tudo junto. E a certeza de que o aprendizado foi (e está sendo) infinito.

Inaugura-se, agora, uma nova fase e o time terá sua nova casa, que certamente trará outras belas histórias. Momentos de mudança são oportunidades de reflexão. De olhar para trás e poder se orgulhar da jornada, com seus acertos e erros, parcerias e aprendizados.

Reflections on the journey: 10 years in 2 hours

Just before my vacations, I had one of these challenging missions, typical of these pandemic times. C&A will begin a renovation of the building and we took this opportunity to collect our items from there, as now Laudes Foundation will have its own office in São Paulo.

My impossible mission was, in 2 hours, to empty my cabinets and drawers and help to sort out what we would like to keep from the institutional materials.

The feeling of leaving the building I have been going to every day for the last 10 years in the middle of a quarantine, with a face mask and all hygiene protocols, was quite odd. Under normal conditions, we would have some farewell rituals, starting with breakfast, followed by lunch and happy hour. In fact, these were exactly our plans, since our move was scheduled for March 23rd, just 10 days before the quarantine began. However, in face of the situation, I realized I needed to adapt and extract something positive from that experience.

As I focused on my mission, I immersed myself in a real journey through time. Books, documents and objects reminded me of every step of my career in the group, which began in 2010 at C&A, moving to Instituto C&A in 2015 and, more recently, in the end of 2019, to Laudes Foundation.

Copies of audit check-lists reminded me of the time I started, back in 2010, developing, along with my audit team, a plan to monitor suppliers and subcontractors in the C&A supply chain, as we had to consider new aspects of the global code of conduct. A process that required, not only tools, but also awareness and preparation of the suppliers and a strong partnership with the commercial team. This process was reinforced by the ABVTEX Certification Program, an industry initiative towards good practices in the supply chains of the main textile retailers in Brazil. In my folders, I found drafts of the first ABVTEX Program guidelines, which we wrote collectively, as a group of the pioneer retail companies in the program. Today, the initiative has been strengthened, with more than 3,700 certified companies in Brazil and the participation of 26 retail brands.

A specific paper folder took me back to 2012, when C&A joined the National Pact for the Eradication of Slave Labor - a beautiful effort of the company with 40 of its suppliers. An important step for the fashion retailers, which now work together for fairer working conditions in their value chains. I am very happy to see how much the work of InPacto has evolved in recent years, with more and more companies adhering to this cause. I am happy that we are still able to offer institutional support to InPacto through Laudes Foundation Brazil.

I came across presentations from the time I led the development of the first sustainability framework for C&A Brazil, with clear and ambitious goals, built with the support of various teams of the company. The framework has evolved and then integrated to the global strategy and goals, where we aimed precisely at 2020! And today, it's great to see how far the company has come and how important it was to have this plan back there.

And finally, a multitude of materials from the last 5 years of Instituto C&A, which I joined in 2015 to lead the transition from the education in Brazil to the global fashion sustainability agenda. Dozens of rich publications of the legacy in Education to documents about our transition process, built with respect to the partners and the team. Amongst the memories, I found the dinner menu we offered to the global team of the C&A Foundation back in 2018, in our global offsite held in Florianopolis, in which we presented, in a light and playful way, what had been this "way of doing" of Instituto C&A, which was the essence of all the work.

I travelled through photos and contents of the development of the institutional positioning of Instituto C&A, an intense process that I went through in recent years hand in hand with the communication team, and that continues to be relevant with our new institutional transition to Laudes Foundation. 

Materials from the initiatives we supported were also there, reminding me of trips to visit beautiful organic cotton projects in Brazil and India. A program that revived the interest and importance of organic cotton in the Northeast of Brazil. I revisited many of our achievements in the Labor Rights Program, like the advancement of the transparency agenda in the fashion industry, in partnership with Fashion Revolution Brazil. I remembered projects and convenings that we supported to foster the national debate and implementation of circular economy principles in fashion. All this reminded me about the important role of our partners. They are the ones who really know the reality and who need to be strengthened to respond to so many challenges.

A photo of the complete team of the Sustainable Fashion Lab on my wall symbolized the importance of this initiative, in partnership with Reos, which continues to mobilize more than 50 leaders in Brazil to think systemically about solutions for this very important sector.

Among all of this, objects and memories of our daily life, such as a carpet of fabric that we made together in a team building activity, gifts from the volunteer program and handicraft from communities that we supported in Sao Paulo, Barueri, Carapicuíba, the Amazon region, Jequitinhonha...

Back to the car, without the face mask, and with my few boxes in the trunk, I tried to connect with all that. A 10-year journey in two hours. A mixture of feelings – pride, fulfillment and missing those moments – all together. And the certainty that learning has been infinite.

Now, a new phase is inaugurated, and the team will have its new home, which will certainly bring other beautiful stories. Moments of change are opportunities for reflection. To look back and be proud of the journey, with its successes, failures, partnerships and lessons learnt.