Arte e decolonização
Nesse artigo será discutido como a arte atua como ativismo e resistência dos povos originários. A pesquisa é pertinente para que possamos compreender a importância da arte no processo de decolonização. Assim, será analisado a forma como a arte contemporânea agem atualmente expondo os problemas enfrentados atualmente pelos indígenas. Para que possa ser feita tal análise, voltaremos à colonização, para que posteriormente possamos compreender a decolonização. Posteriormente abordaremos a arte moderna brasileira e sua tentativa de ter uma arte brasileira, tentando representar os nativos. Por fim, será aborda a arte contemporânea indígena, dando ênfase ao autor Denilson Baniwa e sua obra ReAntropofagia.
Quando os portugueses chegaram ao território considerado hoje o Brasil, já haviam cerca de cinco milhões de povos originários, divididos em mais de mil tribos diferentes, que foram generalizados e chamados de índios. Essa população possuía diferenças culturais e linguísticas. Como exemplo, podemos destacar os Tupis, que dominavam a faixa litorânea do norte até o sul do que corresponde hoje ao estado de São Paulo; os Guaranis, que ficavam na bacia Paraná-Paraguai e no litoral do extremo sul; o povo Pataxó Hãhãhãe, no sul da Bahia.
Com a chegada dos europeus, os nativos sofreram violências em todos os âmbitos, como a física, sexual (que resultou na população mestiça que existe hoje no país), cultural, religiosa, catequizando os nativos o os obrigando a seguir a religião católica, proibindo seus ritos e crenças. Além disso, houveram diversas crises epidêmicas, que dizimaram milhares de indígenas, com doença que ainda não haviam chegado na América (FAUSTO, 1994).
Assim, esses povos foram privados da vida que tinham até o momento da invasão europeia ao território, que hoje é o Brasil. Tendo também sua cultura afastada da população ao longo dos anos, visto que o que vinha da Europa era considerado bom e civilizado, enquanto a cultura e costumes indígenas era considerados incivilizados e selvagem. Criando um preconceito sobre esse povo ao longo do tempo e que percorre até os dias atuais.
Exemplo dessa imposição cultural pode ser vista no quadro “Primeira Missa no Brasil”, de Victor Meirelles, que retrata a fé católica como a salvação desses povos, que eram considerados pagãos, pelos europeus. Tal fator foi citado na carta de Pero Vaz de Caminha dizendo que “o melhor fruto que dela pode tirar parece-me que será salvar esta gente. E esta deve ser a principal semente que Vossa Alteza em ela deve lançar”.
A Arte Moderna surge na Europa no final do século XIX e se consolidou no Basil em 1922, com a Semana de Arte Moderna, ocorrida no Teatro Municipal de São Paulo. Chegando em um momento de conturbação política, com o país no controle dos grandes latifundiários de São Paulo e Minas Gerais. Tal corrente artística é caracterizada pela quebra com o formalismo, que atingia inclusive o campo literário.
A primeira fase do movimento modernista buscava uma identidade nacional, que propunha destruição dos modelos vigentes até o momento. Nesse momento a cultura brasileira foi posta em cena, sendo valorizada. Dentre as correntes dessa fase estava o Movimento Antropofágico, liderado por Oswald de Andrade, Raul Boop, Tarsila do Amaral e Mario de Andrade e foi um dos movimentos artísticos mais importantes da arte brasileira. (NEVES, 2017).
O nome do movimento foi retirado de um ritual indígena de canibalismo, com a intensão de devorar e digerir a cultura europeia no Brasil, antes de se transformar em uma expressão artística nacional. Na antropofagia, praticada por alguns povos indígenas, devorar o adversário é sinônimo de respeito as virtudes e esperança de que elas venham a fazer parte do corpo daquele que devorou. Dessa forma, o movimento antropofágico resgatou a cultura primitiva dos povos originários, colocando-as em cenas, o que antes não era aceito (NEVES 2017).
Recomendados pelo LinkedIn
Dentre as grandes obras desse período está o livro “Macunaíma” de Mario de Andrade, um herói sem nenhum caráter. O livro traz a história de um indígena nascido na Floresta Amazônica que tem como uma das principais características a preguiça. Esse índio é uma releitura do índio romântico do passado e que representa a sociedade brasileira.
Logo, é nítido notar que a cultura indígena foi contada e representada artisticamente por meio da visão de pessoas brancas e não de artistas indígenas. Os artistas modernistas resgataram os povos originários mas por uma perspectiva branca, de quem cresceu e vive em grandes centros urbanos, que teve contado com a cultura europeia. Dessa forma, não foi dado um real reconhecimento para as artes dos povos originários e valorização de seus artistas. Afinal, onde estavam os artistas indígenas representando a antropofagia?
No Brasil contemporâneo, os artistas indígenas estão ganhando espaço e utilizando a arte como forma de ativismo e resistência. Em um momento em que os direitos do índios estão sendo ameaçados, meio-ambiente cada vez mais devastado, em que esses povos sofrem com os latifundiários, que ameaçam e exterminam povos indígenas, é preciso ter voz para que a população possa entender o que essas pessoas estão realmente passando. A arte indígena vem como forma de romper com a cultura colonial, por meio do pensamento decolonial. Busca-se então, desconstruir as narrativas, incluindo as vozes que foram excluídas, decolonizando o conhecimento, poderes, etc.
O artista Denilson Baniwa é natural da aldeia Darí, no Rio Negro. É considerado um antropófago, visto que em suas obras se apropria de elementos ocidentais, a fim de descolonizá-los. Baniwa luta pelos direitos dos povos indígenas e é um exemplo de resistência dos povos originários. Dentre suas exposições há a “Terra Brasilis: o Agro não é pop”, que mostra a luta dos povos indígenas contra os latifúndios que ameaçam a existência desses povos.
A obra ReAntropofagia traz, segundo o artista “o simulacro Macunaíma, jazem juntos a ideia de povo brasileiro e a antropofagia temperada com bordeaux e pax magnolica”. Para ele a ReAntropofagia tem como objetivo “devorar” tudo, sem a utilização de questões consideradas civilizadas, de caráter colonizador, o que para ele o modernismo não conseguiu fazer. Assim “a arte produzida por artistas indígenas está mais viva que nunca, na cidade ou na aldeia, ‘contra o epistemicídio, contra a necropolítica, porque tupy or not tupy não é mais a questão” (ASSUMPÇÃO, 2019).
Logo, visto que a população indígena sofreu e ainda sofre inúmeros massacres, devido ao processo de colonização, é preciso que haja apoio a seus artistas, para que possam ter voz, denunciar o que está ocorrendo por meio da arte. Também é preciso difundir a cultura e arte dos diversos povos originários, para que possamos ter uma arte realmente brasileira. É preciso dar voz para que eles possam contar sua própria história e não que homens brancos contém por eles. Precisamos da arte indígena para que possamos conhecer a cultura e arte brasileira, para que possamos conhecer a população que habita nosso país. É preciso que esses fatos ocorram para que o processo de decolonização possa ser efetuado com sucesso.