A arte de vislumbrar o futuro e inovar
Não vou dizer que é fácil. Não é mesmo. Mas vou dar alguns exemplos que podem te ajudar a pensar à frente, identificar tendências e inovar com eficiência.
Mas, como fazer isso, se mesmo os fundadores mais fantásticos do planeta não conseguem planejar além de vinte ou trinta anos à frente. É possível dizer algo sobre o futuro?
No entanto, embora saibamos que ninguém consegue prever exatamente como será o futuro, uma coisa é possível dizer: será diferente, mas terá raízes no mundo atual.
Recapitulando os conceitos anteriores
Uma vez que você já aprendeu a importância do propósito para a inovação, da habilidade de aprender, desaprender e aprender novamente, as estratégias para estimular a sua curiosidade, aumentar seu repertório e conectar ideias para desenvolver a criatividade, é chegada a hora de pensar sobre onde você investirá o seu tempo, seus recursos e sua energia pelos próximos anos.
Mesmo que antes de tudo isso você já tenha uma ideia definida ou uma pequena noção, você precisa parar, desconstruir tudo e reconstruir com um novo olhar diferente, um olhar que se pergunta: como será o mundo daqui 5 anos? 10 anos? 15 anos?
O oráculo do Vale do Silício
Para mostrar como isso funciona no Vale do Silício, vou contar a história de um empresário que pode ser chamado como “o Oráculo” do Vale, pois tem a habilidade de prever o futuro como poucos.
A sede central de sua empresa é um conjunto impressionante de prédios tão futurista que foi utilizado como cenário de filmes como O Homem Bicentenário e O Exterminador do Futuro de 2015. É a sede da Oracle.
E seu fundador, Larry Ellison, apesar de não ser considerado nenhum gênio da computação, é responsável por criar uma empresa que já esteve no posto de segunda maior fabricante de softwares do mundo, atrás apenas da Microsoft.
O poder especial de Ellison é uma incrível capacidade de futurismo.
As previsões certeiras de Larry Ellison
Nascido em Nova York, Larry Ellison teve algo em comum com Steve Jobs. Após ter uma pneumonia aos nove meses de idade, seus pais biológicos decidiram dá-lo para adoção.
Com a família adotiva, ele mudou-se para Chicago, onde estudou matemática. Porém, assim como outros empreendedores do Vale do Silício, ele abandonou a Universidade no meio do curso.
Enquanto estava na faculdade, no entanto, Ellison aprendeu a programar computadores de forma autodidata e, aos 22 anos, se mudou para a Califórnia.
Essa foi a primeira visão de Ellison. Ele previu o boom que a tecnologia daria para aquela região.
Apesar da pouca habilidade com programação que tinha, Ellison conseguiu um emprego em uma empresa que depois foi comprada pela Fujitsu, o que deu a ele a oportunidade de viajar ao Japão, onde teve outra grande visão.
Ellison ficou impressionado com a cultura dos empresários japoneses.
Eles conseguiam ser agressivos e, ao mesmo tempo, educados.
Eram arrogantes e, ao mesmo tempo, humildes.
Um desses empresários japoneses que ele conheceu naquela oportunidade lhe disse algo do tipo:
“Aqui nós enxergamos nossos concorrentes como aqueles que roubam o arroz das bocas de nossos filhos. No Japão, nós acreditamos que nada menos do que 100% de participação de mercado é suficiente. Temos que destruir nossos concorrentes.”
Essa experiência influenciou a segunda visão de Ellison, que identificou a nova abordagem que ele começou a aplicar aos negócios e hoje é famosa no Vale do Silício, a mentalidade de "criar o seu próprio monopólio".
A terceira visão de Ellison aconteceu em 1970, quando leu um artigo de Edgar Codd sobre uma linguagem de programação de acesso a banco de dados criada pela IBM, mas que todos os especialistas diziam que não era comercialmente viável.
Ellison não concordou. Ele rapidamente viu potencial naquela tecnologia e decidiu agir para conseguir viabilizá-lo comercialmente antes que a IBM o fizesse.
Ellison era um empreendedor tão arrojado e “fora da curva” que até os capitalistas de risco evitavam recebê-lo. Ele conta que perdeu as contas do número de vezes que foi deixado na sala de espera por horas até perceber que não seria recebido.
A criação da Oracle
Com base em sua visão, Elisson fundou a Oracle com US$ 2.000,00 de capital próprio.
Sua visão estava correta e sua criação foi um sucesso. A Oracle nasceu lucrativa desde seu primeiro dia e só perdeu dinheiro em um trimestre em toda a sua história, em 1990.
Mas Ellison não parou por aí. A Oracle já era um sucesso com seus produtos voltados para servidores quando ele teve a sua visão mais impressionante.
Antevendo o sucesso da internet, ele mudou o foco da empresa para produtos que pudessem rodar via browser na internet.
Uma de suas frases mais famosas até hoje é:
“Se a internet não se converter no futuro da computação, nós estamos fritos. Mas se for, nós seremos ouro”.
Felizmente, sua previsão se confirmou e a Oracle passou tranquila pela crise do estouro da bolha das empresas “ponto.com”, ocorrida do início dos anos 2000.
Esse ano, a Revista Forbes listou Larry Ellison como o oitavo homem mais rico do mundo, com uma fortuna avaliada em mais de US$ 62 bilhões.
O Institute For The Future
Ellison foi o exemplo que utilizei aqui, mas eu teria uma lista infinita de empreendedores do Vale do Silício que tiveram seu sucesso fortemente embasado em sua capacidade de prever o futuro. Bill Gates, Steve Jobs e Elon Musk também são alguns desses grandes nomes.
Para se ter uma ideia do quanto isso é valioso na região, um currículo que Steve Jobs enviou para algumas empresas em sua juventude menciona duas vezes que uma das habilidades que ele possuía era “essa coisa de visão”.
A importância de tentar antever o futuro é tamanha no Vale do Silício que em 1968 surgiu o Institute For the Future (IFTF), uma divisão da Rand Corporation cujo objetivo principal é ajudar as empresas a fazer planos de longo prazo, que ficaram conhecidos como “estudos do futuro” ou “futurismo”.
O IFTF foi responsável, por exemplo, pelos primeiros estudos sobre os impactos da Arpanet, tecnologia que veio a se tornar a nossa internet de hoje.
Nos anos 80, o IFTF passou a adotar uma metodologia de análise de diversos cenários para um período de 10 anos à frente, chamado “Ten Years Forecast”.
A precisão de suas análises é tão famosa que diversas empresas contratam o Instituto para a realização de análises sobre produtos, serviços, tecnologias, modelos de negócio e cenários sociais, culturais, políticos e econômicos.
Em 2017, por exemplo, o Google encomendou uma pesquisa sobre como será o futuro das organizações em 2027, especialmente como elas realizarão suas atividades do dia-a-dia.
A Singularity University
Outras iniciativas muito famosas no Vale do Silício são as “escolas de futurismo”, como a Singularity University, que também têm a finalidade de tentar prever o futuro.
A Singularity University foi fundada em 2008 por Peter Diamandis e Ray Kurzweil e fica localizada no centro de pesquisas da NASA, conhecido como NASA Research Park. Seus fundadores acreditam que inovações como a nanotecnologia e a biotecnologia irão mudar totalmente o mundo nas próximas duas décadas e transformar a economia e a sociedade.
A Singularity promove cursos de curta duração, realiza eventos e competições, desenvolve e divulga conteúdos e proporciona oportunidades para startups de alto impacto que buscam resolver grandes problemas globais e com potencial de melhor a vida de bilhões de pessoas.
Vale a pena fazer em um intercâmbio combinado com um curso em uma escola como essa!
A visão de Peter Thiel
Por fim, gostaria de compartilhar a visão de Peter Thiel, cofundador do PayPal e da Palantir, um dos maiores empreendedores e investidores do Vale do Silício e autor do livro “De zero a um”, onde explica o conceito de que toda startup deve buscar criar seu próprio monopólio.
Ele explica que tentar vislumbrar o futuro é um grande desafio. Ninguém consegue, de fato, prever o futuro com exatidão. A única coisa que todos sabem é que o futuro será diferente do hoje, mas terá raízes no mundo atual.
Segundo ele, isso nos leva à conclusão de que o futuro sempre será um futuro de progresso. Porém ele divide esse progresso em duas modalidades, o progresso horizontal e o progresso vertical.
O progresso horizontal tem relação com copiar as coisas que funcionam ou fazer pequenas melhorias. A globalização ajuda muito nesse processo. É o partir de 1 para “n”.
Já o progresso vertical é fazer coisas novas, é partir de 0 para 1.
Esse progresso vertical é baseado em tecnologia, uma vez que tecnologia é qualquer forma nova e melhor de criar coisas.
Por fim, Peter Thiel defende a ideia de que o progresso vertical só é possível em startups, em pequenos grupos de pessoas unidas por uma missão de mudar o mundo para melhor.
Isso porque, é difícil desenvolver coisas novas em organizações grandes, pois a burocracia e os interesses entrincheirados são avessos a risco. Por esse motivo, cabe às startups o papel e a capacidade de questionar as ideias já conhecidas e repensar os negócios do zero.
Como fazer para ter visão de futuro
Seja antes de criar uma startup ou mesmo depois que ela se tornar uma grande empresa, todo empreendedor deve se perguntar sempre: como será o mundo daqui 05 anos? Como estará o segmento em que atuo daqui 10 anos? Quais serão as necessidades das pessoas e empresas? Qual o problema da humanidade que exigirá uma solução urgente?
Considere o seu mercado local, mas olhe também o que está surgindo ao redor do mundo.
Pesquise, se informe, esteja totalmente atualizado com as novas tecnologias, com o que seus concorrentes estão fazendo, mas também o que outras empresas de segmentos totalmente diferente estão fazendo. Lembra da importância da curiosidade para a inovação?
Por exemplo, você já viu que alguns supermercados estão colocando caixas automáticos de autoatendimento? Já viu a experiência da americana Amazon Go e da brasileira Zaitt sobre o mercado totalmente sem seres humanos no atendimento? O que isso indica para o futuro do segmento? Se você trabalhasse em uma rede de supermercados, o que faria?
Você tem que acompanhar essa revolução tecnológica que está acontecendo, mas não apenas em tecnologia da informação, digitalização e internet, mas também a revolução em biologia molecular e a engenharia genética.
O uso da informação sobre a vida para medicina, agronegócio e atividade humana.
Haverá a necessidade de fazer um grande esforço de atualização do Brasil nesses segmentos, pois nós temos uma vocação natural como nação provedora de alimentos para o mundo. O que você pode fazer em relação a isso?
Mas acompanhe também as outras coisas que estão acontecendo no mundo.
E quanto à mudança climática? O que será do mundo se o problema ambiental continuar? O Brasil tem um protagonismo quase que inescapável. Somos um país rico em biodiversidade e recursos naturais e isso pode garantir o nosso futuro. O que você pode fazer em relação a isso?
Tem também a geopolítica internacional. Qual será o resultado da disputa comercial entre os Estados Unidos e a China? Você tem acompanhado o que a China tem feito nos últimos anos em termos de inovação? O que impedirá que a China elimine o seu negócio ou sua carreira? O que você pode fazer em relação a isso?
Não há dúvidas de que, ao menos esses três fatores, impactarão o Brasil nos próximos 5 a 10 anos, criando crises e gerando oportunidades. Se você será prejudicado pela crise ou se terá a chance de aproveitar as oportunidades, dependerá do seu esforço para vislumbrar o futuro.
Conclusão
O que isso nos ensina sobre inovação e transformação digital?
Nos ensina a importância de cultivar uma mentalidade apta a vislumbrar o futuro o tempo todo.
O desafio é achar meios singulares de criar coisas novas que não apenas mudarão o futuro, mas farão dele um mundo melhor.
O mais importante é pensar por si mesmo, pois essa é a única forma de ver o mundo de uma maneira que ninguém mais viu.
Enfim. Posso dizer que todo empresário deveria planejar ser o último empreendedor do seu mercado específico. Para isso, deve começar se perguntando: como será o mundo daqui dez, vinte anos? E como meu negócio se encaixará neste cenário?