AMBIDESTRIA ORGANIZACIONAL - COMO CONCILIAR INICIATIVAS DISRUPTIVAS COM INICIATIVAS DE SUSTENTAÇÃO
Para permanecerem vivas nestes tempos atuais, as empresas já estabelecidas têm de promover 2 tipos de iniciativas de inovação de forma simultânea, já que devem manter seus mercados já conquistados e adicionalmente criar novos mercados e demandas. Estas iniciativas seriam:
Inovação disruptiva:
Objetiva criar produtos inovadores e desenvolver novos mercados. Um bom exemplo é a Apple que revolucionou o mercado consumidor de música com seu iPod e iTunes, formando o mercado de música digital que conhecemos hoje.
Inovação de sustentação:
Objetiva desenvolver os produtos já existentes através de melhorias incrementais visando atender as necessidades de seus consumidores atuais. Um bom exemplo é o mercado atual de smartphones.
O primeiro aqui é que, apesar do apelo atual para a inovação disruptiva, as empresas não devem cair na armadilha de deixar de lado seus mercados e consumidores já conquistados, pois são eles que geram lucro para a empresa e é este mesmo lucro que deverá ser utilizado para "bancar" as iniciativas de inovação disruptiva.
Mas, o que é inovação disruptiva? São inovações que introduzem novos benefícios ao mercado, como maior simplicidade e conveniência no uso, e também ao menor custo. Estas inovações colidem diretamente com os produtos e serviços existentes, pois a maioria das empresas não está preparada para enfrentar modelos de negócio diferentes dos que consolidou ao longo de décadas de sucesso. - Cezar Taurion.
O desafio de equilibrar as iniciativas de inovação e de sustentação em negócios já estabelecidos
Algumas das características comumente encontradas nas equipes de inovação é um certo nível de desorganização e caos. Parece que estas características são pré-requisitos para a geração de novas ideias. Já as equipes de sustentação têm como características a organização, a disciplina e o seguimento de procedimentos e rotinas rígidas baseadas nas "melhoras práticas". Este ordenamento seria necessário para a manutenção do negócio já estabelecido.
Não é difícil enxergar o potencial de conflito que pode existir entre estas duas equipes de comportamentos e filosofias tão diferentes. O grande desafio do líder ambidestro é conciliar estas equipes dentro do ambiente de trabalho visando capacitar a empresa a inovar e sustentar ao mesmo tempo.
Uma das maneiras mais utilizadas pelas empresas para conseguir este objetivo é a implementação de "células de inovação", que atuariam como uma organização paralela, com regras diferentes e onde é permitido experimentar e falhar. As inovações que fossem testadas e aprovadas nos testes de viabilidade e de mercado seriam posteriormente transferidas para a equipe de sustentação.
Segundo um estudo feito pela Harvard Business Review, as empresas que separam as iniciativas de inovação das de sustentação obtém 90% de sucesso em suas iniciativas de inovação. Porém, esta estratégia não é simples de ser implementada.
É necessário garantir que estas 2 áreas mantenham sua independência, com seus respectivos processos, estruturas e culturas. É importante impedir que a área de inovação disruptiva seja engolida pelo "business as usual" assim como garantir que a área de sustentação possa focar exclusivamente em melhorar a operação, os produtos atuais e o atendimento aos clientes. Ao mesmo tempo, a área de inovação disruptiva deve ter acesso a recursos importantes existentes na área de sustentação (financeiros, humanos, distribuição e a base de clientes).
Para resolver esta equação é necessária uma forte integração entre os executivos seniores destas 2 áreas. Eles devem ter experiência para gerenciar as necessidades e conflitos de áreas tão distintas. Ênfase no controle de custos e espírito empreendedor também devem ser características destes executivos. Caberia ao CEO eliminar resistências internas, divulgar uma visão clara e engajadora para todo o staff e criar programas de incentivo para o atingimento de metas que envolvam o crescimento das 2 áreas em conjunto.
As capacidades e competências adquiridas pela empresa em seus mercados tradicionais não necessariamente irão prover uma vantagem competitiva no novo mercado
Inovar é se comprometer com altos níveis de incerteza e risco já que novos produtos e serviços inicialmente são incipientes e com problemas de caráter técnico ou de processos. Inovar, em alguns casos, significa também criar novos mercados que terão regras de funcionamento e de competição diferentes dos mercados onde a empresa já atua.
Isto significa que as capacidades e competências adquiridas pela empresa em seus mercados tradicionais não necessariamente irão prover uma vantagem competitiva no novo mercado. A capacidade técnica e os conhecimentos necessários para produzir os produtos já estabelecidos podem ser irrelevantes para a produção e comercialização dos novos produtos disruptivos.
As decisões estratégicas e de competição para os novos produtos disruptivos baseadas no "conventional wisdom" dos produtos antigos provavelmente não terão sucesso. Competências antigas, que foram sucesso nos produtos antigos, podem não ser tão valiosas como se pensa. Na verdade, elas até podem impedir o avanço das iniciativas de inovação disruptiva dentro da empresa.
Um bom exemplo desta situação foi a guerra comercial travada entre as válvulas e os inovadores transistores. Este último foi responsável pela obsolescência de competências técnicas e destruição de empresas e mercados inteiros que giravam em torno da fabricação e comercialização de válvulas.
Apesar dos riscos, inovar é preciso, caso a empresa queira se manter viva e competitiva. É importante que a alta gestão da empresa esteja comprometida de forma entusiástica com a inovação, mesmo que signifique canibalizar alguns dos produtos/serviços já comercializados pela empresa.
A síndrome do sucesso e a inércia organizacional
Uma condição específica que atrapalha as iniciativas de inovação disruptiva dentro das empresas já estabelecidas é a chamada "síndrome do sucesso" ocasionada pelo sucesso obtido no passado na comercialização dos produtos já existentes. Por causa desta síndrome a empresa sente dificuldades e enfrenta resistências internas (inércia organizacional) na hora de abandonar seus produtos antigos devido ao sucesso dos mesmos no passado e aos investimentos já feitos, mesmo que as vendas estejam em declínio.
Um bom exemplo disto são os celulares Blackberry que resistiram em trocar seus teclados físicos por teclados virtuais na tela do celular e por causa disto perderam sua liderança no mercado.
A grande armadilha a ser evitada é que as decisões estratégicas referentes ao novo produto disruptivo não sejam afetadas pela preocupação com a obsolescência dos produtos atuais e nem pelos investimentos já efetuados nestes últimos.
Entrar cedo no novo mercado ou esperar que ele amadureça?
Como dito antes, produtos e serviços disruptivos criam novos mercados. As empresas devem enfrentar o dilema de entrar cedo neste novo mercado ou aguardar o novo mercado amadurecer. Entrar cedo em um novo mercado visa dominá-lo e obter liderança tecnológica, mas também significa assumir vários riscos como:
- Incerteza sobre a rapidez de crescimento do novo mercado;
- Apostar na tecnologia errada; lidar com dificuldades de uso de novas tecnologias;
- Dificuldade em prever quais serão as regras de competição neste novo mercado;
- Falta de previsibilidade sobre quais serão as ações dos competidores;
- Riscos de não alcançar sucesso comercial.
Entrar tarde em um novo mercado elimina todos os riscos acima, mas também pode significar:
- Perder a liderança deste novo mercado;
- Menor domínio das tecnologias utilizadas;
- Não ter produtos "Top of Mind" (primeiros a serem lembrados pelos clientes).
Na pior das hipóteses, a empresa pode até desaparecer por perder a oportunidade de ser competitiva neste novo mercado.
Existem também desafios internos a serem enfrentados pelas empresas. Novos negócios são frequentemente vistos como uma ameaça e/ou distração pelas áreas de negócios já estabelecidas, gerando o problema de inércia organizacional descrita anteriormente, além da dificuldade no compartilhamento de recursos entre os negócios já estabelecidos e os novos negócios.
Como implementar a ambidestria organizacional?
O que as empresas devem fazer para se tornarem ambidestras e conseguirem promover iniciativas de inovação e de sustentação de forma simultânea? 3 ações são necessárias:
1) Implementar "células de inovação disruptiva" totalmente independentes, com hierarquia e regras próprias e com permissão para experimentar e falhar. Estas células seriam unidades de negócios autônomas e responsáveis pelas iniciativas de inovação disruptiva. Isto as ajudará a escaparem da inércia organizacional comum em empresas com negócios já estabelecidos, além de permitir seu alinhamento com as necessidades de seu próprio mercado.
2) Garantir um forte suporte, comprometimento e espírito empreendedor do time de gerenciamento senior (leadership team) e do CEO. Isto irá garantir a integração entre as iniciativas de inovação disruptiva e de sustentação, gerenciamento de conflitos, impedir que as iniciativas de inovação disruptiva sejam enfraquecidas pelo "business as usual" da sustentação e permitir que a inovação disruptiva tenha acesso à recursos importantes existentes na sustentação (financeiros, humanos, distribuição e a base de clientes).
3) Divulgar uma visão clara deste novo caminho da empresa visando a criação de uma cultura organizacional que incentive e premie as iniciativas de inovação disruptiva.
Fatores de sucesso para implementar a ambidestria organizacional.
- Tenha uma área de R&D forte para refinar a tecnologia a ser utilizada no novo produto ou se aproxime de startups que estão inovando em seu segmento de mercado.
- Só entre em um novo mercado se tiver comprometimento com o novo produto e paciência para aguardar o crescimento do mercado.
- Crie "células de inovação disruptiva" independentes do resto da estrutura organizacional da empresa.
- Não permita que a inércia organizacional sufoque as iniciativas de inovação disruptiva.
- Monitore as iniciativas de inovação disruptiva de seus competidores.
- Reaja rápido em caso de ameaça aos negócios já estabelecidos de sua empresa.
- Monitore também competidores que atuam em outros mercados pois eles possuem competências e ideias não contaminadas pelo seu mercado e nem preocupações com a competição com seus próprios produtos.
- A liderança senior deve ser inconsistente na maneira como gerencia as iniciativas de inovação e os negócios já estabelecidos. Eles são diferentes e devem ser tratados diferentemente.
- A liderança senior deve dividir sua atenção igualitariamente entre inovação disruptiva e de sustentação. O tempo investido para entrar em novo mercado é tão importante quanto o tempo investido para operar no mercado já estabelecido.
Concluindo, o principal desafio é construir uma organização que, por um lado, possa competir em seu mercado já estabelecido, tendo o foco em eficiência de custos e inovação incremental dos produtos já existentes. Por outro lado, é necessário desenvolver novos produtos disruptivos e entrar em novos mercados de maneira eficaz e duradoura. Então, estas duas "mãos" estão tentando fazer duas coisas muito diferentes. É por isso que chamamos estas organizações de ambidestras.