A mesma euforia despesista que o Frederico Francisco revelou na coordenação do Plano Ferroviário Nacional reaparece agora neste seu artigo.
É muito fácil ser despesista com o dinheiro dos outros, sobretudo quando os outros são os contribuintes.
Diz agora o ex-Secretário de Estado que a CP precisa de pelo menos “18 comboios (mais reservas) para uma oferta de cerca de 24.000 lugares por dia”.
A justificação para este número parece ser a previsão realizada pela TIS para a Infraestruturas de Portugal, que aponta para uma procura de 28.000 passageiros por dia no eixo Lisboa – Porto.
Se todo o dimensionamento apresentado pelo Frederico assenta apenas neste número, há pelo menos duas circunstâncias a ter em conta que aconselham alguma prudência:
A primeira é que este foi um estudo encomendado pela IP para demonstrar a viabilidade do projecto da alta velocidade (AV). Sabemos bem do voluntarismo com que se fazem estas previsões quando o objectivo vital é alcançar a Taxa de Rentabilidade Interna mínima necessária para garantir os financiamentos comunitários.
A segunda é que a consultora que realizou este estudo foi a mesma que fez as previsões de procura para o novo aeroporto de Lisboa. Sim, aquela que diz que a procura em Alcochete pode chegar aos 140 milhões de passageiros/ano, um valor 4 vezes superior ao registado hoje na Portela.
Assim, um operador que decida aventurar-se na AV portuguesa, seja privado ou público, não pode confiar nos estudos da IP para desenvolver os seus planos de negócio, até porque muitos dos seus pressupostos iniciais já não são válidos. Um exemplo flagrante é o Passe Ferroviário Verde (PFV), cuja validade se estende agora aos serviços intercidades. Qual é o operador privado que vai investir centenas de milhões de euros em comboios novos para competir com os serviços Intercidades da CP ao preço da chuva?
Se não houver operadores privados, também não haverá concorrência, logo, a CP não terá incentivo para funcionar em modo low-cost, logo, não haverá preços baixos, logo, a procura não será tão alta como se espera, o que deita por terra o dimensionamento do Frederico. Em regime de monopólio, e com grande parte do mercado canibalizado pelo PFV, a CP vai maximizar os seus lucros transformando a AV num produto de luxo para os poucos que o podem pagar. Como faz o Eurostar e como fez a Renfe durante muitos anos: poucos comboios e caros.
Outro aspecto omitido no artigo é o destino a dar aos pendulares, que foram recentemente remodelados. Vão todos para o lixo em 2030? A CP não pode utilizá-los durante os primeiros anos de funcionamento do sistema para cobrir uma parte da procura estimada neste corredor?
Alguém acredita que a CP possa precisar de 30 comboios (20 de alta velocidade mais 10 pendulares) para servir a AV Lisboa – Porto com uma frequência igual à da Linha de Sintra, como se estivéssemos entre Tóquio e Osaka?
E diz o Frederico que ainda sobra mercado para os privados.
Só se for para vender chocolates a bordo.
Técnico de Catenaria
1 mÓtimo, é uma boa opção