#5 - A arte de enxergar nas entrelinhas.

Se você procurar a definição de "Número" no Google, encontrará algo semelhante a isso:

• quantidade, porção.
• representação gráfica de uma quantidade.
• soma de todas as unidades, dos elementos de uma série, conjunto etc.

Por outro lado, nunca acreditei que a minha relação com os números fosse pautada nesse simples conceito, porém jamais fui capaz de expressar esse vínculo com clareza. Até que encontrei esse trecho no livro "Moneyball - O Homem que Mudou o Jogo":

"Quando os números adquirem o valor da linguagem, adquirem o poder de fazer tudo o que a linguagem é capaz de fazer: tornam-se literatura, dramaturgia, poesia. [...] E não é apenas beisebol que esses números descrevem, como através de um espelho quebrado. É personalidade. É psicologia, é história, é poder, é graça, glória, estabilidade, sacrifício, coragem, é sucesso e fracasso, é frustração e falta de sorte, é ambição, é superação, é disciplina."

E este emaranhado de sentimentos está diretamente ligado aos esportes, ponto de ligação com o tema do livro. Escrito por Michael Lewis, a atenção do livro está voltada para a trajetória de Billy Beane, desde à época em que frequentava o ensino médio. Naquela época, Billy era considerado como o maior talento do país para uma carreira profissional de baseball. Ao final do 3º ano ele recebeu duas propostas tentadoras: Uma bolsa integral para a universidade de Stanford, como jogador principal dos times de Baseball e Futebol Americano; Integrar o time profissional New York Mets, como rebatedor no time de Baseball.

Essa decisão envolve 2 fatos curiosos:

1- Billy não tinha convicção de que queria se tornar um jogador profissional de Baseball;

2- Ninguém havia analisado que seu desempenho no esporte caiu consideravelmente durante o ensino médio.

Ele decidiu fechar o contrato e se tornar um atleta profissional. E o resto é história: Billy jamais chegou a se destacar nas ligas principais. Se transferiu de clube para clube, cada vez com menores perspectivas de sucesso, sendo eventualmente esquecido pelo público, e também pelos dirigentes dos clubes. Anos depois, ele viria a dizer que este foi o único episódio no qual tomou uma decisão baseada no dinheiro e que nunca mais deixaria o mercado ditar os rumos da sua vida. Além desse fator, o autor ressalta a falta aderência do recém atleta com a nova profissão, talvez pela falta de foco ou pelo excesso de confiança;

"Aqueles que os deuses querem destruir eles primeiro chamam de promissor."

Anos depois, Billy seguiu uma carreira administrativa ainda no Baseball, e se tornou o Gerente Geral do Oakland Athletics, uma franquia pequena e com poucos recursos financeiros. Considerando seu fracasso após ser considerado a maior joia no país, o novo GM começou a questionar veementemente os padrões de recrutamento praticados na Liga Profissional. Para isso, ele se juntou a Paul DePodesta, recém graduado em Economia pela Universidade de Harvard e entusiasta do esporte. O objetivo deles era simples:

Recrutar Jogadores para Ganhar Partidas

Esse pensamento pode parecer um tanto quanto óbvio, mas não esse não era o conceito nessa época. Nos mesmos moldes em que Billy foi avaliado, aspectos como a altura do jogador, condicionamento físico e potência na rebatida eram muito mais valorizados que a real capacidade do jogador de marcar pontos e ajudar a equipe a vencer. Segundo Paul, "Sabe o que me empolga em um jogador? Me empolgo quando ele tem alguma coisa que faz todo mundo deixá-lo de lado e eu sei que é algo que não tem a menor importância como jogador".

Dessa forma, Billy e Paul decidiram abandonar os vieses intrínsecos à cultura do esporte,e apelaram para modelos estatísticos que pudessem indicar a eles os melhores jogadores disponíveis do mercado. E graças aos tabus presentes no recrutamento tradicional, eles conseguiam contratar atletas fantásticos à preços inacreditáveis, visto que nenhum outro clube contava com eles para vestir seus uniformes.

E o resultado? Em 2002, a equipe ganhou 20 jogos consecutivos sendo este o novo recorde do esporte, e finalizando a temporada regular em 103-59 (Vitórias-Derrotas), se classificando em primeiro lugar da sua chave para os playoffs.

Gostaria de concluir, com duas reflexões que tive durante a leitura do livro:

1- No livro "Transformando Suor em Ouro" do Bernardinho, o autor conta que a sua passagem apagada como reserva da seleção brasileira foi fundamental para que ele se tornasse um técnico mais completo, pois foi assistindo seus colegas jogarem que ele começou a entender mais profundamente sobre as táticas do Vôlei e sobre a importância do trabalho em equipe. Essa filosofia, tem profunda relação com a história Billy Beane e podemos sintetizar com a frase icônica de Steve Jobs: "Você não consegue ligar os pontos olhando para frente, apenas olhando para trás. Então, você tem que acreditar que eles irão se conectar de alguma forma no futuro. Você tem que acreditar em alguma coisa - Seu instinto, destino, vida, karma, qualquer coisa. Essa abordagem nunca me deixou na mão, e fez toda a diferença na minha vida.

2- Em uma certa entrevista, escutei o fundador da chilli beans, Caito Maia, falar que inventar algo completamente novo tem se tornado cada vez uma missão mais difícil. Entretanto, para empreender basta melhorar algo que está sendo malfeito: Um processo, um produto ou serviço, não importa. Billy não inventou o baseball, mas com certeza mudou o jogo.

Para aqueles que se interessaram pela narrativa e querem conferir na íntegra, sugiro a leitura do livro: Contém detalhes mais técnicos sobre o esporte, estatística e negócios. Para aqueles que querem uma versão mais simplificada, mas tão incrível quanto, sugiro que assistam o filme. Deixo aqui o trailer:

Até a próxima!