6 Anos de Observador — O plano de intervenção nas pedreiras: da lupa ao drone
Imagem panorâmica de uma pedreira de mármore em Bencatel — Vera Novais/Observador

6 Anos de Observador — O plano de intervenção nas pedreiras: da lupa ao drone

A 19 de novembro de 2018, a estrada que fazia a ligação entre Borba e Vila Viçosa ruiu. A troca de acusações e o descarte de responsabilidade entre empresários, autarcas e os órgãos ligados ao Governo que deviam ter fiscalizado a situação, foi imediata. E a resposta dada pelo Governo à queda da estrada muito mais rápida do que eu poderia esperar.

Ao fim de pouco mais de dois meses, o Governo apresentava uma lista das pedreiras em situação de risco, aquilo que cada uma tinha de fazer para resolver o problema e o prazo para o fazerem: três anos para cumprir integralmente o Plano de Intervenção em Pedreiras em Situação Crítica.

As dúvidas surgiram logo na primeira leitura do documento. Seria possível que entre 1.426 pedreiras licenciadas pela administração central, só 191 estivessem em situação crítica? E o que queria dizer exatamente esta situação crítica se, independentemente do grau de intervenção (elevado, moderado ou baixo), todas as pedreiras teriam de resolver os problemas o quanto antes e no máximo em três anos? E já agora, porque é que havia pedreiras na lista sem qualquer indicação sobre a intervenção que deviam fazer? (Ah! O plano saiu tão rápido, que essas linhas estavam erradas.)

Quanto mais vezes lia o documento e mais perguntas fazia aos vários intervenientes, incluindo os proprietários e o Ministério do Ambiente, mais me apercebia de que havia coisas que não batiam certo. E afinal a resposta estava no próprio documento: “Com base na informação disponível e no conhecimento dos técnicos das entidades envolvidas”. Ou seja, os técnicos não foram ao terreno. A promessa era a de “apurar a situação real das pedreiras existentes em todo o território continental”, mas os técnicos agarraram na informação que tinham, fizeram uns questionários aos proprietários e prepararam uma amostragem com os dados de que dispunham. Verdade seja dita: em dois meses seria difícil fazer muito mais.

E que pedreiras é que faltam na lista? Por exemplo, todas as pedreiras ilegais, aquelas que nunca pediram licença e sobre as quais a Direção-Geral de Energia e Geologia não tem dados. Ou as centenas de pedreiras abandonadas e inativas, das quais só uma pequena parte está assinalada no documento do Governo. Ou ainda aquelas que outras entidades, como as câmaras municipais ou a Infraestruturas de Portugal, identificaram como uma potencial situação de risco, mas que estão completamente omissas no plano de intervenção.

O acidente de Borba agitou todas as entidades que tinham algum tipo de competência na área das pedreiras ou da sua envolvência. Os técnicos foram todos para o terreno e as pedreiras começaram a ser notificadas por mais do que uma entidade, com ordens e prazos que não batiam uns com os outros. E o Ministério do Ambiente ainda me respondeu que os proprietários tinham de cumprir ambas as ordens. Mas como, se são incompatíveis?

As falhas cometidas pelos exploradores das pedreiras — ou, pelo menos, a falta de sentido de prevenção de risco quando ainda não havia regras apertadas — são inegáveis. Mas o que me apercebi é que havia outros peões neste jogo. Os técnicos que foram permissivos com as falhas durante anos e que agora querem tudo resolvido em muito poucos meses. Ou a população que não se queixou quando o devia ter feito, muito por causa da importância que as pedreiras têm na oferta de emprego nestas localidades.

Foram vários meses a trabalhar nestas histórias, a tentar sacar respostas que ninguém parecia disposto a dar — nem da parte do Governo, nem da parte dos proprietários das pedreiras. Dezenas de emails, muitas horas ao telefone e centenas de quilómetros percorridos de norte a sul à procura das pedreiras da lista e de outras que não estavam assinaladas, mas deviam estar. O resultado foram dois longos textos (que espero que tenham paciência para ler) e vídeos de drone impressionantes. E como bónus ainda tive, depois da publicação destes textos, acesso a mais informação sobre a A1.

O trabalho não foi só meu. Diretamente envolvidos no projeto estiveram os repórteres de imagem — João Porfírio, Nuno Neves e Octávio Passos —, as editoras Sara Antunes de Oliveira e Catarina Santos, a Raquel Martins com os grafismos e o Luís Vaz Fernandes com a edição de vídeo. Depois, veio o prazer de poder falar deste trabalho na Rádio Observador.

Este foi sem dúvida o trabalho que me obrigou a mais pesquisa, contactos e que demorou mais tempo a concluir. Mas durante esses meses fui fazendo outras coisas, porque não conseguimos estar em exclusivo num artigo quando há tanta coisa a acontecer à nossa volta.

E é com este trabalho que termino um mês de partilhas que tinham como objetivo celebrar os meus seis anos no Observador e recordar alguns dos textos que escrevi ao longo deste tempo.

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