“Bala perdida?” A máscara de uma linguagem que esconde a verdade nua e crua: descaso e fracasso do Estado.

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Eu posso não te convencer com minha retórica, tudo bem, nem é minha intenção, viva a liberdade de pensamento e de expressão, mas eu não consigo entender porque a imprensa e até alguns líderes que admiro insistem em noticiar vítimas de tiroteios como: vítimas de “balas perdidas”. Será mesmo que são perdidas? Assim ao acaso? "Foi mal, desculpe-me?"

Não me interpretem mal, eu entendo o que “bala perdida” quer dizer no contexto proposto, mas para mim, uma bala que, na realidade já é um eufemismo para um pequeno pedaço de chumbo, um projétil que sai de uma arma de fogo, se perder? Isso só seria verdade em poucas situações. Exemplo: um disparo acidental em um alvo não humano ricocheteou e atingiu alguém. Outro exemplo? Caiu um revólver no chão, o impacto ocasionou um disparo e o projétil atingiu alguém. Quando existe ação, intenção de disparo, uma ação de matar, de dolo, você pode até errar o alvo, mas nunca será uma bala perdida. A bala que ia para destruir uma vida e atingiu outra, não é uma bala perdida. Alguns animais também são atingidos, mas a imprensa evita noticiar, poderia causar mais comoção que saber que alguém foi atingido.

Além disso, tiros trocados por traficantes, bandidos, policiais, um vizinho violento que saca uma arma para atirar em outro, um motorista nervoso, uma morte causada por eles não será uma bala perdida.

Então como chamar esses eventos? Eu tenho minha versão para isso: “violência colateral”. Esse projétil não é obra de um acaso ou um acidente, não é um projétil perdido e sim um efeito colateral da violência do dia-a-dia, da ignorância, impaciência, falta de amor, talvez, simplesmente maldade. Querer ferir pelo prazer de ferir, pois psicopatas estão por aí.

Esses projéteis são sim o efeito colateral que esconde a soma de muitas mazelas ao longo dos anos: falta de educação; ausência do Estado; banalização da violência; despreparo emocional, maldade, ausência de valores de família ou religiosos, que resulta em maldade. Tudo isso é descaso pela vida e nunca dever ser confundido com um disparo acidental, uma “bala perdida”. 

A ausência do Estado não ocorreu em meses, nem em poucos anos, são décadas que a sociedade vem esperando uma solução ‘por osmose’ e essa não veio (nem virá). Esse projétil que saiu de algum lugar e acertou alguém não foi por acaso, estão mascarando a realidade.

Solução? Solução é uma palavra muito elástica, ampla e até simples para um problema de dimensões assombrosas. Hoje, não há um plano para isso, há ideias. O que dirá uma solução! Sabemos também que violência é como um câncer, com um diagnóstico, ali bem no início, as chances de cura são boas, no meio, com quimioterapia, provável, e o diagnóstico tardio? Sabemos a resposta. Parem de dourar a pílula, parem de criar linguagem leve para algo tão cruel, ainda que banal.

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