459 ANOS ESCONDENDO AS RUGAS

Lá se vão 439 anos desde que o Rio de Janeiro foi fundado, ali bem entre o mar e a montanha. Talvez pela proximidade com o nosso cartão postal adotado, fomos nos acostumando a considerar características cariocas o sol, o mar, o calçadão que vai de Copacabana ao Leblon, os alegres rolês de bike nas margens da Lagoa Rodrigo de Freitas, as noites animadas no Baixo Gávea e no Leblon.

Só beleza. É o que mostramos e é, também, tudo o que queremos ver. O Rio de Janeiro foi reduzido a algumas dezenas de quarteirões, onde um povo bonito e sempre bronzeado desfila sua plástica invejável e lança modas que o restante do mundo vai copiar. Sim, é motivo de orgulho. E é por isso que olhamos o Rio por esta ótica, digamos, selecionada e restrita.

Mas e o restante da cidade? Aquela parte que seria até de mau gosto chamar de Maravilhosa? Com seus barracos amontoados, seus esgotos a céu aberto, lixo amontoado nas margens de rios e muitas outras mazelas? Existe, sabia? É tão Rio de Janeiro em Belfort Roxo como em Ipanema. Em Lote 15 como no Leblon. Em Caxias como na Gávea.

Mas, todo aniversário da cidade é comemorado à beira-mar. Com gente bonita e festiva, praticando seu altinho na beira da água, chupando picolé e comendo biscoito Globo. Fabricado, aliás, em um discreto prédio no centro da cidade.

Como será que é comemorado o aniversário do restante do Rio? O Rio que anda de trem, que acorda às 4 da manhã, que trabalha pesado ou que busca um emprego sem sucesso? O Rio que já foi parado várias vezes pela polícia para revista e que, quando escapa da dura, ainda corre o risco de perder o celular, parcelado em 12 vezes nas Casas Bahia, para um ladrão vizinho dele.

Onde se comemora o aniversário da Cidade Maravilhosa nos lados onde não tem nenhuma maravilha a mostrar? Ou, se tem, ninguém divulga, valoriza, destaca.

É a esse Rio, cheio de rugas, com vista para o valão e os emaranhados de fios, que faço aqui uma homenagem nesta data tão colorida e alegre, sempre festejada com vista eterna para o mar.

Seja feliz, Rio de Janeiro. Do jeito que você é. Com suas lindezas à mostra, mas assumindo suas rugas também.