Proposta que pode ampliar jornada de tripulantes em voos opõe trabalhadores e companhias aéreas

Anac estuda aumentar limite de trabalho de tripulação de 12 para 14 horas em rotas domésticas e 17 horas em internacionais

Por — Brasília


Anac estuda aumentar limite de trabalho de tripulação de 12 para 14 horas em rotas domésticas e 17 horas em internacionais Unsplash

RESUMO

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GERADO EM: 27/06/2024 - 04:00

Anac propõe ampliação da jornada de tripulantes

A proposta da Anac de ampliar a jornada de tripulantes em voos gera divergências entre trabalhadores e companhias aéreas. Sindicalistas temem pela segurança de voo, enquanto empresas defendem alinhamento com práticas internacionais para estimular competitividade do setor. A medida visa equiparar as normas brasileiras às de outros países, permitindo voos mais longos e gerando mais oportunidades de emprego. A proposta está em consulta pública e deve ser aprovada até o final do ano.

Um aumento dos limites de jornada de trabalho de tripulantes, pilotos e comissários que está em análise pela Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) coloca em campos opostos trabalhadores e companhias aéreas.

As empresas defendem a revisão proposta pelo órgão regulador sob o argumento de que a medida é importante para alinhas o país às práticas internacionais e estimular a competitividade do transporte aéreo no país, mas sindicatos da categoria resistem. Alegam que a segurança de voo pode ser afetada caso a carga de trabalho desses profissionais aumente.

Atualmente, a jornada máxima nos voos domésticos e internacionais de curta distância é de 12 horas, podendo chegar a 13 horas em acordos com sindicatos. A Anac propõe ampliar esse limite para 14 horas. Nos voos internacionais, o limite hoje pode chegar a 16 horas e meia, e o órgão regulador prevê acrescentar mais 30 minutos, chegando a 17.

Pela lei atual, a cada jornada de 12 horas no mercado doméstico, os tripulantes precisam descansar por igual período e o dobro do tempo que exceder as 12 horas.

O texto da proposta, contudo, não altera a jornada máxima mensal da categoria, de 176 horas, e os dez dias de folga por mês que eles têm direito, conforme prevê a legislação.

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— Para qualquer trabalhador, jornadas de doze horas são consideradas cansativas, algo que já acontece na aviação com certa naturalidade — disse Henrique Hacklaender, diretor presidente do Sindicato Nacional dos Aeronautas (SNA).

A entidade pretende mobilizar caravanas de trabalhadores em direção a Brasília para protestar contra a proposta, que será tema de uma audiência pública promovida pela Anac na sexta-feira. Uma consulta pública aberta pelo órgão para discutir o texto ficará aberta até agosto. Na contramão, entre as medidas defendidas pelos profissionais da aviação está o aumento no período de descanso entre jornadas.

Uma das justificativas da Anac, apoiada pelas empresas, para revisar o regulamento é que as normas brasileiras estão entre as mais rígidas do mundo, o que impede as companhias nacionais de voarem para destinos mais longos como Dubai (Emirados Árabes Unidos), Doha (Catar) e Melbourne (Austrália), por exemplo. São trajetos que podem durar mais de 17 horas.

Compare os limites de jornada de trabalho de tripulantes no Brasil com os de outros países

  • Brasil: até 16,5 horas (no caso de voos internacionais e tripulação com quatro pilotos)
  • União Europeia: até 13 horas
  • Estados Unidos: até 17 horas
  • Canadá: até 24 horas
  • Argentina: até 24 horas
  • Chile: até 20 horas ou 34 horas em sete dias consecutivos

Para chegar a esses destinos mais distantes, as áreas nacionais teriam de fazer múltiplas paradas pelo caminho para trocar a tripulação e não descumprir a legislação brasileira do setor, o que inviabilizaria a operação, argumentam técnicos da Anac. Eles avaliam que a mudança pode gerar mais oportunidades de emprego para tripulantes brasileiros, além de acabar com o que consideram distorções no mercado.

Um dos exemplos citados por um técnico do órgão é o caso da Latam, que hoje leva passageiros brasileiros para o Chile para, de lá, voarem até a Austrália pela rota do Pacífico com uma tripulação toda chilena.

A proposta do órgão regulador cita ainda um relatório da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) que aponta grande diferenciação das normas brasileiras para tripulantes em relação as regras vigentes em outros países para voos comerciais. A ideia seria equiparar as normas brasileiras às vigentes nos Estados Unidos, onde a carga horária dos tripulantes pode chegar a 17 horas.

Em outros países da América do Sul, segundo o levantamento da agência, o limite é ainda maior: 20 horas no Chile e 22 na Argentina, por exemplo. Mas, nos países da União Europeia, esse limite é mais baixo: 13 horas.

O plano da Anac é aprovar a resolução definitiva no fim deste ano para entrar em vigor em meados de 2025. “Por mais que a regulação autorize, a concretização de jornadas maiores dependerá de negociações e contrapartidas que tendem a ser mais eficientes quando acordadas diretamente entre as partes envolvidas”, afirma a Anac, em nota.

A Associação Brasileira das Empresas Aéreas (Abear) apoia a proposta da Anac. Em um comunicado, avalia que a medida alinha as normas brasileiras às "melhores práticas internacionais reconhecidas e consagradas". A entidade destaca ainda que as companhias já adotam gerenciamento rigoroso de fadiga dos tripulantes.

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O especialista em Direito Aeronáutico, André Dias, avalia que a iniciativa da Anac de aproximar as regras brasileiras para tripulantes das praticadas em outros países é positiva. Ele alerta, contudo, que o aumento da jornada não pode representar risco à segurança de voo e nem resultar em precarização das profissões.

— São necessárias medidas que possibilitem o repouso digno da tripulação entre uma jornada e outra de trabalho. Um dos pontos a ser discutido é o começo da jornada de trabalho do tripulante nos voos domésticos. O tempo de deslocamento pode variar entre 45 minutos a duas horas dependendo da localização do aeroporto — afirmou.

Segundo ele, o ideal é que a jornada comece na apresentação no hotel e que o horário de repouso comece a partir da chegada de volta ao alojamento no destino, após o fim do voo.

— São necessárias medidas que possibilitem o repouso digno da tripulação entre uma jornada e outra de trabalho. Um dos pontos a ser discutido é o começo da jornada de trabalho do tripulante nos voos domésticos. O tempo de deslocamento pode variar entre 45 minutos a duas horas dependendo da localização do aeroporto — afirmou.

Segundo ele, o ideal é que a jornada comece na apresentação no hotel e que o horário de repouso comece a partir da chegada ao hotel.

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