BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO BRASIL PÓS PLANO REAL

BREVE HISTÓRIA ECONÔMICA DO BRASIL PÓS PLANO REAL

INTRODUÇÃO - CENÁRIO PRÉ REAL

No início da década de 1990 o Brasil vivia um verdadeiro caos econômico. Por anos governos tentaram planos e formas pouco ortodoxas (tabelamentos de preços e salários, retenção de saldos bancários, cortes de zeros etc.) para reduzir a hiperinflação causada pela incapacidade do Estado em honrar o imenso endividamento público decorrente das tomadas de empréstimos feitos junto ao FMI durante as décadas de 1960 e 1970 pelo regime militar para financiar grandes investimentos em infraestrutura.

INTRODUÇÃO - INFLAÇÃO

Inflação é um desequilíbrio entre a quantidade de dinheiro e a quantidade de riquezas em um sistema. Há dois tipos básicos de inflação:

INFLAÇÃO POR DEMANDA - é quando os preços sobem em decorrência do aumento da demanda por determinado produto/serviço. Este fenômeno normalmente fica restrito ao entorno do setor afetado. Caso a oferta aumente para suprir a demanda, os preços tendem a retornar a patamar próximo ao anterior.

INFLAÇÃO POR EXPANSÃO DA BASE MONETÁRIA - o dinheiro é uma unidade de medida criada para medir riqueza. O dinheiro não é a riqueza em si, mas o instrumento criado para medir riqueza e servir de ferramenta para trocas. Quando a quantidade de dinheiro disponível em determinado sistema aumenta sem que o valor das riquezas acompanhe este aumento, o valor das riquezas neste sistema é diluído. A inflação experimentada no Brasil durante o período de hiperinflação anterior ao Plano Real se deve a expansão da base monetária promovida pelos governos de então, que por não terem como pagar seus compromissos, recorriam a impressão de dinheiro.

INTRODUÇÃO - CÂMBIO

O dólar é utilizado, desde o final da Segunda Guerra Mundial, como unidade padrão de medida de riqueza, de trocas internacional e de reserva.

Quando o noticiário informa que o dólar subiu ou desceu, é preciso saber que na realidade esta variação mede o valor do Real, não do dólar.

A medição da relação do valor do Real frente ao dólar indica as expectativas e o valor de nossa economia quando medido em moeda estável. Quando o dólar sobe, é sinal de que as expectativas e o valor de nossa economia caíram. Quando o dólar cai, é sinal de que as expectativas e o valor de nossa economia subiram.

PLANO REAL

O Plano Real, implementado entre 1993 e 1994 durante o governo Itamar Franco pela equipe chefiada pelo então ministro da fazendo Fernando Henrique Cardoso, é o maior ativo que o Brasil produziu nas últimas décadas. Diferentemente de planos anteriores, que não vieram acompanhados de reformas estruturais, o Plano Real foi composto não apenas por uma nova moeda, mas também por sistemas e metas de controle e governança capazes de garantir a sucesso das reformas em médio e longo prazos.

1ª FASE – AJUSTE FISCAL

A primeira e mais importante fase do Plano Real foi o controle das contas públicas. Sob nenhuma circunstância o país poderia gastar mais do que arrecadava. Este controle foi fundamental para eliminar o risco de o tesouro recorrer a expansão da base monetária, gerando inflação, para pagar seus compromissos.

Acompanhado do controle das contas públicas foram feitas privatizações, reduções na máquina pública e reformas. Muitas destas ações foram mal recebidas e fortemente criticadas pela oposição política de então.

2ª FASE – URV

A URV (Unidade Real de Valor) foi o sistema de indexação dos valores dos produtos e serviços ao dólar. Todos os fatores e itens de troca da economia foram indexados ao URV. As etiquetas de preço informavam o valor em Cruzeiro Real e em URV.

Esta fase de transição, que durou seis meses, foi essencial para educar e acostumar as pessoas a um novo modelo monetário.

3ª FASE - REAL

Em julho de 1994 a URV se tornou o Real e o Cruzeiro Real foi descontinuado e o sistema de câmbio flutuante entrou em vidro. Neste momento USD 1,00 equivalia a R$ 1,00.

TRIPÉ MACROECONÔMICO

O Tripé Macroeconômico foi a estratégia adotada imediatamente após a implementação do Plano Real. Este modelo foi preservado durante o governo de Fernando Henrique Cardoso e mantido até meados do segundo mandato de Lula. Os principais pontos da estratégia são:

CÂMBIO FLUTUANTE - o valor do Real em relação ao Dólar varia de acordo com a oferta e demanda de dólares em cada momento.

META DE INFLAÇÃO - todos os anos limites para a inflação do ano seguinte eram definidos e cabia ao Banco Central controlar os juros básicos (Taxa Selic) para que a meta de inflação fosse alcançada.

META FISCAL - o governo não poderia gastar mais do que arrecadava.

Se respeitados os três pontos do Tripé Macroeconômico, a economia do país poderia crescer de maneira sustentável sem o risco do retorno da inflação descontrolada. Esta estratégia foi fundamental e permitiu as melhoras de todos os indicadores do país nos anos seguintes.

O abandono desta estratégia ocorrido a partir de 2008 durante o segundo mandato de Lula abriu espaço para o mau momento econômico que o país vive desde meados da década de 2010.

CRISE 1999

O Plano Real foi muito bem-sucedido em combater e controlar a inflação, em garantir responsabilidade fiscal e em reconstruir a imagem do país junto ao mercado internacional.

Contudo, alguns aspectos se tornaram problemáticos. A abertura econômica e o Real forte acabaram por inibir exportações e favorecer importações, enfraquecendo a indústria nacional.

 No cenário internacional houve dois eventos que impactaram fortemente a entrada de dólares no país. Em 1997 os países asiáticos passaram por fortes crises econômicas, o que derrubou suas demandas por commodities produzidas no Brasil. Em 1998 a Rússia passou por turbulências severas.

Entre 1997 e 1998 o governo de Fernando Henrique Cardoso se esforçou para injetar dólares na economia a fim de manter o Real forte. Parte dos recursos obtidos em privatizações, aumento de impostos e USD 130 bilhões em endividamento foram utilizados com objetivo de segurar o valor do Real, porém no início de 1999 o governo cedeu e parou de injetar recursos na economia, o que drenou a oferta de dólares no mercado e causou a desvalorização do Real.

No final de 1998 USD 1,00 equivalia a R$ 1,20. No final de 1999 USD 1,00 equivalia a R$ 1,80, salvo variações pontuais, mante-se relativamente estável até o início da década de 2010.

NOVA MATRIZ MACROECONÔMICA

Em 2011 o governo de Dilma Rousseff renunciou ao Tripé Macroeconômico em favor da Nova Matriz Macroeconômica. O novo modelo, associado ao então Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), deixava de lado a responsabilidade fiscal para focar em medidas que visavam favorecer o crescimento econômico apostando que, com este crescimento, a arrecadação também subiria e seria suficiente para cobrir os gastos do Estados e a expansão da base monetária.

Foram promovidas desonerações para indústrias específicas, expansão do crédito via BNDES, subsídios a tarifas de energia e desvalorização do Real frente ao dólar com objetivo de baratear produtos brasileiros no mercado internacional.

Embora a visão desenvolvimentista não seja fundamentalmente equivocada, a execução da nova estratégia foi contaminada por favorecimento a empresas ligadas ao governo, pelo desvio de recursos para campanhas políticas, pelo crédito a iniciativas de interesse ideológico do governo e pelo aumento dos gastos públicos acima do limite responsável.

Como resultado da nova estratégia econômica, associado ao fim do boom das commodities e ao estouro de escândalos de corrupção, em 2010 USD 1,00 que equivalia R$ 1,80, passou, em 2014, a equivaler R$ 3,80. O PIB brasileiro em dólar despencou perto de 50%, resultando na maior crise econômica do país de todos os tempos.

BOOM DAS COMMODITIES

COMMODITIES – são produtos básicos, não industrializados, pouco distinguíveis em relação em características em relação a origem e comprados e vendidos em todo o mundo. Soja, trigo, petróleo e minério de ferro são exemplos de commodities.

Entre 2000 e 2014 países fornecedores de commodities, incluindo Brasil e demais vizinhos da América do Sul, experimentaram fortíssimo crescimento nas exportações de itens básicos, em especial para China e Índia. Este fenômeno resultou em grande entrada de dólares nas economias exportadoras de commodities, o que fortaleceu as moedas e reservas destes países, aumentando o poder de compra e consumo das populações e de investimento dos governos.

Grande parte do bom momento econômico vivido pelo Brasil durante o governo Lula, e pelos demais países exportadores de commodities no início do século 21, não se deve a ações estruturais, reformas ou programas promovidos pelos governos que então ocupavam o poder, mas principalmente pelo aumento da demanda estrangeira.

A desaceleração das exportações em meados da década de 2010 resultou em perturbações econômicas em todos os países exportadores de commodities. No caso do Brasil este momento foi agravado em razão do estouro de escândalos políticos decorrentes de flagrantes casos de corrupção envolvendo a base do governo Dilma Rousseff e pelo fracasso da Nova Matriz Macroeconômica.

TETO DE GASTOS

Após o impeachment de Dilma Rousseff, em 2016 o governo de Michel Temer propôs a criação de um método para evitar que governos futuros gastassem mais do que o arrecadado, minimizando assim risco de inflação e promovendo credibilidade junto ao mercado internacional. Esta iniciativa, chamada de Teto de Gastos, consistiu em reformas visando limitar os gastos públicos a inflação do ano anterior.

Esta medida estancou a sangria do país e sinalizou a retomada da responsabilidade fiscal. A agenda de reformas econômicas de Michel Temer, que previa a reformas na previdência, do sistema tributário e no modelo administrativo do Estado foi interrompida devido o envolvimento do governo em escândalos de corrupção.

Em 2017, após o estabelecimento do teto de gastos, USD 1,00 equivalia 3,40.

REFORMA DA PREVIDÊNCIA

A reforma da previdência desenhada durante o governo de Michel Temer foi aprovada, em 2019, poucos meses após o início do governo Bolsonaro. Isto assegurou a viabilidade das contas públicas por mais algum tempo.

Esta iniciativa foi fundamental devido ao rápido crescimento dos gastos do tesouro com aposentadorias, superando o investimento em educação e saúde combinados. O modelo anterior, criado em meados do século 20, desconsiderava a evolução da pirâmide etária da população vista nas últimas décadas. Se continuássemos neste sistema, em poucos anos a totalidade dos recursos arrecadados pelo Estado seria destinada ao pagamento de aposentadorias.

PANDEMIA E ESCÂNDALOS

Visando minimizar os impactos econômicos negativos da pandemia, governos de todo o mundo promoveram programas de renda mínima, preservação de emprego e apoio a empresas. Isto se deu a partir de endividamento (tomada de dinheiro emprestado) e da expansão da base monetária (impressão de dinheiro).

No Brasil a dificuldade econômica causada pela emergência sanitária foi agravada por denúncias de corrupção envolvendo o presidente, seus familiares e base de apoio no congresso, pela forma como o governo respondeu a pandemia e pela prática de políticas populistas que resultaram em estouro do teto de gastos.

Em 2020 USD equivalia a R$ 5,25 e em 2021 a R$ 5,60.

PRESENTE E FUTURO

O PIB do Brasil em 2011 foi USD 2,61 trilhões. Em 2021, após uma infindável sucessão de escândalos de corrupção, turbulências e pandemia, o PIB do Brasil está e USD 1,60 trilhão. Nos últimos dez anos o mundo cresceu, em dólar, em média 30%. Neste mesmo período o Brasil caiu, em dólar, quase 40%. Ou seja, em média, perdemos 40% de nosso poder real de compra.

Qualquer possibilidade de melhora do cenário econômico brasileiro passa pela retomada do Tripé Macroeconômico, focando em reformas estruturais e responsabilidade fiscal.

Governos populistas de esquerda ou direita não reúnem condições mínimas de fornecer a estabilidade e a estrutura necessárias para que o país cresça. É imprescindível escolhermos, em todas as esferas, lideranças preparas e capazes entregar o que é preciso.

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