Comentários ao pacote anti-crime (II) - Excludentes de ilicitude/legítima defesa
Mudança no Código Penal
Como é:
Art. 25 - Entende-se em legítima defesa quem, usando moderadamente dos meios necessários, repele injusta agressão, atual ou iminente, a direito seu ou de outrem.
Proposta de mudança:
"Art.25..................................................................................................................................
Parágrafo único. Observados os requisitos do caput, considera-se em legítima defesa:
I - o agente policial ou de segurança pública que, em conflito armado ou em risco iminente de conflito armado, previne injusta e iminente agressão a direito seu ou de outrem; e
II - o agente policial ou de segurança pública que previne agressão ou risco de agressão a vítima mantida refém durante a prática de crimes." (NR)
Comentário:
A alteração mostra-se desnecessária e perigosa. Desnecessária porque não possui utilidade dogmática; perigosa porque pode passar a impressão de que o policial, em atividade, teria permissão para agir com arbitrariedade. O estilo de redação adotado pretende realçar as situações concretas em que a causa de justificação estaria presente. Não é viável exemplificar a atividade policial como exclusão de ilicitude, pois há outras hipóteses também relevantes que ficariam de fora. Por exemplo, um médico que causar uma lesão corporal no paciente, para realizar uma cirurgia emergencial, também está amparado por excludente de ilicitude, e nem por isso mereceria um destaque na lei.
O que interessa, dogmaticamente, é a definição genérica das excludentes de ilicitude, pois a lei não consegue prever todas as hipóteses fáticas possíveis. O próprio texto do projeto diz “observados os requisitos do caput, considera-se em legítima defesa” e daí elenca a atividade policial. O mesmo poderia ser feito com o estado de necessidade, por exemplo: “observados os requisitos do caput, considera-se em estado de necessidade: a atividade médica quando a intervenção corporal for necessária para salvar a vida o paciente”. A utilização de exemplos no texto da lei inibe a atividade do intérprete, que em cada caso concreto fará uma comparação com aquilo que a lei descreve.
A primeira hipótese prevista é “o agente policial ou de segurança pública que, em conflito armado ou em risco iminente de conflito armado, previne injusta e iminente agressão a direito seu ou de outrem”. Se houver conflito atual e o policial reagir, a legítima defesa, da maneira como está prevista em lei, é suficiente para legitimar sua atuação. No caso de conflito iminente, quando houver a probabilidade de um dano, eventual excesso exculpável está amparado pela inexigibilidade de conduta diversa.
A outra hipótese do projeto é “o agente policial ou de segurança pública que previne agressão ou risco de agressão a vítima mantida refém durante a prática de crimes”. Novamente, é desnecessária a previsão legal porque a legítima defesa de terceiros encontra respaldo na atual legislação. E mais, não apenas o policial, mas qualquer pessoa pode em legítima defesa de outrem.
Não é cientificamente apropriado utilizar a lei para exemplificar casos concretos. Delimitar a aplicação da inexigibilidade de conduta diversa atenta contra o que a doutrina reconhece como a mais ampla das excludentes de culpabilidade. A atuação do policial dentro dos limites da lei já encontra respaldo legal; o que estiver além desses limites é arbitrariedade. Em síntese, palavras inúteis na lei podem ser prejudiciais ao intérprete e à sua aplicação.