Segredos do crime
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Segredos do crime

Histórias policiais, investigações e bastidores dos crimes

Informações da coluna

Vera Araújo

Jornalista investigativa há 30 anos e autora de "Mataram Marielle" e "O Plano Flordelis: Bíblia, Filhos e Sangue". Passou por "Jornal do Brasil" e "O Dia"

RESUMO

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GERADO EM: 21/06/2024 - 06:00

Conexão perigosa: miliciano, deputada e contador

Dom era o elo entre o miliciano Zinho e a deputada Lucinha, atuando como contador da milícia. Diálogos revelam pedidos de ajuda da parlamentar para liberar membros do grupo criminoso. Lucinha é acusada de interferir em favor da organização criminosa, mantendo intenso relacionamento com Dom.

Braço-direito de Luiz Antônio da Silva Braga, o Zinho, Domício Barbosa de Souza, conhecido como Dom, era o elo entre o chefe da milícia da Zona Oeste e a deputada Lucia Helena Pinto de Barros, a Lucinha (PSD). A denúncia do procurador-geral de Justiça Luciano Mattos detalha os encontros da parlamentar com o miliciano Dom que, segundo fontes da polícia, foi morto pelo próprio Zinho.

Nesta quinta-feira, o Conselho de Ética da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj) decidiu arquivar o processo por quebra de decoro parlamentar contra Lucinha, apesar das graves acusações e evidências apresentadas pelo procurador-geral de Justiça. No documento, há diálogos entre o miliciano e a parlamentar, com pedidos que vão desde a intervenção dela para a soltura de integrantes do bando de Zinho a dicas de como receber o prefeito Eduardo Paes durante uma visita na Zona Oeste.

Domício Barbosa de Souza era uma figura de destaque na hierarquia da milícia, um dos principais responsáveis pela administração dos recursos financeiros do grupo. Além de Dom, também era chamado de "professor" e "Toreto". Ele foi denunciado nos autos da Operação Dinastia I, deflagrada de 25 de agosto de 2022, em decorrência das atividades da milícia de Zinho. Segundo a denúncia, Dom foi identificado não só pelas fotografias, mas também porque a deputada Lucinha compartilhou informações sobre sua agenda parlamentar com ele, permitindo que esses dados fossem confrontados com fontes abertas, principalmente nas redes sociais. No celular de Dom, Lucinha era identificada como "madrinha".

Uma perícia de voz realizada nos áudios existentes na nuvem da conta usada por Dom (browncontas007@icloud.com), comparada com vídeos obtidos na Operação Dinastia I, confirmou sua alta posição e ascensão na organização criminosa, como contador.

Os áudios revelaram que o administrador financeiro da milícia de Zinho mantinha contato direto e regular com a deputada Lucinha. Em uma mensagem de texto enviada à parlamentar às 13h18 do dia 6 de novembro de 2021, Dom informa que "teria havido uma operação" e que "os meninos" haviam sido levados para o 24º Batalhão de Polícia Militar (Queimados). Na conversa, ele pede ajuda para liberar os supostos integrantes da organização criminosa: "Ver se consegue falar com alguém aí levaram os meninos. Lá pro 24".

Seis minutos após a mensagem de Dom, Lucinha retorna por ligação de Whats App, cuja interceptação ou armazenamento, o que, segundo a denúncia, demonstra "cautela no trato dos diálogos mais sensíveis travados com Domício". Na sequência, Dom envia mensagem referindo-se ao "1º sargento Turquês", e informa um número de telefone. "Madrinha" diz que falou com o comandante do Recom (Batalhão de Rondas Especiais e Controle das Multidões da Polícia Militar), tenente-coronel Silvio, que teria lhe informado que um sargento e um tenente estariam encaminhando, "sem presos", mas com apreensão de armas e fardamento.

Para o MPRJ, os diálogos, o dia seguinte ao pedido, confirmaram que a "interferência foi exitosa". Lucinha fez novo contato com o miliciano, conforme a denúncia, e diz que "fez sua parte" e que "agora quebraria o telefone". Ela pede que Dom apague as mensagens.

De acordo com o documento, o tenente-coronel Silvio Luiz da Silva Pekly, então comandante do Recom, admitiu ter recebido uma ligação da deputada Lucinha para obter informações sobre a prisão, mas não se recordava se havia falado com a própria parlamentar ou em nome dela. Silvio também acrescentou que não era comum receber ligações de parlamentares com essa finalidade, tendo sido esta a primeira vez que ocorreu.

Em um dos trechos da denúncia, o MPRJ conclui o forte vínculo de Lucinha com Dom:

"Desta forma, reputa-se comprovada a existência de intenso e estreito relacionamento entre as denunciadas e os integrantes do 'núcleo operacional' da ORCRIM, em especial entre a denunciada deputada Lucinha Domicio Barbosa, para tratar de interesses afetos à associação criminosa constituída no formato de milícia autodenominada 'Bonde do Zinho', 'Família Braga', 'Tropa do Z' ou 'Bonde do Zorro', de que as denunciadas figuram como integrantes, e em favor da qual a parlamentar denunciada atuou diversas vezes de forma combativa, seja em benefício dos interesses econômicos e políticos da súcia, seja para proteger a hegemonia que o grupo exerce na localidade através do emprego de violência e grave ameaça exercidas com farto e poderoso arsenal bélico, e continua sem ser importunada pelas autoridades, e nem mesmo pelos grupos rivais".

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