Como garantir que um programa de voluntariado corporativo seja bem-sucedido
Em abril, publiquei aqui no Linkedin um artigo sobre como as políticas de RH do Terceiro Setor estão evoluindo e atraindo profissionais qualificados que querem trabalhar por um propósito. Como disse, sempre me perguntam como fazer a transição para o Terceiro Setor e sempre recomendo a quem deseja atuar por um propósito, começar fazendo um trabalho voluntário com a causa e organização com a qual mais se identifique. Foi o que eu fiz!
Nas últimas décadas, o voluntariado se consolidou no Brasil e hoje milhões de pessoas dedicam parte do seu tempo a ajudar o próximo sem compensação financeira. Com o avanço da cultura do voluntariado, muitas grandes empresas criaram comitês, grupos e ações de voluntariado para engajar suas equipes. Algumas dessas iniciativas dão certo e se prolongam no tempo. Mas muitas até começam com um alto engajamento, mas com o tempo os colaboradores vão de desmobilizando e a ação não tem continuidade. Isso ocorre por diversas razões.
Um artigo recente da Harvard Business Review, de autoria de Jessica Rodell, mapeou as principais “armadilhas” a se evitar em programas de voluntariado de empresas e como criar programas que animem e engajem os colaboradores. Ela fala sobre o contexto norte-americano, mas muito se aplica ao universo das grandes empresas brasileiras ou multinacionais instaladas no país. Segundo a autora, embora no geral o número de pessoas que praticam o voluntariado esteja relativamente estável nos últimos anos, no mundo corporativo tem crescido. Em 2018, 47% das companhias dos EUA ofereciam programas de voluntariado, contra 40% em 2014. Quanto maior a empresa, maior a probabilidade de ter um programa do tipo.
A crise econômica provocada pela pandemia da COVID-19 pode levar empresas a realizarem cortes nestes programas, mas muitos estudos comprovam que o engajamento em trabalho voluntário traz benefícios para as empresas, como aumento da produtividade, engajamento das equipes e atração e retenção de talentos. Em seu trabalho como pesquisadora e consultora, Rodell viu ações de todos os tipos, desde empresas que permitem a funcionários se voluntariarem para a causa que eles escolherem, até programas mais estruturados, com metas claras. Em sua experiência, ela percebeu diversos erros comuns que fazem programas de voluntariado corporativo não renderem como poderiam. Alguns deles são:
· Copiar os outros: A forma mais fácil de criar uma ação de voluntariado é reproduzir uma ação bem-sucedida que outra empresa já fez. Além de ser difícil avaliar o quanto de fato a ação é bem-sucedida olhando de fora, esse “Ctrl C + Ctrl V” ignora a Missão, Visão e Valores da empresa e limita seu valor estratégico, diminuindo seu apelo para os funcionários.
· Priorizar projetos “de estimação” dos chefes: A autora também viu muitos executivos que focam programas de voluntariado das suas empresas em ações nas quais eles já estão de alguma forma envolvidos. Mas os valores e prioridades da alta direção da empresa não necessariamente são os mesmos do corpo de funcionários.
· Tornar o voluntariado obrigatório: Nesse caso, a contradição é evidente. Muitas vezes, essa “obrigação” é implícita, mas sempre vai gerar descontentamento e baixo engajamento dos funcionários. A percepção de que alguns colaboradores se engajam para “ficarem bem com a chefia” pode causar atritos entre a equipe.
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Para evitar esses erros, Rodell recomenda algumas boas práticas, e a principal é não se guiar apenas pela porcentagem de funcionários que participa de programas de voluntariado, mas na qualidade deste engajamento. Em específico, as recomendações são:
· Priorizar o significado: as pesquisas da autora demonstram que as experiências de voluntariado precisam ser vistas como significativas para atrair naturalmente os funcionários. As pessoas querem fazer a diferença. E como garantir que isso aconteça? As pessoas descobrem significado no que fazem de três maneiras: se veem propósito e valor no que fazem, quando têm um senso pessoal de eficácia e controle, e quando têm um sentimento de autoestima. Os melhores programas de voluntariado oferecem uma combinação dos três elementos. Neles, os voluntários veem o resultado do seu trabalho, interagem com a equipe da ONG que realiza a ação e ouvem dos beneficiários da ação como seu trabalho os ajudou. Também é preciso equilibrar o impacto da ação e o que isso significa para o funcionário voluntário.
· Balancear as paixões dos funcionários com a estrutura corporativa: Como vimos, um dos erros mais comuns em programas de voluntariado corporativo é a alta direção ditar quais ações serão contempladas. Mas deixar os funcionários decidirem livremente no que se engajar também traz problemas. Programas estruturados e coordenados encorajam a interação entre os colaboradores e o trabalho em equipe. A solução é equilibrar essas duas tendências. A empresa pode estimular os funcionários a darem seus inputs sobre que tipo de ações e atividades querem se engajar e, a partir daí, estruturar um programa. Ou pode criar um programa mais amplo, alinhado à visão, missão e valores da organização, mas estimular os funcionários a buscarem e se engajarem em ações e ONGs que lidam com temas correlatos.
· Envolver outros stakeholders: Além dos funcionários, é possível trazer fornecedores, parceiros, consumidores, funcionários aposentados e até membros do conselho para as ações de voluntariado. Estas iniciativas funcionam bem se a ação de alguma forma dialoga com a expertise desses stakeholders. O engajamento dos consumidores em especial é cada vez mais comum e traz ótimos resultados para a reputação da marca da empresa.
De maneira geral, programas de voluntariado corporativo trazem um volume substancial de valor intangível para a empresa, mas como qualquer outra área de negócios, para obter o resultado desejado é preciso planejamento cuidadoso e visão estratégica. É bom sempre evitar o “caminho mais fácil” se você quer que a ação de voluntariado traga impacto significativo para a empresa e o planeta.
Aqui nas Aldeias Infantis SOS Brasil temos várias opções para as empresas apoiarem nossas ações como parceiras, e uma delas é por meio de ações de voluntariado corporativo. Em minha experiência, os resultados são ótimos, mas ainda melhores quando os programas das empresas seguem os princípios defendidos por Jessica Rodell em seu artigo. Ter o propósito como prioridade e alinhamento na Missão, Visão e Valores faz toda a diferença.
Gerente Jurídica - Head of Legal
3 aParabéns! Penso muito sobre esse assunto! Obrigada por compartilhar!