Carrinho "acessível" abre mesmo a roda da inclusão, Skol?
Recentemente, descobri essa iniciativa promovida pela Skol em São José, santa Catarina: a criação de um carrinho de supermercado acessível para pessoas com deficiência visual, capaz de melhorar a autonomia desses consumidores na hora das compras.
Descrição do vídeo: cenas de pessoas em um mercado empurrando um carrinho redondo amarelo com o logo da Skol. As pessoas utilizam um fone de ouvido e caminham pelos corredores. Há cenas de mãos tateando etiquetas em braile e pegando latas de cerveja da marca. Em alguns momentos, as pessoas que participam do vídeo dão seus depoimentos em um espaço com fundo amarelo.
Pelo que compreendi da campanha, o carrinho conta com uma barra sensível ao toque na qual a pessoa põe as mãos para movê-lo e através de IA, é guiada por um fone de ouvido e microfone com instruções para chegar às gôndulas da Skol. Ao chegar ao local, os produtos são identificados com legendas em braile.
E por que essa campanha me causou estranhamento? Por vários motivos, começando pela falta de acessibilidade comunicacional do vídeo, ou seja, as pessoas cegas (clientes do suposto carrinho) não tem acesso ao conteúdo do vídeo, pois não há audiodescrição, recurso essencial de acessibilidade que possibilita que pessoas cegas e com baixa visão possam acessar imagens (estáticas e dinâmicas) através da sua descrição.
Segundo ponto de estranhamento: a tecnologia utilizada no carrinho acessível, a campanha não deixa claro suas funcionalidades e nem fala sobre as adaptações necessárias para os mercados receberem essa tecnologia. Será que essa é uma tecnologia que vai ser ampliada para outros mercados ou foi somente uma campanha pontual para inserir a marca na conversa?
Deixou margem para essa e outras perguntas.
Pessoas cegas e braile não são sinônimos. É comum o estereótipo de que toda pessoa cega lê em braile, mas isso está longe de ser uma verdade. Nem todo mundo lê braille, e apesar da dificuldade de calcular a quantidade de leitores/as desse código em relação ao total de pessoas com deficiência visual, as instituições de apoio e acompanhamento desse público apontam que o uso do código é mais comum entre quem já nasceu com deficiência e foi alfabetizado/a desde cedo.
Resumo da ópera: a proposta de um carrinho que se diz acessível não pode se limitar ao braille como forma de identificação de produtos, se o foco for mesmo a autonomia da pessoa (e não a mera tentativa de fazer marketing positivo sobre inclusão).
Independente dos motivos que levaram a Skol a investir nessa campanha, acredito que a ação foi positiva e bem intencionada, demonstrando o interesse da marca de aproximação de mais um grupo minorizado e excluído das ações de diversidade e inclusão do mercado, sempre restrito à temática das cotas.
Deixo aqui o meu muito obrigada à Skol pela tentativa de invisibilizar a pessoa com deficiência na roda fechada da inclusão.
#RodaDaInclusao #AcessibilidadeComunicacional
Coordenadora Comercial no Ifood | Performance | Marketing | Data Analytics | Growth e CRM
5 aClarissa de Morais N. Lima
Coordenador de Marketing, Marketing Digital, Comunicação estratégica, Especialista em Marketing, Eventos Corporativos
5 aMuito válido