Cidades não administráveis.
Cidades Inadministráveis - I
Escrevo este artigo agora mais na condição de “administrador remido” do que colunista do Jornal.
Abordando as diversas áreas da Administração Pública, escreverei outros artigos, um sobre cada setor. Vou propor ao Conselho Federal e aos Conselhos Regionais de Administração que coloquem esse tema em suas pautas de debates, de premiações por trabalhos e destaques, que envolvam as Universidades em busca de saídas e respostas para as graves questões administrativas do setor público brasileiro.
Todas as vezes que viajo ao interior da Bahia, vejo as cidades mais inchadas, mais caóticas e cada vez menos administráveis. Tem quem chame inchaço de crescimento. Cada novo Administrador que assume o cargo, após seus quatros anos de governança, deixa um legado pior ao sucessor. Não é uma tradição, mas uma cruel realidade. Os municípios continuam tendo seus prefeitos, vereadores, funcionários públicos, suas estruturas de poder político e de governo, mas elas não dão as respostas que os cidadãos precisam, pedem, suplicam. Viver no caos não é escolha, é falta de alternativa. Isso adoece, maltrata, mata.
Os problemas das “cidades inchadas” crescem em progressão geométrica, estratosférica, mas as estruturas públicas ficaram estagnadas, envelheceram, tornaram-se obsoletas e incapazes de dar respostas mínimas às demandas das populações locais, situação agravada pelas migrações internas do campo para a cidade, como também dos movimentos migratórios regionais, absolutamente descontrolados e nunca mensurados, estudados e enfrentados.
Sob todos os aspectos setoriais preconizados pela ciência da administração pública a situação é catastrófica, evidentemente tolerada e banalizada pela inacreditável capacidade do povo brasileiro de ser tolerante, adaptável e resiliente.
Sem métodos de pesquisa científica como base, observo nos comentários dos moradores que os melhores prefeitos, geralmente reeleitos e em revezamentos seculares, são aqueles que pagam os salários em dia, fazem calçamentos de ruas – muitas vezes sem rede de esgoto –, que mantêm minimamente em funcionamento a varrição e a iluminação pública, que conservam os prédios públicos. Não se vai muito além disso, embora existam exceções, honrosas e comemoradas.
Se na maioria das cidades faltam médicos, também faltam engenheiros, arquitetos, administradores, agrônomos, geólogos, assistentes sociais, pedagogos, economistas, contadores e tantos outros profissionais habilitados qualificados e atualizados, fundamentais para os desafios inerentes à administração dos interesses públicos. Cabe registrar que, se nas cidades médias e grandes, assim como nas capitais, a condição de inadministrabilidade é visível e óbvia, derivando para as mais absurdas formas de injustiças sociais, políticas e econômicas, nas pequenas cidades o quadro é pior. Falta gente e sobram, avolumam-se e agravam-se os problemas. Sobra maquiagem, decoração mobiliária urbana, imagem e propaganda, adiam-se as soluções.
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Como o assunto é complexo e vasto, imensamente desafiador e instigante, passível de divisão por áreas e setores, vou abordar neste texto apenas a questão da ocupação irregular das margens de rios. Quando chega o período das chuvas, a natureza exerce seu poder e seu direito de avançar sobre seus inegociáveis espaços, cuja ocupação indevida jamais teria ocorrido se nas cidades existissem administrações minimamente organizadas, competentes, profissionais e capazes.
Pior, quando ocorrem as “catástrofes naturais”, de fato, ajustes naturais das coisas, uma imensa quantidade de dinheiro é liberada para reparação dos danos, e os mesmos erros se repetem com a reconstrução do que havia antes onde jamais deveria ter sido construído e ocupado. Um país como o Brasil não pode prescindir de uma politica nacional de habitação que seja de Estado, muito além das demagogias dos governos passageiros, do uso eleitoreiro do imenso potencial de geração de emprego, renda, riqueza e bem estar social da construção civil, do saneamento básico, das moradias seguras e decentes.
Urgem planos diretores urbanos sérios, decentes, úteis, utilizáveis, exequíveis, sustentáveis, elaborados de forma competente, e nos quais esteja contemplado, sem negociações e tolerância, o uso racional e seguro do espaço urbano. Sem entrar no mérito policial – legal das invasões, nas graves questões sociais que estão na sua raiz, do ponto de vista da administração da cidade, estão abandonados os controles de uso do solo urbano, o que leva a uma crescente evasão de taxas e impostos que, de forma parcial e injusta, recaem muitas vezes, e apenas, sobre uma minoria de pagantes. Todos moram nas urbes, uns bem, outros mal, uns pagam a conta, muitos não.
Para cada falha das administrações públicas inúmeros problemas surgem e se avolumam, desde a impunidade dos erros particulares sobre os bens públicos, às questões de saúde, segurança pública, educação, mobilidade e relacionamentos (des)humanos.
O ciclo do caos e horror se fecha com o populismo de resultados, a subordinação cooptada dos legislativos aos executivos, a corrupção de raiz, de base, acumpliciada entre eleitores e agentes públicos, cidadãos e governantes.
Quem viaja vê. Existem raras exceções, tão raras que se perdem no lugar comum.
Antônio Carlos Aquino de Oliveira
Administrador, Consultor, Palestrante e Empresário do setor de publicidade