A cobertura de férias que queria ser recheio

Certa vez eu fui contratada temporariamente por uma empresa para cobrir as férias de uma moça. Eu já entrei sabendo que a minha missão ali era temporária e que o fim chegaria, mas sabe como é, lá no fundo todo mundo tem a esperança de um milagre acontecer e de acabar ficando "pra sempre".

No dia combinado compareci, toda arrumadinha e ansiosa para começar. Primeiros dias, começo a tentar entender o terreno aonde piso. Ei, este é o fulano, responsável por tal departamento e aquela ali é a ciclana, gestora daquela outra equipe. Os dias passam e consigo lembrar o quanto eu ia trabalhar animada, sentindo o tempo voar naquela missão temporária em cima do meu salto 10, eu confesso que gostava de me arrumar (sem excessos, era algo elegante, mas que atraia alguns olhares de descontentamento).

Primeiros dias de treinamento, venha cá que você vai aprender o que deverá fazer enquanto a moça sai de férias. Sento do lado dela durante vários dias (quer coisa mais chata que viver isso e não poder ficar na sua própria mesa? rs). Com atenção aprendo com ela, porque dali alguns dias eu ficaria sozinha e precisaria saber cuidar de tudo e fazer bem feito.

Determinada tarde estou lá, trabalhando, e a tal moça ainda não havia saído de férias. Eis que entra pela porta um gringo falando espanhol, e na ausência da gestora do departamento, se dirigiu a mim. Veja só como às vezes temos a faca e o queijo nas mãos e como é impossível não se apropriar dela: eu estava doida para falar espanhol com ele e, assim, o fiz.

Apresento o departamento, mas sem excessos, claro, sou só uma cobertura de férias temporária e preciso ficar na minha. Conversa fica legal, gestora do departamento chega e vê a minha "proatividade". Mas dali alguns minutos uma pasta voa na minha mesa (e na minha cara). Quem a havia jogado? A moça que ia sair de férias, em um surto de ciúmes para cima de mim.

Apaziguamos as coisas e seguimos trabalhando, eu não podia colocar uma lupa naquele problema. A tal moça que sairia de férias tinha um problema físico e se apoiava nesta questão para fazer o que quisesse com as pessoas, comigo não era diferente, eu estava me tornando uma vítima dela.

No período em que ela saiu de férias minha vida foi ótima, fiz tudo o que precisava fazer. Assim que ela voltou, deu um jeito de alterar as atividades que eu havia realizado no sistema, só para dizer que eu havia feito tudo errado. E logo eu percebi que eu nunca viraria recheio, seria para sempre apenas uma cobertura de férias temporária, dessas que todo mundo elogia, mas que pode perfeitamente arrancar do bolo se desejar.

Os dias seguintes se tornaram um inferno e eu realmente não tinha mais paz. Passei a me fechar e entendi que eu não passaria dali, mesmo existindo chance de ficar, porque, afinal, demanda existia.

Em uma certa terça-feira, meu último dia de contrato se concretizou. Minha gestora me chamou para conversar e ali eu teria a resposta. "Flavia, seu período terminou e infelizmente não temos como efetivá-la, apesar de você ser ótima".

Naquele segundo passava pelo corredor a tal moça, com um olhar feliz pela conquista. Agora, nem cobertura eu era mais, tinha virado no máximo uma calda rala (hahaha). E ela havia me derretido lentamente em banho-maria, enquanto fazia de tudo para me prejudicar.

Peguei minhas coisas, dei um abraço no pessoal e fui embora. Menos nela. Ali eu entendia que meu tempo havia acabado, aliás, que só havia existido enquanto eu era uma cobertura temporária.

Essa é uma história real, só pra contar como existem pessoas más. E que às vezes aquele ali realmente não é o nosso lugar. Felizmente o tempo passou, depois daquele emprego eu tive outros, depois dele até uma demissão. Mas eu não reclama de nada disso, não. Eu pude ver outros ares, aprendi tanto ao estar em vários lugares e fico feliz em saber que não fiquei lá. Mas aquela moça, sim, ela está lá até hoje. Fazendo exatamente as mesmas coisas, milimetricamente iguais.