Aquilo que me brilha os olhos
“Um ser inteligente traz consigo os meios necessários para superar-se a si mesmo.” Henri Bergson
Trabalho com desenvolvimento de pessoas em organizações desde 2007 e, bem cedo, no trilhar deste caminho, senti necessidade de ir a lugares mais profundos com as pessoas. Colaborar para processos de aprendizagem mais significativos, sustentáveis e capazes de irrigar a aridez que o dia a dia do mundo corporativo, por muitas vezes, nos impõe.
Partindo desta inquietação, comecei a buscar ferramentas, metodologias que me amparassem nesta contribuição com as pessoas e grupos com os quais trabalhava e ainda trabalho. Após algumas conversas e pesquisas, entendi que o coaching poderia ser uma boa saída para esta minha vontade.
Comecei uma busca por uma formação que pudesse, como uma promessa, atender aos meus anseios. Examinei diversos cursos e nesta minha exploração encontrei formações de todos os jeitos: mais curtas, mais longas, com turmas grandes e pequenas, boas e duvidosas, de vários preços e com muitas linhas metodológicas. Esta busca durou quase um ano e, por algumas vezes, hesitei em começar a jornada. A esta altura, não compreendia que a dúvida para o início vinha de não me sentir chamada, da falta de algo que me brilhasse os olhos.
Foi então que descobri o coaching ontológico. Uma querida cliente me disse que tinha acabado de concluir uma formação com esta metodologia. Ela me explicou o método dizendo, entre outras coisas, que o foco do coaching ontológico é o desenvolvimento do ser. Que a pergunta essencial é: quem você quer ser quando atingir a sua meta? Esta fala abriu meus ouvidos e o meu coração e tocou minha alma. Quem você quer ser me parecia muito mais atrativo do que: qual é a sua meta?
Ao ouvir este relato, entendi que o que não me chamava em outras formações, vinha exatamente deste lugar. Em tudo que havia buscado, a meta parecia maior que o ser, maior que o coachée. Obviamente, esta foi a minha interpretação. Quero ressaltar que respeito e legitimo outras metodologias e os profissionais que as praticam com entrega e seriedade. No entanto, o foco maior na meta que no ser, a meu ver, corrobora com o discurso corporativo vigente e drena ainda mais os potenciais dos profissionais já tão automatizados pelo dia a dia do trabalho e pela lógica mecanicista presente na maioria das organizações.
Decidi então começar ainda encarando o coaching ontológico como uma ferramenta. Hoje penso que esta minha busca por algo prático e estruturado apresentava-se apoiada no tanto que eu ainda estava doutrinada pela linguagem e modus operandi do universo organizacional.
Já no início da formação, fui percebendo que havia muito mais ali para explorar. A cada encontro, minha admiração pelo método crescia e, o que no início era só uma ferramenta, mostrou-se um profundo caminho de descoberta, de entendimento de mim mesma e do meu olhar para o mundo. Entendi que um coach se forma de dentro para fora e justamente por isso, o caminho seguro de uma meta definida, “dez passos mágicos” e uma porção de formulários no caminho não poderiam ser o que ia me brilhar os olhos.
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Ao contrário de tudo isso, o coaching ontológico mostrou-se muito menos confortável, sem receita e por vezes, para os iniciantes como eu, mais assustador. O lugar do mecânico, do cartesiano e do previsível é muito mais conveniente, embora ilusório. Tendo escolhido o contingente e o incerto e passado o susto inicial, o método revelou-se fascinante.
O primeiro ponto a me encantar foi poder encarar a linguagem como criadora de sentido e de novos mundos, como geradora do ser. O encantamento era legítimo, mas a prática ainda estava no campo etéreo. Durante os encontros, nas simulações de atendimentos e, posteriormente, no primeiro atendimento completo que fiz, aquilo que não tinha forma foi se tornando mais concreto e o método foi se mostrando muito poderoso e ao mesmo tempo muito possível.
Aos poucos fui aprendendo que algumas habilidades e posturas possibilitam e facilitam o espaço de criação de sentido na linguagem: aplicar a escuta profunda e livre de julgamentos (ah! que desafio!), postular perguntas do lugar do não-saber e conectadas à conversa, dançar com o vir a ser que emerge a cada sessão. Tudo isso me brilhava os olhos.
Muito importante dizer que o coaching ontológico também - destaque para o também – olha para a meta. Também apresenta uma estrutura com começo, meio e fim. A diferença é que a meta e a estrutura estão à serviço do ser e não o contrário. Neste sentido, exige do coach presença e planejamento. Veja, a palavra presença veio antes da palavra planejamento ainda que, no espaço-tempo, uma aconteça antes da outra. O que quero dizer é que, embora o coach planeje-se para a sessão e prepare também ferramentas e formulários adequados ao processo do coachée, a conversa que se desenvolve e que emerge do encontro coach-coachée é soberana a qualquer instrumental. Os maiores instrumentos são a relação e a conversa que se desenrolam no momento em que os dois estão frente a frente.
Viver este paradoxo entre o planejado e o “improvisado” está no âmago da prática do coaching ontológico. O coach ontológico entende e percebe que o que acontece na vida e, portanto, na sessão, é imprevisível e pode ser apenas influenciado por qualquer intenção traçada previamente seja por ele mesmo, seja pelo coachée. A escritora e consultora organizacional americana Margareth Weatley, em seu livro Liderança para tempos de incerteza, escreve sobre esta complexidade da vida assim:
“A vida em geral se auto-organiza, e nós também.
…Posso resumir com simplicidade os processos da vida: a vida procura se organizar, mas usa a desordem para chegar lá. Organização é um processo, não uma estrutura.”
A partir de suas palavras, pergunto: o que é o coaching senão um processo de auto-organização onde o coach caminha com o coachée neste caminhar desordenado e vivo?
Hoje, terminada a formação e experimentando o exercício do coaching ontológico, percebo que encontrei a tal “ferramenta” que buscava. Mais do que isso, encontrei a mim mesma, compreendendo melhor minha relação comigo, com os outros, com o mundo, com a vida. E estou bastante satisfeita com este encontro e com este método que, por seu caráter emergente e imprevisível é mais alinhado à nossa condição humana, este mar de possibilidades e incertezas que somos.
P.S. aproveito para agradecer ao Appana - território de aprendizagem e à querida Karitas Ribas, minha mestra na formação como coach. Gratidão por terem me entregado mais de mim e pela possibilidade de usar o coaching ontológico como ponte para o desenvolvimento de humanas e humanos.
Especialista em Aprendizagem | Designer Instrucional | Escritor | Graduando em Psicologia
2 avocê sempre muito inspiradora 😍
CEO I Executiva de Marketing e Vendas I Desenvolvimento Humano e NegóciosI Facilitadora de Processos de Aprendizagem I Palestrante I Esposa do Fabio e Mãe da Mariana
2 aLindo, querida! Por isso seus olhos brilham, desde o dia que te conheci. Pela verdade, pelo autêntico, pela doação ao outro. Adorei seu artigo! 🌸
Muito legal o seu texto, Nely!! Quando colocamos verdade no processo, tudo flui naturalmente.