A Arte de Construir Pontes: Como a Escuta Atenta Pode Transformar Negociações e Conflitos

A Arte de Construir Pontes: Como a Escuta Atenta Pode Transformar Negociações e Conflitos

“Um antigo enigma filosófico pergunta: “Se uma árvore cai na floresta e ninguém está lá para ouvir, ela ainda produz som?” Isso traz uma reflexão sobre a essência da comunicação: ela só existe verdadeiramente quando alguém está disposto a escutar. Embora vivamos na chamada "Era da Comunicação", com smartphones, e-mails e redes sociais, escutamos realmente uns aos outros?”

Este parágrafo foi retirado de um excelente TEDx de 2015 com Willian Ury, co-autor do clássico Getting to Yes (Como Chegar ao Sim). Depois de assistir novamente este vídeo, decidi escrever ete texto buscando trazer este contexto deste excelente consultor, pois de forma recorrente, tenho comentado o quanto é importante a capacidade de ouvir com atenção tudo o que é dito pelo outro lado da mesa em uma negociação, a chamada “escuta ativa”.

Muitas vezes quando estamos ouvindo a outra pessoa, estamos pensando em como vamos reagir, responder ou utilizar aquilo que está sendo dito. E isso é normal. Mas devemos nos habituar a antes de termos essas linhas de pensamento, colocarmos a outra pessoa em primeiro lugar, para conseguirmos sentir realmente o que ela está querendo dizer nas entrelinhas, onde percebemos sentimentos e desejos que não foram ditos.

Durante as últimas três décadas, Ury diz que percebeu que o sucesso em negociações está profundamente enraizado na capacidade de escutar. Ele conta que em 2013, quando Abílio Diniz enfrentou uma intensa disputa empresarial de mais de dois anos com um grupo francês, ele buscava mais do que simples ganhos materiais. Ao conversar com ele, Ury fez uma pergunta simples: “O que você realmente deseja?” A resposta não foi uma lista de exigências; foi “liberdade”. Esse momento foi crucial. Ele revelava a necessidade humana por algo que vai além dos acordos: o desejo de sermos compreendidos em um nível mais profundo.

Ury defende que uma negociação eficaz começa “indo para a varanda” — uma metáfora para a autoconsciência e o controle emocional. Esse processo é fundamental para evitar reações impulsivas e cultivar uma visão mais ampla da situação. Em vez de cair na armadilha de disputas, é possível construir o que Ury chama de “ponte dourada” — uma forma de proporcionar ao outro lado uma alternativa digna e satisfatória. Essa abordagem ajudou Diniz a não se concentrar na vitória sobre o oponente, mas em conquistar sua própria liberdade, seja por meio de novas iniciativas empresariais ou fortalecendo sua presença em outras áreas.

Escutar de forma autêntica exige que deixemos de lado nossa necessidade de reagir, e foquemos em entender o que a outra pessoa está realmente tentando comunicar. O desafio, como Ury pontua, está em dominar o que ele chama de “poder de não reagir”. Em negociações difíceis, isso se torna crucial para manter a calma e perceber oportunidades que a ansiedade e o conflito poderiam obscurecer.

E muito importante dizer que é normal e muito bom percebermos e deduzirmos coisas que não foram faladas, mas devemos sempre checar se o que nós deduzimos é verdade, perguntando algo parecido como “Prestando atenção no que você falou, eu entendi XXXX. Eu entendi corretamente?”

 Um aspecto fundamental para uma escuta eficaz é recontextualizar o que se vê como conflito. Em vez de focar no que falta, Ury sugere mudar para uma “mentalidade de abundância”, buscando expandir as possibilidades e, dessa forma, oferecer algo que beneficie a todos. Essa técnica pode ser tão prática quanto desenhar mentalmente o "discurso de vitória" do seu interlocutor, imaginando como ele poderia explicar aos outros a razão para aceitar a sua proposta. Isso ajuda a alinhar as negociações com os interesses reais de ambos os lados.

Como profissionais de vendas e negociação, podemos adotar a prática de escutar de maneira intencional para melhorar a conexão humana e a colaboração em nossos projetos. Ury propõe que, se começássemos a ensinar crianças a escutar nas escolas, poderíamos criar uma geração mais preparada para resolver conflitos. Imaginem um mundo onde líderes escutassem verdadeiramente seus colaboradores e tomassem decisões com base na compreensão e no respeito mútuo.

Na próxima conversa difícil, pare, respire e tente “ir para a varanda”. O simples ato de escutar pode transformar a interação, abrir portas e trazer soluções inovadoras. Não apenas escute palavras; escute a pessoa por trás delas. A capacidade de escutar não só transforma negociações, mas tem o poder de transformar relacionamentos e, em última instância, o próprio mundo.

 Adotar uma abordagem com mais escuta ativa em nossas negociações pode ser o primeiro passo para criar pontes em vez de muros, e Ury acredita que esse é o caminho para tornar possível o impossível. Eu concordo totalmente com ele.

Márcia Mitsue Shimizu

Consultora em treinamento de vendas e de lideranças

2 m

Estudo Escuta Ativa e sou fã do William Ury. Uma das dicas que ele compartilhou e que me deixou pensando é "você não sabe o que não sabe". Imagina que você não conhece o mar e que a sua mãe está te contando como é. Como você não tem um parâmetro de comparação, fica difícil entender o que ela está dizendo. É assim também quando estamos negociando: quanto mais conhecemos o outro, mais nos aproximamos do "nós", ao invés do "eu" ou "você". Obrigada pela reflexão Jorge Pontual, MSc

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