ASSESSORES DE IMPRENSA, COMUNICAÇÃO E GOVERNAÇÃO
Assessores de Imprensa: entre o fascínio e o medo dos microfones...

ASSESSORES DE IMPRENSA, COMUNICAÇÃO E GOVERNAÇÃO

Passou despercebido na altura, mas os Países Baixos também foram notícia quando o respetivo governo resolveu interditar aos jornalistas a possibilidade de virem a desempenhar funções de seus Assessores de Imprensa.

A incompatibilidade entre ambas as funções é por demais evidente e não cessa, pura e simplesmente, quando se interrompe uma delas para desempenhar a outra.

Os interesses são divergentes, frequentemente conflituais e a promiscuidade, quando existe (e existe), dificilmente produz resultados abonatórios nos ciclos entre "a boa e a má Imprensa”, a que os poderes públicos estão sujeitos.

A inexistência de formação académica especializada, multidisciplinar, da comunicação à ética e à cidadania, entre muitos outros domínios (ao contrário do que acontece noutras paragens onde a exigência e o escrutínio da prestação de serviços públicos é maior), origina expectativas, geralmente distorcidas, dos decisores face ao desempenho esperado dos seus Assessores de Imprensa, combinada com a sublimação por parte destes, de possuírem capacidades-extra em vir a gerar “boa Imprensa”, ponto de partida para desenlaces infelizes.

Se há um trabalho prévio, consistente e continuado a fazer, de preparação e aconselhamento, difícil e paciente, dos decisores públicos (dos mais introvertidos aos mais extrovertidos, dos menos aos mais inexperientes), face ao relacionamento a adotar perante os media, isso implica apreender previamente e ter sempre bem presentes os limites da função.

Frequentemente o desempenho destes Assessores restringe-se ao deve-haver contínuo entre os momentos de euforia e de projeção da autoestima, quando se obtém um título noticioso feliz ou sai editado um conteúdo laudatório, por contraponto aos longos momentos de inexistência informativa ou de angústia quando “o mundo se vira” perante a atuação dos decisores a que reportam.

Lidar com os media não é “para meninos de coro”, obter e trabalhar com um fio condutor, informação relevante para projetar a ação pública provinda do interior dos gabinetes do poder e da Administração Pública, é um exercício de resistência só ao alcance dos mais aptos, sublimar os exercícios de poder público para exercícios de spin doctor’s, é um pequeno passo que se pode vir a revelar fatal.

A ânsia de obter visibilidade positiva abre com frequência um outro espectro de atuação – Assessores de Imprensa que tendem a ser, pontual ou continuadamente, gestores descontrolados de informação propagandística de baixa qualidade, um domínio mais amplo onde se entra, frequentemente, sobrepondo opinião sem mais, e exercitando a retórica sem filtro.

Já os governantes, com frequência, tendem a comprimir a afirmação das suas estratégias políticas, no somatório de discursos (frequentemente redundantes), com a ação no terreno, e a sua projeção na imprensa.

No entretanto, há que compatibilizar prioridades informativas dentro dos governos, hierarquias e sensibilidades que se estendem ao agregado de cada equipa ministerial e à estrutura de Administração Pública sob a respetiva alçada.

O outro lado, digamos assim, da Comunicação política dos governantes no exercício das suas funções, tende a ser disperso, pouco racional e produtivo, na impossibilidade de se articular com uma estrutura, inexistente, de Comunicação do Estado, ao arrepio do que acontece na generalidade dos países de matriz semelhante à nossa.

Com tantos intervenientes, níveis de decisão ou de obstrução, os limites e o empobrecimento do desempenho das funções de Assessoria de Imprensa dos poderes públicos, são efetivos.

Esta modalidade de Assessoria de Imprensa vive assim numa espécie de terra de ninguém, um limbo, onde o ideal de um bom trabalho – dar a conhecer na justa medida os exercícios públicos em prol das comunidades, a existir, frequentemente esbarra em expectativas e realidades distorcidas.

Será possível mudar esta situação?

Uma sugestão para reconfigurar o ponto em que estamos: pensar e estruturar previamente a Assessoria de Imprensa como uma peça-chave dos governos – posicionamentos políticos próprios devem ter uma tradução prática diferenciada mas específica na forma de estabelecer relações com os media, um alinhamento próprio, uma espécie de código de conduta operacional que cada força política no momento de exercer a governação (central ou local), põe em prática através dos seus Assessores de Imprensa.

Isso permitiria, pelo menos, antever regras do jogo previamente conhecidas e claras, desempenhos mais seguros, uma seleção prévia, cuidada e trabalhada dos Assessores de Imprensa a recrutar.

Tendencialmente, permitiria também uma melhor articulação das Assessorias dentro dos governos, no interior de cada ministério e entre as suas estruturas políticas e o aparelho da Administração Pública.

No limite, o que está em causa é o dispor-se de um Estado mais racional e funcional, onde as várias “peças” tendem a  encaixar-se melhor e isso ser um fator objetivo de reconhecimento social.

Ou então ficarmos como estamos – aguardando que “a má Imprensa” e as fragilidades reais ou imaginadas dos Assessores de Imprensa, funcionem eles próprios como sensores da queda anunciada dos respetivos governos…


N.A. – É insuficiente analisar a Assessoria de Imprensa da governação (em geral) apenas enquanto perspetiva analítica ou construção teórica.

Perceber um pouco melhor o que tem sido o papel e desempenho destas Assessorias ao longo dos Governos Constitucionais, permite aprofundar a reflexão sobre o estado da nossa democracia - tema e objeto de  artigo neste suporte e espaço, a publicar no dia 15 de março.



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