Apagões e escassez hídrica: o novo normal em um país que não preserva suas florestas

Apagões e escassez hídrica: o novo normal em um país que não preserva suas florestas

O apagão de energia elétrica que afetou mais de dois milhões de pessoas e deixou cerca de cem mil residências sem luz por mais de quatro dias é um aperitivo bem indigesto das mudanças climáticas.

Ondas de calor intenso, estiagem prolongada e tempestades capazes de arrancar árvores, derrubar muros e destruir a fiação elétrica são e serão cada vez mais frequentes. E ocorrerão em intervalos cada vez mais curtos.

Há muito o que gestores municipais, palco de disputas eleitorais em 2024, podem fazer: fiscalização do trabalho das companhias do setor elétrico, serviço efetivo de podas de árvores, planos para enterrar a fiação, monitoramento de áreas de risco, etc.

Mas há fatores externos, distantes de nossas cidades, que impactam diretamente a vida cotidiana. E eles exigem pactos federativos e internacionais para acelerar mudanças na matriz energética.

O Brasil, neste sentido, larga em vantagem estratégica. É o único país do Planeta, afinal, que consegue produzir boa parte da sua eletricidade (60,2% da geração total em 2023) por meio de uma matriz limpa e renovável – mas finita e sob risco, de acordo com um estudo recente do projeto Amazônia 30 lançado pelo Climate Policy Initiative (CPI) da PUC Rio.

Intitulado “(Des) matando as hidrelétricas: a ameaça do desmatamento na Amazônia para a energia do Brasil”, o estudo é assinado pelos pesquisadores Gustavo R. S. Pinto, João Arbache, Luiza Antonaccio e Joana Chiavari.

A partir de dois estudos de casos – uma usina localizada entre Mato Grosso e o Pará e outras na Bacia do Paraná, no Mato Grosso do Sul – o relatório aponta que o desmatamento na Amazônia já afeta os níveis dos reservatórios hidrelétricos, reduzindo o potencial de geração de energia e produzindo prejuízo para o setor.

A explicação é a estiagem nos rios que correm os céus, os chamados rios voadores. São correntes de ar que partem da Amazônia, serpenteiam o leste da Cordilheira dos Andes e transportam umidade para boa parte do Brasil, garantindo a vazão dos rios, a irrigação das plantações e os níveis das hidrelétricas.

Quando as correntes passam por áreas desmatadas, elas perdem umidade e a força das chuvas no trajeto. Em outras palavras: a água não chega onde deveria chegar, muitas vezes a milhares de quilômetros da floresta tropical.

O estudo serve como um alerta para o setor público e também privado (este, se ainda não percebeu os efeitos do desmatamento nas narinas quando os rios voadores se tornam rios de fumaça e chegam às metrópoles do Sudeste, já começa a sentir no bolso o prejuízo, a começar pelo preço da energia).

Projetos de preservação nesses corredores por onde passam os rios voadores – inclusive as Terra Indígenas que há milhares de anos servem como cinturões para as correntes de umidade – são fundamentais para que a matriz energética seja preservada.

Enquanto a preocupação com as mudanças climáticas mira o futuro, parar a devastação da floresta é tarefa urgente: uma árvore queimada ou derrubada hoje já não contribuirá, via transpiração, com as correntes aéreas que deveriam inundar nossas plantações amanhã.

É um erro pensar que o excesso de chuvas observado nos últimos dias em São Paulo ou, mais especificamente, no Rio Grande do Sul entre maio e abril deste ano vão garantir o abastecimento pluvial.

O desmatamento é um dos fatores que eleva o calor e cria verdadeiras tampas de uma panela climática que impedem a dispersão das chuvas, que acabam concentradas em áreas restritas e castigadas pelas tempestades.

Como um médico atento à saúde do paciente, a ciência já deu literalmente o caminho das águas, o diagnóstico e a solução para a crise que se anuncia extrema: preservar, preservar, preservar.

É hora de dar ouvidos.

Paulo Pavan

Executivo de Inovação | Pesquisa | Sustentabilidade | Sci. Advisor | Membro Open Mind Brazil

3 m

A bem da verdade Alvaro Machado Dias qualquer árvore viva que se queima, não só deixa de sequestrar CO2, como devolve à atmosfera muito do que acumulou em sua existência. Em resumo, o efeito é potencializado.

Cuidar do #meioambiente é essencial para manutenção da espécie humana no planeta.

Profa Dra Nanci Maziero Trevisan

Professora Doutora e Mestre em Comunicação, Content Creator, Escritora, Empreendedora

3 m

Sempre pensamos em preservação ou desmatamento olhando os grandes latifundiários e as grandes empresas, como se fossem os vilões da história. Morando em área rural eu asseguro: apagões, escassez hídrica e incêndios são problema de gente comum, simples, eu e você, no dia a dia: quando faz fogueira para queimar resíduos na sua propriedade, quando desmata "só mais um pouquinho" para construir um chalé, que terá banheira de hidromassagem porque tem mais valor no AirBnb mas também disperdiça muito mais recursos hídricos, quando planta eucalipto no alto do morro ou próximo a nascentes, quando não há tratamento de água e nem esgoto em sua região, quando não descartamos o lixo corretamente e inúmeras ações cotidianas que contribuem com o país que não se interessa em preservar o que já existe.

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